RCA: apelo ao diálogo durante visita de Guterres
26 de outubro de 2017Durante uma conferência de imprensa conjunta com o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, o Presidente da República Centro-Africana, Faustin-Archange Touadera, disse que o diálogo com os grupos armados está no "centro" da sua estratégia.
Guterres e Faustin-Archange Touadera estiveram reunidos, esta quinta-feira (25.10), em Bangui, para falar do programa de "desarmamento, desmobilização e reintegração", que conta com o apoio da Organização das Nações Unidas (ONU).
O secretário-geral da ONU apelou aos grupos armados centro-africanos para que "aceitem participar na vida política do país", deixando as armas.
As circunstâncias da visita de Antonio Guterres à República Centro-Africana não podiam ser mais explosivas. Apesar da presença de 12.500 capacetez azuis da Missão de Paz das Nações Unidas, a MINUSCA, são cada vez mais frequentes os massacres em massa de civis.
O secretário-geral da ONU visitou, na quarta-feira (25.10), Bangassou, uma localidade cristã, com cerca de 35 mil pessoas, a leste de Bangui, que tem sido o principal palco de violência. Há poucos dias, um ataque com milícias armadas em Bangassou causou mais de uma úzia de mortos, nove eram soldados da paz.
Tristeza e fúria entre a população
A guerra civil estalou na República Centro-Africana na sequência do golpe de Estado de 2013, que depôs o Presidente François Bozizé. Milhares de civis perderam as suas vidas na guerra que já conta com cerca de um milhão de deslocados.
A situação é tensa e complexa: grupos armados, que instrumentam as suas diferenças étnicas e religiosas (muçulmanos e cristãos), aterrorizam a população, que reage com a formação de milícias de autodefesa. Assim, a espiral de violência prossegue perante um Governo importente.
Com a recente escalada de violência, a capital Bangui vive numa mistura de tristeza e fúria. "A República Centro-Africana está mal", lamenta Paul-Crescent Beninga, porta-voz de um grupo de trabalho da sociedade civil. "A insegurança está a aumentar", acrescenta.
Paul-Crescent Beninga e outros elementos da sociedade civil querem, nos próximos dias, vestir-se de preto, em luto pelas vítimas do conflito, e marchar contra a violência no país.
O secretário-geral das Nações Unidas participou num feneral no início da sua visita ao país, onde chegou na terça-feira (24.10). "Nada é mais precioso que a paz. Não há ato mais nobre do que preservar a paz, mesmo quando isso significa preservar a vida", disse Guterres. Segundo o secretário-geral da ONU, a comunidade internacional ainda não se empenhou o suficiente para ajudar a República Centro-Africana.
António Guterres quer prolongar MINUSCA
O mandato da MINUSCA termina já em novembro, pelo que o Conselho de Segurança tem de decidir sobre um possível prolongamento da missão. O secretário-geral da ONU chegou, portanto, com uma missão clara: chamar a atenção para a precária situação de segurança no país e promover um novo mandato da missão de paz, mais robusto com um reforço de 900 capacetes azuis.
Mas, de acordo com muitos observadores, a falta de pessoal e de recursos não são os principais problemas da MINUSCA. As acusações de abusos sexuais, de inoperância e de parcialidade têm vindo a manchar a missão.
"A visita do secretário-geral das Nações Unidas espero que signifique que as críticas à missão da ONU vão ser atendidas de forma mais eficaz, para mostrar às populações que as suas preocupações são levadas a sério e que há vontade de fazer mudanças", afirma Tim Glawion, especialista na África Central no Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (GIGA), em Hamburgo.
Reconquistar a confiança da população
Segundo Tim Glawion, os problemas de forças de paz são, muitas vezes, percebidos internacionalmente de forma diferente do que no próprio país. Por exemplo, os militares envolvidos em escândalos de abuso sexual foram rapidamente mandados embora. O que não aconteceu em relação aos soldados acusados de não protegerem a população.
"É difícil para as pessoas entender por que o abuso sexual é visto como pior do que admitir massacres de civis", explica o especialista do GIGA, Tim Glawion.
António Guterres também está preocupado em reconquistar a confiança na MINUSCA. Uma tarefa difícil: "O problema central das forças de paz da ONU é que têm de prestar contas não à comunidades locais, mas à comunidade internacional e aos seus países de origem", diz o cientista político. O que pode contribuir para que "900 soldados mais continuem a não fazer nada no terreno”" conclui Tim Glawion.