Angola: Os jornalistas fora de Luanda são desvalorizados?
17 de setembro de 2020A polémica instalou-se no último fim-de-semana quando jornalistas da província angolana do Bié denunciaram, nas redes sociais, a falta de espaço para colocar questões ao Presidente da República, João Lourenço, durante uma conferência de imprensa. No último sábado (12.09), o Presidente João Lourenço deslocou-se ao centro do país para inaugurar o hospital central do Bié. Na hora das perguntas e respostas, os repórteres locais não foram considerados e não puderam questionar o Chefe de Estado, situação que causou revolta junto daquela classe profissional.
O jornalista angolano Félix Abias comenta que a situação não é nova e que tem havido uma sucessiva desvalorização dos jornalistas que atuam fora de Luanda, a capital angolana. "Os jornalistas locais não tiverem oportunidade de fazer nem sequer uma pergunta quando são eles que vivem o dia a dia do Bié, conhecem as pessoas, conhecem os problemas e são eles que deviam ter essa oportunidade", lamenta.
Sempre que o Presidente angolano trabalha fora de Luanda, leva consigo jornalistas. Questionado sobre se isso estaria a contribuir para a situação que se viveu no Bié, Félix Abias responde."É normal que haja um ou outro jornalista, os tais repórteres presidenciais, mas desde que se dê espaço ao pessoal local", afirma.
Dar oportunidade ao jornalismo local
Teixeira Cândido, secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA), é da mesma opinião. "É normal que haja repórteres acreditados junto da Presidência da República. Mas nem todos os órgãos em Angola estão acreditados junto da Presidência da República", frisa.
"Entendo que as preocupações dos profissionais que trabalham numa determinada província sejam preocupações locais e estes devem ter a oportunidade de questionar ao Presidente da República as preocupações que uma determinada província enfrenta", adverte.
"O Sindicato dos Jornalistas Angolanos procura reivindicar junto das entidades competentes, no caso particular junto da assessoria do Presidente da República, para que se acabe com esse tratamento diferenciado", diz ainda.
Teixeira Cândido pede aos jornalistas que não fiquem em silêncio quando os seus direitos forem violados. "Apelamos aqui aos colegas jornalistas para que não se calem, para que se juntem, para que nos juntemos e continuemos a pressionar para que as situações melhorem, porque o acesso as fontes é determinante para a qualidade do jornalismo", justifica.
Para Félix Abias, o caso do Bié é uma situação que se estende a outras atividades no país. Segundo este jornalista, é comum ouvirem-se expressões como "Angola é Luanda" e "pessoas das províncias". "Não é só no jornalismo que isso acontece. Isso acontece em várias áreas. O jornalismo é apenas o caso que acabamos de presenciar, mas regra geral, quem está em Luanda pensa que os demais não têm valor", conclui.