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Angola: TC considera inconstitucional condenação de "Zenu"

Lusa
4 de abril de 2024

Tribunal Constitucional de Angola declarou inconstitucionalidade do acórdão que condenou também Valter Filipe da Silva, ex-governador do Banco Central. Em outra decisão, TC chumbou pedido de destituição do PR angolano.

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Angola Palast der Gerechtigkeit in Luanda
Foto: DW/B. Ndomba

De acordo com o TC angolano, foram igualmente violados os princípios do julgamento justo e conforme e do direto à defesa.

Para o plenário dos juízes do TC, em acórdão datado de 03 de abril de 2024 e hoje tornado público, o arresto os bens dos arguidos violou os princípios constitucionais referindo, no entanto, que o recurso procede, devendo os autos baixar às instâncias devidas "para que sejam expurgadas as inconstitucionalidades verificadas".

A posição do TC vem em resposta ao recurso extraordinário de inconstitucionalidade remetido ao órgão por Valter Filipe da Silva, Jorge Guadens Pontes Sebastião, José Filomeno dos Santos "Zenu" e António Samalia Bule Manuel condenados pelo Tribunal Supremo, em 2020, pela prática dos crimes de peculato, burla por defraudação e tráfico de influência, com penas fixadas entre cinco e oito anos de prisão, no conhecido caso "500 milhões".

Entendem os requerentes que o acórdão do Supremo não observou o princípio da legalidade pois, "fez tábua rasa a questões prévias essenciais para a descoberta da verdade material", tais como, "ter desvalorizado" as respostas dadas pelo então Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, que morreu em julho de 2022 em Espanha.

Violação dos princípios da legalidade, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, da ampla defesa, da presunção de inocência, do processo justo e equitativo, do dever de fundamentação das decisões judiciais e do contraditório estão entre as queixas dos recorrentes.

De acordo com o plenário do TC, houve uma "desconsideração" do Tribunal Supremo em relação à carta constante dos autos, assinada pelo declarante José Eduardo dos Santos, em que autoriza Valter Filipe da Silva, ex-governador do Banco Nacional de Angola (BNA), a movimentar somas de dinheiro.

Referem que o julgamento foi conduzido sem a valoração da carta de José Eduardo dos Santos, considerada "essencial para a descoberta da verdade material" colocando assim em causa a salvaguarda de garantias constitucionalmente consagradas, o direito à defesa e o princípio do contraditório.

Perante o conteúdo das respostas, assinala o Constitucional, o Supremo desvalorizou a carta-resposta de José Eduardo dos Santos por considerar não terem sido cumpridos os requisitos de autenticação da assinatura do declarante, nem mesmo o procedimento legal de envio.

"Em face ao exposto, esta corte entende que, por não ter sido admitida da carta-resposta do antigo Presidente da República, nos termos em que ocorreu, o acórdão objeto do presente recurso violou os princípios da presunção de inocência e do contraditório, bem como o direito à defesa", lê-se na decisão, de 22 páginas.

Conclui igualmente o Constitucional angolano que foi violado o direito a um julgamento justo e conforme, à luz das normas da Constituição angolana, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.

O plenário entendeu também afastar da moldura penal concreta o crime de burla por defraudação, imputados os requerentes, "por não estarem reunidos os elementos do tipo" e nesta condição o TC infere que não foi posta em causa a alegada violação do princípio da imutabilidade da acusação.

Quanto à queixa sobre violação do direito a um julgamento justo, consideram os juízes que foram verificadas desconformidades constitucionais de certos procedimentos tomados no decurso do processo, como é o caso da não admissibilidade de prova documental relevante (carta do antigo Presidente da República), concluindo existir violação desse direito.

Especialista defende reformas na Justiça angolana

Destituição do PR chumbada

O Tribunal Constitucional (TC) angolano recusou o pedido de declaração de inconstitucionalidade da reunião plenária da Assembleia Nacional (Parlamento) em que a maioria travou o pedido da UNITA, oposição, de destituição do Presidente angolano, foi hoje anunciado.  

Em dezembro do ano passado, o grupo parlamentar da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) remeteu junto do Tribunal Constitucional um processo sobre a fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade de norma do Regimento da Assembleia Nacional (RAN), no âmbito do processo de acusação e destituição do Presidente da República.

Num acórdão hoje divulgado, os juízes conselheiros do Tribunal Constitucional decidiram "negar provimento ao pedido de declaração de inconstitucionalidade da norma n.º 3 do artigo 284.º do Regimento da Assembleia Nacional".

Na decisão, de 30 páginas, o plenário de juízes argumentou que o processo de destituição do Presidente da República no ordenamento jurídico angolano não é um ato de exclusiva competência dos tribunais, depende da intervenção dos dois órgãos de soberania, a Assembleia Nacional e os tribunais.

O plenário de juízes reforçou ainda que a função dos tribunais só é concretizada quando decidida pela Assembleia Nacional, sendo por isso a intervenção dos tribunais neste processo tão necessária quanto a deliberação do Parlamento.

De acordo com o acórdão, as competências conferidas aos tribunais superiores referidas nos n.º 3 e 4 do artigo 129.º da Constituição da República de Angola encontram-se constitucionalmente condicionadas a uma iniciativa da Assembleia Nacional, cuja atribuição lhe cabe com exclusividade, de acordo com o n.º 5 do mesmo artigo da Constituição.

"Assim sendo, quer o Tribunal Supremo, quer o Tribunal Constitucional, conforme o caso, não podem promover a responsabilização criminal e a destituição do Presidente da República sem que haja o impulso acusatório da Assembleia Nacional", lê-se no acórdão.

João Lourenço, Presidente de Angola
João Lourenço, Presidente de AngolaFoto: Timothy A. Clary/AP/picture alliance

Histórico do caso

O grupo parlamentar da UNITA reclamou que a presidente da Assembleia Nacional, Carolina Cerqueira, na sessão plenária extraordinária de 14 de outubro de 2023, violou os preceitos legais sobre a criação de uma Comissão Eventual e a definição de um prazo para a elaboração do relatório parecer.

Segundo o grupo parlamentar do maior partido da oposição, Carolina Cerqueira, "foi forçada" a recorrer a vários "expedientes extra-regulamentares" e inconstitucionais para impedir que os deputados votassem, de forma secreta, a favor ou contra a criação da "Comissão Eventual" que trataria de acompanhar o processo de destituição do Presidente da República, proposto por 90 deputados da UNITA. 

A UNITA considera que em causa estiveram violações ao Regimento da Assembleia Nacional e à Constituição da República de Angola (CRA), impostas por Carolina Cerqueira durante a sessão plenária extraordinária, convocada no dia 13 de outubro, pela Comissão Permanente do Parlamento para deliberar sobre a criação ou não da "Comissão Eventual", que se encarregaria de produzir o relatório parecer da proposta da UNITA de destituição de João Lourenço.

Nos termos da Constituição da República e do próprio Regimento da Assembleia Nacional, as votações são feitas antecedidas de num projeto de resolução, porém, em 14 de outubro de 2023, Carolina Cerqueira decidiu inverter as regras do "jogo democrático" e impôs uma deliberação sem a presença de tal instrumento, o que desencadeou o caos entre os deputados da UNITA e do MPLA.

Em 18 de outubro de 2023, a UNITA anunciou que ia intentar uma ação judicial junto do Tribunal Constitucional, na sequência da violação do Regimento da Assembleia Nacional e dos incidentes do dia 14 de outubro de 2023, em que os deputados foram 'obrigados' a deliberar sem um projeto de resolução.

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