UNITA pede investigação ao "braço direito" do Presidente
22 de setembro de 2020Segundo uma reportagem da TVI, o Governo angolano terá favorecido o chefe de gabinete do Presidente João Lourenço em contratos públicos com a empresa "EMFC – Consulting, S.A", da qual Edeltrudes Costa é proprietário. O negócio de prestação de serviços terá valido ao "braço direito" do chefe de Estado vários milhões de euros.
A denúncia está a preocupar o maior partido da oposição em Angola, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), que pede a investigação do caso.
"Devemos fazer pressão e exigir que haja responsabilização criminal do diretor do gabinete do senhor Presidente da República", defende o deputado da UNITA Nelito Ekuikui.
Segundo o parlamentar, a luta contra a corrupção de João Lourenço pode sair "beliscada" com o caso que envolve Edeltrudes Costa. "O senhor Presidente da República nunca esteve comprometido com o combate ao nepotismo, à fuga de capitais de Angola e ao saque do erário público. Não sai apenas abalado Edeltrudes Costa, como abala toda uma estrutura do senhor Presidente da República. Em circunstâncias normais, depois da denúncia feita, nós tínhamos que ter um despacho de exoneração e encaminhar o senhor para as instâncias de Justiça", comenta Nelito Ekuikui.
Edeltrudes Costa vai "sobreviver" politicamente?
O analista David Sambongue junta-se ao coro das personalidades que pedem a exoneração do "braço direito" do Presidente, que já tinha desempenhado outras funções governativas antes de João Lourenço tomar posse em 2017.
"Acho que deve haver a responsabilização de Edeltrudes Costa através de mecanismos jurídicos e administrativos. O Presidente da República deve aplicar uma sanção administrativa, que é exonerá-lo do cargo de diretor de gabinete", arremete.
Mas o chefe de Estado é acusado de estar a abrir uma exceção na luta contra a corrupção no país, protegendo os que lhe estão mais próximos na Cidade Alta, o palácio presidencial. A DW África contactou o Executivo angolano - no entanto, não obteve qualquer resposta.
Em fevereiro deste ano, numa entrevista exclusiva à DW África, o chefe de Estado reconheceu que mudar o sistema de que ele próprio faz parte é uma tarefa difícil. "É precisamente pelo facto de eu ter assistido ao longo desses anos a esses níveis de corrupção, e por não concordar que a situação continuasse, que hoje estamos a combater aquilo que vimos ao longo de décadas", referiu na altura.
"Sabemos que é preciso muita coragem. Encontramos alguma resistência. Preferimos lutar contra ela do que nos acomodarmos e deixar que as coisas continuem como antes", acrescentou.
Corrupção entranhada no sistema
Para o analista David Sambongue, os problemas na luta contra a corrupção são sistémicos em Angola e, por isso, são necessários mais sistemas de controlo. "A nossa Constituição formal diz que o nosso Estado se prima pelo princípio da separação de poderes. Todavia, na prática, nós não temos a separação de poderes. Repare que, através do acórdão 319, foi coartado à Assembleia Nacional um dos seus direitos e prerrogativas de fiscalizar as ações do titular do poder executivo", frisa.
Por outro lado, o ativista cívico Fernando Sakwayele entende que muitos destes escândalos são criados para limpar a imagem do partido no poder, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). "Criam-se escândalos atrás de escândalos a uma velocidade de cascata, de modo a envolver toda a sociedade na emotividade de que algo está a mudar, e, aos poucos, nós vamos tendo cada vez mais figuras de topo e em 2021, 2022, a última figura que poderá ser sacrificada será o presidente José Eduardo dos Santos", comenta.
"O sistema vai ceder os anéis e vai conservar os dedos para depois voltar a articular-se e colocar um outro anel", lamenta o ativista.