Demissão do presidente do Constitucional faz soar alarmes
13 de agosto de 2021A Presidência da República não adiantou pormenores sobre as razões que estiveram na base da demissão de Manuel Aragão. Mas analistas e políticos não têm dúvidas de que ela resulta de um clima de crispação e até de interferências do poder político na Justiça.
O juiz demissionário manifestou-se contra a "maioria das decisões" no acórdão que aprovou a Lei de Revisão Constitucional, proposta pelo Presidente João Lourenço. Na sua declaração de voto, Aragão alertou para o "suicídio do Estado democrático e de Direito", considerando mesmo que a revisão constitucional, ora aprovada, põe em causa a "separação de poderes".
Serra Bango, presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia, aplaude a "verticalidade" de Aragão face a um "um clima político e técnico-jurídico menos bom, que fere alguma ética".
"Ancião como ele é, experiente como é, preferiu pôr-se à margem e demarcar-se desta posição", comenta o responsável.
Carlos Maria Feijó, professor catedrático da Universidade Agostinho Neto e considerado o pai da Constituição angolana, diz que, se estivesse no lugar de Aragão, já teria deixado o cargo há muito tempo.
"Sendo presidente [com] sucessivos votos de vencidos, a impressão com que se fica é de uma certa instabilidade no Tribunal Constitucional. Se estivesse na posição dele já não estaria lá há um ano, no mínimo", afirmou o jurista em entrevista à estatal TV Zimbo.
"Regresso à ditadura"
A União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o maior partido na oposição no país, diz que, a cerca de um ano das eleições gerais, a saída do juiz presidente do Tribunal Constitucional é preocupante.
"Essa demissão é mais uma prova de que há pessoas com responsabilidades que acham que há um retrocesso na consolidação do Estado democrático e de Direito, algo que nós, UNITA, temos dito vezes sem conta", refere o porta-voz do partido, Marcial Dachala.
O analista político Olívio Kilumbo entende que a saída de Manuel Aragão é um sinal de alarme, que espelha o "recuar significativo na separação de poderes".
A conclusão que Kilumbo tira é simples: "Há naturalmente um regresso visível à ditadura. Ou seja, o Presidente João Lourenço quer blindar-se com a Constituição, mas os tribunais, o Tribunal Constitucional em particular, não têm esse entendimento".