Angola: Tiros em marcha de crianças "violam todas as normas"
17 de outubro de 2022O diretor nacional dos Direitos Humanos, Yannick Bernardo, condena a atitude da polícia, que, na semana passada, disparou com armas de fogo para reprimir um protesto em que participavam alunos entre os 8 e os 15 anos de idade.
"Isso viola todas as normas que Angola ratificou à nível internacional e todo o nosso ordenamento jurídico de proteção e garantia do bem-estar da criança. É uma atitude que deve ser reprovada de todos os modos", disse Yannick Bernardo em declarações exclusivas à DW África.
Os alunos protestaram na quinta-feira passada (13.10) contra a falta de carteiras na escola pública 5018, no município de Viana, em Luanda.
Yannick Bernardo sublinha que os disparos foram "um erro", que não se pode repetir: "O Estado angolano não tem e não deve ter compromisso com erros", afirmou.
Manifestação "sem autorização" dos pais
O diretor nacional dos Direitos Humanos criticou, no entanto, o professor que mobilizou as crianças para o protesto, na semana passada. O docente foi detido, mas já está em liberdade.
"Olhamos com alguma preocupação, na medida em que, tratando-se de crianças, em momento algum deve ser realizada qualquer ação sem que estas crianças tivessem a autorização dos pais. E a exposição destas crianças ao risco de um atropelamento, ao risco de pôr em causa a integridade física delas, é algo que deve ser desencorajado", disse Yannick Bernardo.
Governo "não sabe" o que se passa nas escolas
Esta e outras questões sobre repressão policial de manifestantes motivaram uma reunião, esta segunda-feira (17.10), entre a Direção Nacional dos Direitos Humanos e o Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA).
A porta-voz do movimento, Milena Ernesto, disse que as condições de higiene das escolas, bem como a falta de materiais didáticos e o número de crianças fora do sistema de ensino foram outros temas analisados no encontro.
"Temos mais de 4.000 crianças fora do sistema do ensino. O Governo desconhece esse número. O Dr. Yannick Bernardo afirmou que estão a trabalhar no sentido de pesquisarem mais sobre os problemas no setor da educação, porque eles não sabem o que está acontecer."
Formação para polícias sobre direitos humanos
Yannick Bernardo garante, entretanto, que o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos está a trabalhar com as organizações da sociedade civil e com a polícia para reduzir a repressão e o uso "abusivo da força", e para que os organizadores de manifestações cumpram com os requisitos legais.
Segundo a Direção Nacional dos Direitos Humanos, Angola registou, no ano passado, 286 protestos. Oito deles foram considerados violentos e resultaram em detenções de manifestantes.
O Ministério da Justiça tem em curso um projeto de formação dos efetivos da polícia em matéria de direitos humanos, explicou Yannick Bernardo.
"Temos de formar a nossa polícia em matéria de direitos humanos. E temos de formar também a nossa sociedade civil nestas matérias, para que haja cada vez mais harmonia na realização de manifestações e impedir incidentes que prejudiquem a ordem e a paz social", concluiu o responsável.