Angola: "Há um maior desafio para promover transparência"
24 de novembro de 2021Contra todas as expetativas dos partidos políticos da oposição, o Presidente angolano, João Lourenço, promulgou na terça-feira (23.11) a Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais.
O Chefe de Estado tinha vetado, numa primeira fase, esta lei, pedindo que fosse alterada para garantir uma maior igualdade entre os concorrentes, bem como a lisura e a verdade eleitoral. No entanto, numa segunda apreciação, os deputados do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) aprovaram de novo o diploma sem as alterações pedidas.
Em entrevista à DW, o jurista Luís Jimbo, responsável do Instituto Angolano para Sistema Eleitoral e Democracia, diz que a decisão de João Lourenço poderá provocar violência eleitoral e colocar Angola em perigo.
DW África: Ficou surpreendido com a promulgação do Presidente de Angola?
Luís Jimbo (LJ): A surpresa foi porque não mudou aquilo que foi a falta de consenso quando houve o veto. Não mudou. O que deveria mudar é a forma como se apresentou na proposta o processo de contagem. A proposta do MPLA propõe um centro de escrutínio a nível nacional e elimina os sete escrutínios a nível provincial. Imagine que a própria bancada do MPLA reconheceu que a CNE não agiu no procedimento da lei, fazendo um escrutínio na província para eleger os cinco deputados nas províncias. Não o fez e pediu desculpa à sociedade, mas depois aponta uma lei que assume a má prática. Isto, de facto, desmoraliza a sociedade. A centralização de todo o processo em Luanda é uma situação que não é boa.
DW África: Em Angola diz-se que com a promulgação desta lei a fraude eleitoral está legalizada. Qual é o seu parecer sobre isso?
LJ: Com esta lei há um maior desafio para promover a transparência. Fica muito distante para elevar a transparência e a aceitação dos resultados eleitorais, não tanto para os candidatos, mas a minha preocupação é para o eleitorado. Estamos a falar de um candidato que não aceitou o resultado e mede a sua audiência perante o eleitorado. Se o eleitorado também não aceita, isso é favorável à desestabilização, violência e outros tipos de movimento.
DW África: O povo com esta promulgação não vai confiar mais no processo eleitoral?
LJ: Exatamente. Esta é a maior ameaça. Há um grupo de pressão muito grande a partir de jovens. A consciência de participação política dos jovens aumentou muito e está a exigir dos partidos e dos candidatos cada vez mais. É um direito legítimo que têm de perceber o processo e de confiarem no processo. Esta lei cria uma confusão maior, porque coloca de um lado os partidos políticos e do outro toda a reivindicação do eleitor. Coloca-o no extremo de que está a apoiar ou está a favorecer a oposição, o que não é verdade porque os partidos políticos não estão a conseguir fazer política e a construir consenso no Parlamento. É a reação da sociedade a uma tremenda desmoralização. As pessoas estão descontentes e estão a exigir um pouco mais do Presidente, do MPLA e da UNITA.
DW África: Esta promulgação poderá gerar manifestações e contestações na rua?
LJ: Há um ambiente muito tenso de intolerância política. Isto vai perpetuar a intolerância política e o desrespeito dos valores democráticos e que neste ambiente, se isto vai crescendo, é um fator perigoso para a crise eleitoral. É uma situação tensa e muito preocupante.