Angola: Quando será a vez de Isabel dos Santos?
20 de novembro de 2018Há anos que se fazem denúncias de supostos ilícitos cometidos por Isabel dos Santos nas empresas onde tem participações ou onde foi gestora. Denúncias que ganharam vigor com João Lourenço na Presidência de Angola.
A pergunta que não se cala é: quando chegará a vez da "princesa" ser levada à barra do tribunal? Mas antes é preciso responder a uma questão fundamental: as autoridades angolanas têm matéria suficiente para tal? Se sim, porque não o fazem?
Respondendo a estas interrogações, o jurista Albano Pedro entende que tudo "tem a ver com o facto de que boa parte das acusações foram motivadas pela opinião pública e obviamente carecem de uma investigação a fundo. Não basta levantar-se os problemas, é necessário que os problemas sejam provados. E esse é o grande handicap que vejo na questão da investigação dos crimes de que boa parte de governantes e até empresários angolanos estão envolvidos: é a dificuldade de provar em concreto os crimes de que as pessoas estão a ser acusadas."
Uma situação, que ainda deixa suspeitos em situação confortável, deixa a entender o jurista angolano: "E por causa disso, não só a Isabel dos Santos mas muitos governantes já foram colocados em hasta pública através da imprensa, têm os processos pendentes, as investigações suspensas, apesar das suspeitas muito bem marcadas."
Combate à corrupção é seletivo
E Pedro prossegue: "Uma segunda razão, sobretudo no caso de Isabel dos Santos, está relacionada com o facto de que estamos a assistir a uma investigação seletiva, no sentido que está a obedecer a uma espécie de priorização. Alguns estão a ser chamados e outros nem tanto, penso que haverá um momento em que as pessoas serão chamadas. O que é certo é que neste processo de combate à corrupção diz-se que o processo não é simultâneo."
Por exempo, a participação ENDE, Empresa Nacional de Distribuição de Energia, na Efacec, numa ginástica planeada por Isabel dos Santos, lesou o Estado angolano, segundo o ex-ministro da Energia, Batista Borges.
A filha do ex-estadista angolano José Eduardo dos Santos foi acusada pelo portal Maka Angola, entre outras coisas, de ter transferido mais de 135 milhões de dólares da petrolífera angolana, Sonangol, para quatro empresas suas, usando o Banco BIC, em Portugal, onde detém 42,5% do capital.
Aguardar, primeiro, pelo fim do prazo para o repatriamento de capitais
Reagindo aos supostos ilícitos, o jurista Pedro Karapakata lembra que estás figuras ainda estão salvas, pelo menos até 22 de dezembro de 2018, pela Lei de Repatriamento de capitais e só "depois de expirado esse prazo se, de facto, se chegar a conclusão que terá retirado fraudulentamente dinheiro da Sonangol e outros tantos, então todos devem responder."
Para o jurista angolano não pode haver dois pesos e duas medidas: "Quero dizer que do ponto de vista legal não há como chamar a Isabel dos Santos a responder pela gestão danosa que eventualmente terá feito na Sonangol, por que todos [os gestores anteriores] o fizeram."
E lembra as recentes palavras de João Lourenço: "Segundo o atual Presidente, muitos angolanos agiram de foram anti-patriótica transferiram o dinheiro para fora de Angola. E eles têm seis meses para repatriar esse dinheiro. Convém não nos cingirmos apenas a Isabel, porque a gestão da Sonangol parte da sua fundação e a Isabel dos Santos não está na base da fundação da Sonangol."
E Karapakata alerta que "se cingir apenas a Isabel é violar o princípio de igualdade de tratamento de todos os cidadãos que se encontram nas mesmas condições" e pergunta: "Tratar de forma diferente apenas a Isabel porque? Pelo facto de ser filha do ex-Presidente? Então, a partida estamos a deitar a baixo princípios fundamentais. Porque ser filha de um Presidente não é parte criminosa."
Nova abordagem no combate à corrupção
À parte fraquezas de investigação e questões legais, uma questão estratégica, sob o ponto de vista político, pode estar a determinar a demora das autoridades em tomar uma posição mais contundente em relação à "princesa" Isabel.
O jurista Albano Pedro sublinha mudanças de postura: "Neste momento, como sabemos, as prisões já não têm aquela velocidade que tiveram logo no início e percebe-se que não será apenas em relação à Isabel dos Santos, mas deve haver um posicionamento um pouco mais ponderado nos casos de corrupção."
E recorda: "Percebemos que no combate à corrupção a situação não é de ser levada de forma fácil, porque estamos perante um país que os crimes de corrupção atingiram praticamente todos os dirigentes e obviamente levar essa ações a fundo não deixaria muita gente de fora, penso que seria uma fonte de instabilidade política levar essas questões a fundo de forma muito abrangente."
Albano Pedro acredita que "o combate à corrupção vai ter uma nova abordagem, em que a questão das prisões e indiciamentos criminais serão mais ponderadas como parece já se estar a sentir. De qualquer forma a questão da Isabel dos Santos é muito mais notória que a do irmão [Zenú] e é natural que o processo dela não ficasse na condição em que está, [esperava-se] que tivesse seguido a diante."
Isabel dos Santos com discurso mais moderado
Enquanto a situação de Isabel dos Santos permanece em "banho-maria", pelo menos publicamente, nota-se agora do lado da visada um discurso mais moderado e um esforço notório em defender-se face às constantes acusações de que é alvo.
De lembrar que logo a seguir a tomada de posse de João Lourenço a "princesa" e a sua irmã Txizé chegaram a mesmo a proferir palavras que roçavam o desrespeito pelo novo Presidente. Mas desde a detenção do irmão Zenú as manas controlam melhor as suas palavras.
Será essa moderação uma tentativa de Isabel dos Santos se imacular antevendo já momentos difíceis? Albano Pedro afirma que "não é só uma questão de Isabel dos Santos, a gestão dela está a testa de um conjunto de operações que envolvem muitas outras entidades e o grupo vai reagindo através dela."
"Também sabemos que em muitas casos ela tem estado a dar o peito exigindo que as pessoas apresentem provas em relação às acusações. E essa troca de mimos também pode indiciar alguma fraqueza da parte das autoridades judiciais e governamentais em não conseguir provar com grande sustentabilidade grande parte das acusações feitas contra a Isabel", aventa Pedro.