Agualusa defende debates em Angola em nome da democracia
10 de junho de 2015A violação constante dos Direitos Humanos em Angola não é ficção. É uma realidade infeliz que continua a inquietar o escritor angolano, José Eduardo Agualusa.
O julgamento e a condenação a seis meses de prisão do ativista e jornalista, Rafael Marques, e o caso Julino Kalupeteca, entre outros, são exemplos disso: "Infelizmente, há sempre casos... o caso do monte Sumi também, que é muito preocupante, porque o Governo não esclareceu completamente o que se passou ali. E agora com o Rafael é uma situação também estranha, parece um tiro no pé. Creio que este tipo de situação só prejudica o próprio regime."
Défice de democracia
A estes factos junta-se a situação em Cabinda que, segundo a expressão do escritor, "nunca foi famosa".
"Eu acho que tudo isso tem a ver com o défice de democracia. Todas essas questões não teriam acontecido num contexto democrático. Então, acho que tem a ver com a mesma realidade, que é o problema de falta de democracia".
No enclave de Cabinda, o caso mais recente prende-se com a situação crítica de José Marcos Mavungo, detido desde 14 de março. Para Eduardo Agualusa, a sociedade civil, que cresceu nos últimos anos, tem alertado para esta realidade, "mas, mesmo a sociedade está presa ao próprio atraso que a ausência de democracia gerou no país", considera também o escritor.
Na perspetiva de Agualusa, os livros são território de pensamento e de debate, que também podem contribuir para elevar o grau de democracia em Angola: "E tudo o que possa conduzir ao debate é bom para o país, para produzir mais democracia, para melhorar a democracia. Então, tudo o que seja debate é bom. Tem acontecido, mas ainda precisa acontecer mais. Ainda há falta de debate."
Os Camaleões de Agualusa
A DW África entrevistou o escritor angolano no intervalo de uma sessão de autógrafos na Feira do Livro de Lisboa, poucos dias depois do lançamento nas livrarias portuguesas do seu novo título, "O Livro dos Camaleões".
"'Os Camaleões" tem a ver com o facto de quase todos os personagens que surgem neste livro, ou uma boa parte deles, serem pessoas em trânsito de identidade, à procura de identidade em geografias diversas e tempos diversos. Não têm diretamente a ver com uma realidade concreta. Nesse sentido, são homens camaleões."
E o escritor prossegue: "Os contos são muito diferentes entre si, há contos passados em épocas históricas muito diversas e com personagens muito diferentes também, há personagens tiradas da realidade e outras não."
Este novo livro reúne vários contos inéditos, à mistura com algum humor, que, por exemplo, dão a conhecer ao leitor um ditador africano muito respeitado em Portugal, que escreve a sua própria biografia.
Ou ainda sobre um famoso marinheiro maltês, que visita São Tomé, depois de passar por um lugar onde o tempo não passa. Além de várias épocas, a obra percorre também diversas geografias, das savanas do sul de Angola às ruidosas ruas do Rio de Janeiro, no Brasil.
Agualusa revela que "tem contos passados em Angola na época contemporânea, mas também no séc. XIX, tem um conto passado em São Tomé, no Brasil... São épocas diferentes e geografias diferentes."
Além de Lisboa e Luanda, Rio de Janeiro e São Paulo têm sido paragens constantes de José Eduardo Agualusa nos últimos anos, onde apresentou recentemente o livro "A Rainha Ginga". Agualusa é um dos autores dos países de língua portuguesa presentes na Feira do Livro de Lisboa, que termina no próximo domingo (14.06).