Em doze anos, Angola perdeu mais de 900 leões
28 de junho de 2017As populações de vida selvagem presentes nos parques nacionais de Luengue-Luiana e Mavinga, em Angola, – dois dos mais importantes da Área Transfronteiriça de Conservação do Okavango/Zambeze, mais conhecida como KAZA -, foram dizimadas durante a guerra civil que assolou o país por vários anos, e que terminou em 2002. Um estudo realizado pela organização não-governamental Panthera e cujos resultados foram divulgados recentemente, dá conta que, dos cerca de mil leões que existiam nestes parques há doze anos atrás, devem existir atualmente apenas entre 10 e 30.
Em entrevista à DW África, Paul Funston, o diretor do Programa de Leões da organização mundial de conservação de animais selvagens Panthera, afirma que o reduzido número de leões pode ser explicado pela intervenção humana nos seus habitats e que esta é a "maior ameaça” para estes animais. Segundo o investigador, estas "áreas estão ainda a recuperar-se da guerra civil” e o facto de as pessoas que vivem nestes parques serem muito pobres faz com que "utilizem a caça de animais selvagens como meio de sobrevivência - quer para a sua alimentação, quer para fazer dinheiro”. Uma prática que afeta, principalmente, as presas que os leões gostam de comer, acrescenta.
O mesmo estudo revelou que, à semelhança dos leões, também os cudos e zebras foram detetados em poucas fotografias. Resultados mais positivos apresentaram outros carnívoros. No período em estudo, de junho a outubro de 2015 e 2016, foram detetadas 151 chitas, 518 leopardos e cerca de 600 cães selvagens africanos. No total, 19 espécies de mamíferos e uma espécie de réptil foram observadas como carne de caça.
Que soluções?
Para Paul Funston, a solução para a recuperação dos leões, mas também de outras populações de mamíferos, passa por incentivar economicamente as comunidades que vivem nestes espaços. As recomendações da investigação passam por isso, explica Paul Funston, pela melhoria da aplicação da lei e pelo delineamento de uma melhor estratégia de segurança nestes lugares. "Nas principais áreas protegidas, o dinheiro gasto na aplicação da lei é muito baixo”, afirma o investigador, acrescentando que, na sua opinião, é necessário "encontrar incentivos económicos – como o desenvolvimento do turismo, por exemplo - para que seja mais fácil a população tolerar e não prejudicar a vida selvagem”.
Segundo Paul Funston, os resultados foram já apresentados ao Governo angolano e ambos têm estado a discutir as ações a implementar no futuro. "Temos debatido potenciais soluções, tais como melhorar a aplicação da lei e reforçar as patrulhas anti-caça. Também discutimos formas de desenvolver uma economia baseada em programas de conservação onde as pessoas locais seriam integradas nas patrulhas anti-caça ou podiam trabalhar na manutenção de estradas, ou talvez, no controlo de incêndios”, explicou. O investigador acredita que, "com um emprego e dinheiro, a convivência entre as comunidades e a vida selvagem” sairá beneficiada.
Parques com potencial turístico
O estudo revelou ainda o potencial turístico de ambos os parques para o turismo. De acordo com os investigadores, o parque Luengue-Luiana tem características favoráveis para o turismo de quatro rodas. A construção de acampamentos e pequenas pousadas ao longo dos rios Cubango e Cuito, assim como uma rede rodoviária para cada uma delas, é também sugerida na investigação.
O estudo levado a cabo pela Panthera foi realizado no âmbito de um acordo assinado a 25 de julho de 2015 com o Instituto Nacional da Biodiversidade e Áreas de Conservação (INBAC) do Ministério do Ambiente (MINAMB) angolano e decorreu de junho a outubro de 2015 e 2016.
Neste período, os investigadores quiseram avaliar a distribuição dos grandes carnívoros e herbívoros nos dois parques, utilizando armadilhas fotográficas para registar os rastos. O estudo cobriu uma área de 27.500 km2 ao longo dos rios Curado, Luiana e Luengue. Pretendeu-se ainda listar os diferentes fatores que estão a impactar a vida selvagem nestas áreas protegidas, como é o caso da intervenção do Homem. "Sinais de atividade humana – principalmente ao longo dos rios - foram registados com maior frequência do que qualquer espécie de animal silvestre”, lê-se no estudo.
No total, foram detetadas 51 espécies nos parques nacionais de Luengue-Luiana e Mavinga.