100 anos da petição esquecida contra o colonialismo alemão
26 de julho de 2019Há 100 anos, um grupo de 18 africanos, liderado por Martin Dibobe, o camaronês que se tornou um símbolo do movimento dos direitos civis dos africanos na Alemanha, iniciava uma pequena revolução. Exigiam direitos iguais para alemães e africanos residentes na Alemanha. Tudo começou no verão de 1919, quando decidiram enviar a chamada petição de Dibobe à Assembleia Nacional e ao Ministério Colonial da República germânica, pedindo também igualdade nos países colonizados pelo gigante europeu.
Na missiva, o grupo de negros, que protestava contra o racismo e a discriminação, exigia que Martin Dibobe fosse indigitado como representante dos africanos no Parlamento alemão, conhecido por Reichstag, mais direitos para os povos das colónias alemãs em África, o fim do trabalho forçado e da tortura. Ao mesmo tempo, prometeram lealdade incondicional à jovem República de Weimar.
"Eles não disseram simplesmente que gostariam de permanecer na Alemanha, mas apontaram as condições que gostariam de ter e, ao expor essas condições, enumeraram os seus problemas", lembra a historiadora Paulette Reed-Anderson. "Foi uma apresentação que apontava indiretamente todos os erros do colonialismo".
Um grupo realista
Dibobe sentiu na pele as injustiças do sistema colonial. Nasceu em 1876, nos Camarões, uma colónia alemã entre 1884 e 1919. Aos 20 anos de idade, foi a Berlim participar, na qualidade de representante dos Camarões, numa exposição etnológica que tinha como objetivo satisfazer a curiosidade alemã sobre o dia-a-dia dos africanos nas colónias e aumentar o entusiasmo das pessoas pelo colonialismo.
Após a exposição, decidiu permanecer na Alemanha e foi o primeiro maquinista de comboios negro na rede de transportes alemã. Mais tarde, viria a casar-se com a filha do seu senhorio e tornou-se um incansável defensor da igualdade de direitos para os africanos na Alemanha – um diplomata inteligente, que compreendia as circunstâncias em que estava inserido.
"Não fazia sentido escrever simplesmente ‘nós queremos a independência' porque sabiam que não a teriam", explica Reed-Anderson, especialista em história da comunidade africana na Alemanha. "Eram pessoas muito pragmáticas", considera.
Resposta: silêncio
Mas as exigências de Dibobe não deram em nada. Não teve respostas nem da Assembleia Nacional, que estava focada na elaboração da nova Constituição democrática em Weimar, nem do Ministério Colonial. Após o Tratado de Versalhes de 1919, a Alemanha cedeu as suas colónias às potências que ganharam a Segunda Guerra Mundial, principalmente a França e Grã-Bretanha. As 32 exigências da petição Dibobe ficaram por cumprir.
100 anos depois, a petição assinada por 18 africanos teve direito a uma placa memorial colocada no prédio do antigo Escritório colonial, no centro de Berlim
"Há 100 anos, imigrantes de colónias alemãs que moravam aqui na Alemanha apresentavam exigências muito abrangentes: os 18 signatários exigiam independência, direitos iguais e segurança jurídica nas colónias. Continuaram a exigir participação e representação usando palavras que soavam a reformas, mas que implicitamente questionavam o sistema de domínio colonial - baseado no fundamentalismo, desigualdade e violência", disse o vereador da Cultura da capital alemã, Klaus Lederer, na cerimónia de inauguração.
Revoltado com o racismo na Alemanha, Martin Dibobe regressou a África, concretamente aos Camarões, já sob o domínio francês. A partir desse momento, caiu no esquecimento.
Exigências ainda atuais
A petição feita em nome de Dibobe continua a ser importante, diz o ativista germano-tanzaniano Mnyaka Sururu Mboro, co-fundador do grupo Berlin Postkolonial, na origem da iniciativa da placa comemorativa.
"Ele exigiam um membro africano no Parlamento", lembra Mboro, acrescentando que o deputado de origem senegalesa Karamba Diaby entrou no Bundestag quase 100 anos depois. Mboro, que vive na Alemanha há 30 anos, ressalva que ainda há exigências por cumprir: "Muitos afro-alemães continuam a não ser vistos como alemães por completo – mesmo que vivam aqui e falem a língua, continuam a não ser aceites".