Angola: Como prevenir o coronavírus sem água?
9 de abril de 2020Maria Antunes mora no bairro Carreira de Tiro, em N'dalatando, no noroeste de Angola. Sem acesso a água própria para consumo, ela mostra-se preocupada. As autoridades sanitárias aconselham a lavagem constante das mãos com água e sabão devido a pandemia da Covid-19.
O problema de Antunes se repete em diferentes residências. As famílias sofrem com falta de abastecimento desde fevereiro e percorrem quilómetros atrás de água. "É água da cacimba, nem dá para lavarmos as mãos, não dá para lavar a boca… Nós queremos água na Carreira [de Tiro], porque não falta [só] água para beber. E quando for para lavar as mãos, como vamos fazer?”, questiona a moradora.
Em outra área de N'dalatando, Delfina Luamba enfrenta o mesmo problema. A moradora do bairro Kibuangoma revela que as pessoas da sua vizinhança estão conscientes que consomem água imprópria. "Vivemos 'à rasca', não temos água potável, nós consumimos água da cacimba, [que não é] tratada", lamenta Luamba.
O maior reservatório de água para abastecer N'dalatando está a ser construído no bairro Miradouro, mas a comunidade tem pressa. Multiplicam-se apelos por água limpa pelo temer de contaminação pelo coronavírus. "Pelo menos nos deem água até essa pandemia passar, porque não tem água. Como lavar as mãos? Mandaram lavar as mãos todos os dias com água e sabão. As sanitas estão todas entupidas, não temos como fazer", pede Antonica Sabule.
Falta de capacidade
No bairro Tenga, Josefa Mateus recorre aos "kupapata" – moto-taxistas que vendem recipientes com 20 litros de água a 60 kwanzas [equivalente a 0,10 euros]. Os vizinhos de Mateus também retiram água da cacimba - e paga-se mensalmente 500 kwanzas, [0,80 euros]. "Quando não temos 60 kwanzas [para pagar o kupapata], somos obrigados a ir lá em baixo buscar água da cacimba. [...] Apelo ao governador para ver a nossa situação aqui no Tenga, porque estamos mesmo a sofrer muito", diz.
O governador da província do Kwanza Norte, Adriano Mendes de Carvalho, disse que o Executivo está empenhado na melhoria do fornecimento de água e luz para as comunidades.
A questão, no entanto, é que a Empresa de Água e Saneamento do Kwanza Norte (EASM) não tem capacidade para atender à demanda e o problema vem se agravando pela expansão da cidade e crescimento populacional.
"Sentimos – nós, o Governo da província e o Governo central – [que] devemos fazer algumas intervenções… Queríamos apelar à população a calma, apelar para que tenham confiança no Governo e na direção da EASM, nós estamos a trabalhar no sentido para, a breve trecho, sentirem algumas melhorias no sistema", explica o responsável provincial da área administrativa e financeira da EASM, Estêvão Benjamim.
Mais fragilidades na saúde pública
Como se não bastassem os problemas crónicos no saneamento básico, os técnicos de saúde estão a ter de trabalhar longe das condições ideias no Kwanza Norte.
Os profissionais identificam falta de condições laborais, de materiais de biossegurança e de pagamento nas ações de prevenção ao coronavírus.
O Governo central transferiu para a província 75 milhões de kwanzas [pouco mais de 123 mil euros] para custear as despesas. O Governador da província Adriano Mendes de Carvalho visitou as salas de quarentena institucional e de isolamento - localizados na aldeia da Carianga e no destacamento dos bombeiros no morro M'binda, em N'dalatando.
Para além da estrutura montada na área de internamento para quarentena, foram igualmente instaladas salas diferenciadas - de cuidados intensivos, intermédios, casos moderados, enfermarias de isolamento e pediátrica.
Filomena Wilson, porta-voz da Comissão Provincial Multissetorial para Prevenção e Combate à Covid-19, assegurou que as condições estão criadas, não obstante os últimos detalhes.
Wilson disse que há três ventiladores, 49 camas e outros equipamentos para fazer frente a eventuais infeções. A responsável salientou que aguardam medicamentos e material de proteção individual para os técnicos. A porta-voz da comissão referiu que os cidadãos que estão em quarentena domiciliar poderão regressar nos próximos dias ao convívio social.