Angola é o país lusófono com o mais elevado índice de mortalidade infantil
17 de setembro de 2014No relatório "Compromisso pela Sobrevivência Infantil - Um Promessa Renovada", recentemente divulgado pela UNICEF, Angola surge como o país lusófono com a maior taxa estimada de mortalidade de menores de cinco anos.
Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância, entre os países que falam português, Angola também é o país com a menor a taxa de redução anual de mortes infantis registada entre 1990 e 2013.
Estes números negativos não surpreenderam o representante da organização em Angola. Francisco Songane diz que “a situação já é conhecida” e que em termos de metodologia, a análise apresentada no relatório está correcta, “mas não reflete a realidade do país.”
Porque as estimativas utilizadas não são atuais e há poucos “dados de qualidade” para se poder fazer uma comparação “justa” e “detalhada” de Angola com outros países, explica. “As estimativas que são utilizadas para fazer esses modelos, para o caso de Angola, são antigas”, frisa o responsável, referindo-se ao inquérito do bem-estar da população feito em 2008 e referente 2005/2006.
Entretanto, segundo Francisco Songane, nesse período houve trabalho que foi feito que não está a ser refletido nestes modelos e projecções feitos pelo grupo técnico interagências das Nações Unidas. “Aqui é que reside o problema.”
Progresso pós-guerra
Francisco Songane reconhece que os números de mortalidade infantil são elevados, mas lembra que a guerra em Angola durou até 2002. E, nesse contexto, defende, é preciso ter em conta o que foi feito desde então para que o regresso do país à normalidade.
“Foi feito um grande esforço para repor aquilo que é o básico em termos de rede sanitária, transportes e pessoal técnico e qualificado para o fornecimento de serviços”, defende.
Nessa perspectiva, acrescenta, “e tendo em conta a cifra que temos hoje de 167 mortes de crianças menores de cinco anos por cada mil nascidas, há uma tendência positiva. Evidentemente, esta cifra ainda é muito alta.”
Em maio, Angola realizou o primeiro censo desde que obteve a independência. A última contagem da população angolana tinha sido feita há 44 anos. Por isso, o representante da UNICEF em Angola acredita que dentro de cerca de dois anos poderá ser feita uma leitura melhor e mais próxima da realidade em termos de indicadores sociais.
É preciso “reduzir assimetrias”
O crescimento económico de Angola, porém, não se tem refletido na saúde do país. O Orçamento Geral do Estado para 2014 atribuiu à saúde apenas 4,3% do seu valor global, ainda menos do que no ano passado.
Por isso, Francisco Songane também defende que os recursos de Angola – que é o segundo maior produtor de petróleo da África subsaariana – devem ser utilizados de modo a “reduzir as assimetrias”.
“Aquilo que está a ser atribuído dos fundos públicos para os setores sociais ainda é pouco. Outro aspecto que é preciso realçar é que é preciso começar a pensar numa utilização melhor dos recursos que este país tem, de modo a prestar atenção à equidade”, sublinha.
Segundo o representante da UNICEF, “há grandes assimetrias, há pessoas que estão em situação muito difíceis, pessoas vulneráveis que não estão a usufruir os avanços feitos pelo país desde 2002”. E fora dos grandes aglomerados urbanos, acrescenta, ainda há “muitas fraquezas” em termos sanitários.
Primeiros dias de vida vulneráveis
Ainda há um milhão de crianças que morre no primeiro dia de vida, maioritariamente de causas evitáveis, lê-se no relatório da UNICEF. Os primeiros 28 dias de vida de um recém-nascido são os mais vulneráveis e é nessa altura que 44% das crianças morre, lembra Francisco Songane.
Em Angola, ainda é dada pouca atenção ao parto e ao período pós-parto, sobretudo primeira semana após o parto, afirma o responsável. “É nas complicações durante o parto e na primeira semana pós-parto que reside uma boa concentração das grandes causas de morte das crianças menores de cinco anos e da própria mãe”, explica.
Segundo a UNICEF, muitas das mortes de recém-nascidos podiam ser facilmente evitadas “com intervenções simples, eficazes e de baixo custo antes, durante e imediatamente após o nascimento.” Em Angola, no entanto, não há condições nem camas para manter as mães nos hospitais 48 horas após o parto, “como mandam as regras”, lamenta Francisco Songane.
De acordo com o relatório, o Brasil, o melhor lusófono excluindo Portugal, registou em 2013 uma taxa estimada de mortalidade de menores de cinco anos de 14 (probabilidade de mortes por cada mil crianças nascidas vivas). Por ordem crescente, o segundo melhor país lusófono foi Cabo Verde, com 26 mortes prováveis em cada mil, seguido de São Tomé e Príncipe com 51, Timor-Leste com 55, Moçambique com 87 mortes prováveis, e Guiné-Bissau com 124.