Angola: Prevenção da cólera exige ação intersetorial urgente
14 de janeiro de 2025O número de casos de cólera em Angola subiu para 283, e um total de 19 mortes desde o início do ano. O Ministério da Saúde alerta para o alto risco de propagação da doença, especialmente em áreas com saneamento básico precário e acesso limitado à água potável.
O surto, iniciado no bairro do Paraíso, em Cacuaco, na província de Luanda, já se estendeu ao Bengo e a Ícolo e Bengo. Pelo menos nove amostras de casos suspeitos estão em processamento, de acordo com o ministério.
OMS aponta medidas urgentes
Segundo Walter Firmino, oficial de emergência da Organização Mundial de Saúde (OMS) em Angola, a prevenção e mitigação da cólera requerem ações integradas entre diferentes setores, incluindo saúde, água e saneamento básico. Firmino destacou que, além da atuação do Ministério da Saúde, é essencial garantir água potável nas comunidades e educar a população sobre práticas simples e eficazes, como ferver a água, lavar as mãos regularmente e tratar os resíduos adequadamente.
"Recomenda-se a cloração da água nos tanques de distribuição e a desinfecção regular dos mesmos, garantindo que não estejam próximos a latrinas para evitar contaminação. Essas ações são cruciais em áreas com infraestruturas sanitárias limitadas, como Cacuaco", afirmou Firmino.
OMS ressalta que a mudança de comportamento da comunidade é a principal medida de prevenção.
Além disso, a organização tem fornecido suporte técnico e logístico ao governo angolano, incluindo o envio de materiais para tratamento da cólera, como medicamentos orais e intravenosos, e kits laboratoriais para testes rápidos. A OMS está a fortalecer as capacidades locais para monitorar casos e prevenir a disseminação da doença, cujo período de incubação varia de 2 horas a 5 dias, representando um risco elevado de transmissão em massa.
"Os desafios vão além do setor de saúde"
Especialistas têm apontado para lacunas na estratégia de combate à cólera. Adriano Manuel, presidente do Sindicato dos Médicos Angolanos, é contundente ao criticar as políticas públicas.
"Infelizmente, o Governo de Angola apostou na medicina curativa, em vez da preventiva. O resultado são mortes evitáveis no nosso país", lamenta.
Segundo Manuel, alertas sobre a necessidade de investir em saneamento básico e educação em saúde foram ignorados.
Eduardo Caiangula, bastonário da Ordem dos Enfermeiros de Angola, enfatiza o impacto das condições precárias na atuação dos profissionais de saúde.
"Os enfermeiros estão na linha da frente, treinados e mobilizados, mas enfrentam limitações enormes devido à falta de água potável e saneamento. A cólera é diretamente relacionada a essas carências."
Caiangula também chama a atenção para a necessidade de cooperação entre os diferentes setores do Governo: "Falhas em outras áreas, como saneamento e distribuição de água, afetam diretamente a saúde pública."
Com a rápida propagação do surto, as unidades de saúde enfrentam desafios crescentes. Adriano Manuel alerta para a insuficiência de recursos humanos e materiais:
"Se os números de mortes aumentarem, teremos uma elevada taxa de mortalidade, porque o país não está preparado para isso. Falta-nos infraestrutura, medicamentos e profissionais."
Com a aproximação da época de chuvas intensas, prevista para março e abril, cresce o temor de uma piora do surto.