15+2 condenados a penas entre 2 e 8 anos de prisão
28 de março de 2016O tribunal de Luanda condenou, esta segunda-feira (28.03), os 17 ativistas angolanos, acusados de atos preparatórios de rebelião e de organização de malfeitores, a penas que variam entre dois anos e três meses e oito anos e seis meses de prisão efetiva.
Domingos da Cruz, autor do livro "Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura" e tido como "líder" da organização criminosa, deverá cumprir 8 anos e seis meses de pena. O ativista luso-angolano Luaty Beirão, acusado também de falsificação de documentos, foi condenado a cumprir cinco anos e seis meses de prisão.
Os ativistas Nuno Dala, Sedrick de Carvalho, Manuel "Nito Alves", Inocêncio de Brito, Laurinda Gouveia, Fernando António "Nicola", Afonso Matias "Mbanza-Hamza", Osvaldo Caholo, Arante Kivuvu Lopes, Albano Evaristo Bingobingo, Nélson Dibango Mendes dos Santos, Hitler Jessy Chivonde e José Gomes Hata foram condenados a 4 anos e seis meses. Rosa Conde e Benedito Jeremias foram condenados a 2 anos e 3 meses de prisão.
O Ministério Público e os advogados de defesa anunciaram que vão recorrer da decisão.
"Estamos indignados e inconformados com a decisão, porque, em nosso entender, não tem fundamentação. Aliás, é estranho que, partindo de uma premissa de absolvição dos arguidos do crime de atentado ao Presidente, o discurso não variou", afirmou o advogado de defesa Luís Nascimento.
Durante as alegações finais, a 21 de março, o Ministério Público deixou cair a acusação de atos preparatórios para um atentado contra o Presidente angolano, José Eduardo dos Santos. Porém, continuou a pedir a condenação por preparação de uma rebelião, que deu como provada, e indiciou os ativistas por um outro crime, de associação de malfeitores.
Mentalizados para condenação
Este mês, o ativista Domingos da Cruz disse em entrevista à DW África que estava à espera de ser condenado: "Tendo em conta que Angola não tem sistema judicial, acho que seremos condenados. Não espero outra coisa que não seja a condenação".
Da Cruz ecoava assim as palavras de outro dos acusados, Luaty Beirão, que, logo no arranque do julgamento, a 16 de novembro, afirmou à agência de notícias Lusa que estava mentalizado para a condenação. "Vai acontecer o que o [Presidente] José Eduardo decidir", afirmou na altura.
Nesse dia, vários ativistas apareceram em tribunal descalços e com dizeres nas fardas prisionais: "Recluso do Zédu", lia-se numa camisola. Outro ativista escreveu "in dubio pro reo [princípio da presunção da inocência]. Nenhuma ditadura impedirá o avanço de uma sociedade para sempre."
Mais de quatro meses e meio de julgamento
A defesa criticou de forma constante as demoras no julgamento dos 15+2. O juiz da causa, Januário Domingos, mandou ler na íntegra o livro de Domingos da Cruz, que os ativistas estudavam durante reuniões semanais em Luanda e que é usado como prova no processo. As 184 páginas das "Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura" foram lidas durante duas sessões.
Mais tarde, dezenas de personalidades angolanas foram notificadas pelo tribunal para comparecer no julgamento, por fazerem parte de uma lista divulgada online de um alegado Governo de salvação nacional. Segundo a acusação, esse seria um Executivo que assumiria o poder em Angola após a rebelião pensada pelos ativistas. Declarantes faltaram à chamada e várias sessões tiveram de ser adiadas.
Amnistia Internacional: "Dia muito triste"
A Amnistia Internacional (AI) sublinhou, esta segunda-feira, que o julgamento dos 17 ativistas angolanos foi pautado por "muitas irregularidades". Em entrevista à DW África após a leitura da sentença, a organização de defesa dos direitos humanos notou ainda que "as condenações nem deveriam ter existido".
"Não deveria ter existido sequer um julgamento. Estamos a falar de cidadãos angolanos que estavam reunidos, a falar sobre liberdade e democracia. Estavam a discutir um livro", diz Ana Monteiro, coordenadora de campanhas da AI em Portugal.
"Este é um dia muito triste para a liberdade de expressão e de associação", afirma. "Tudo o que aconteceu durante o julgamento é uma forma de perseguição de vozes que são críticas ao regime. […] Para nós, estes ativistas são prisioneiros de consciência, tal como José Mavungo, e devem ser libertados e absolvidos de qualquer acusação."
"Um dos piores erros"
O ativista angolano Pedrowski Teca critica a falta de independência dos tribunais: "Este tribunal acabou de cumprir orientações do senhor Eduardo dos Santos e do seu MPLA [Movimento Popular de Libertação de Angola]".
"É lamentável", continua Teca. "Como ativista cívico e namorado de uma das moças que foi condenada, digo que este é um dos piores erros que o regime de Eduardo dos Santos e o MPLA, auxiliados por este sistema judiciário, cometeram."
José Eduardo Agualusa também falou em "erro estratégico" em declarações à agência Lusa. O escritor angolano considera que as sentenças dos ativistas são "políticas" e irão "reativar" a onda de solidariedade para com os jovens.
Ainda antes de serem divulgadas as sentenças, o movimento Liberdade aos Ativistas Presos em Angola e a Amnistia Internacional convocaram, para as 18 horas de Lisboa, uma vigília no Rossio, na capital portuguesa. Foi também convocada uma concentração para o Porto em apoio aos 15+2. Em Luanda, houve, na sexta-feira, sábado e domingo, vigílias de solidariedade com o ativista Nuno Dala, que está em greve de fome. Esta segunda-feira, Dala não compareceu em tribunal.
Nito Alves e Nuno Dala em perigo
Na semana passada, a irmã de Dala disse à DW África que o ativista "corre perigo de vida".
Nuno Dala e outros 14 ativistas estiveram detidos entre junho e dezembro. Depois, as medidas de coação foram revistas, passando a prisão domiciliária. Mas, este mês, o académico foi novamente enviado para a prisão, por se recusar a comparecer em tribunal. Está em greve de fome desde 10 de março, ingerindo apenas água, soro, chá e sumo, reivindicando acesso a contas bancárias, entrega de pertences nas mãos das autoridades e resultados de exames clínicos.
Em janeiro, Manuel "Nito Alves", também já fora levado de novo para a cadeia. O ativista foi condenado em julgamento sumário a seis meses de prisão, por injúrias ao tribunal. Segundo ativistas angolanos, o estado de saúde de Nito Alves é grave, e, esta segunda-feira, Nito foi transportado numa maca para o tribunal de Luanda para ouvir a sentença.
O ativista teve de ser amparado pelos colegas em todos os movimentos de entrada e saída da sala de audiências e o juiz autorizou que permanecesse sentado durante a leitura do acórdão. Familiares e advogados garantem que o jovem não tem recebido a assistência médica necessária.