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O preço do "upgrade" da democracia em Moçambique

Nádia Issufo29 de agosto de 2016

É preciso haver um "vilão" e sangue para que todos os moçambicanos sejam ouvidos e efetivamente incluídos nos processos de tomada de decisão? Perguntas que mereceram respostas pertinentes, mas diferentes.

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Eleições gerais de 2014 em MoçambiqueFoto: picture-alliance/dpa

É quase senso comum, para especialistas em política, que o que está na base da crise político-militar em Moçambique é a necessidade urgente da atualização da democracia. E ela só existe no país desde 1994, depois da guerra dos 16 anos entre o Governo da FRELIMO e a RENAMO, maior partido da oposição.

Atualmente, na mesa de negociações com vista a repôr a paz e a estabilidade, os pontos com vista a alcançar esse objetivo são exigidos ao mesmo Governo pela RENAMO.

O especialista em boa governação do Instituto Superior de Relações Internacionais (ISRI) Silvestre Baessa partilha da mesma visão e recorda que "retirando um e outro ponto relativo ao pacote reivindicativo da RENAMO, todos os outros assuntos que o partido coloca na mesa de negociações são assuntos que já tinham sido levantados por outras forças, sejam nacionais ou estrangeiras."

Baessa apresenta ainda um historial de algumas reivindicações hoje em questão: "Quero recordar que no consulado do Presidente Chissano o país aprovou uma agenda de desenvolvimento a longo prazo, a Agenda 2021, que já continha algumas destas determinantes para a estabilidade política e económica do país, nomeadamente a melhor distribuição da riqueza, a despartidarização das instituições públicas etc. Mais adiante tivemos o Mecanismo Africano de Revisão de Pares que fazia referência aos mesmos pontos que a RENAMO hoje está a reivindicar. E depois tivemos a sociedade civil e o Afrobarómetro sempre a tocarem nos mesmos aspetos, ou seja, que a paz e a estabilidade do país dependiam de um conjunto de indicadores que não foram respeitados. A RENAMO soube, e acho que aí é que está o mérito, soube ouvir e captar estes pontos e transformar em seus pontos de discussão."

Porträt - Silvestre Baessa
Silvestre Baessa, especialista em boa governação do ISRIFoto: privat

Um historial de sangue com apelos ao diálogo

E
m Moçambique, as principais conquistas políticas, como por exemplo a independência e democracia, em que a FRELIMO participou, implicaram guerras com os seus respetivos derramamentos de sangue.

No atual confronto o cenário repete-se, o Governo da FRELIMO toma parte dele, mas as críticas de várias correntes locais estão direcionadas para a RENAMO, apesar da sua causa ser considerada nobre.

Para Patrício José, especialista em direito internacional e vice-ministro da Defesa, não é a todo o custo que se conquista essa maturidade democrática. Também ele recorre ao passado: "Todo o processo democrático tem a sua história e o seu percurso."

Para ele "todas as mudanças que forem necessárias num sistema político têm espaço para discussão. O que é errado é discutir isso com armas, até negando a própria Constituição em que ela própria, a RENAMO, participou na sua aprovação. Essa é que é a questão de fundo, o processo de descentralização nunca é completo."

Embora a via negocial e o diálogo sejam hoje chamadas ao discurso, essas modalidades não terão sido devidamente tomadas em conta pelo Governo da FRELIMO.

O especialista em boa governação Silvestre Baessa coloca o maior partido da oposição numa posição única no que diz respeito a atualização da democracia: "Eu creio que neste momento a única força em Moçambique com capacidade de negociar com o Governo é precisamente a RENAMO. Portanto, todos os outros que levaram estes pontos nunca tiveram a capacidade e a força suficiente para colocar esse [assunto] no fórum negocial tal como a RENAMO."

Diferencial e pontos em comum

Também importa lembrar que o que diferencia a RENAMO de todas as outras forças da sociedade civil, e até dos outros partidos, é o facto de ser um partido armado, o que nos leva a deduzir que só a força das armas obriga o Governo da FRELIMO a refletir e a negociar sobre uma atualização da democracia. Portanto, uma responsabilização pelo derramamento de sangue, danos materiais e danos económicos poderia ser partilhada.

Silvério Ronguane
Silvério Ronguane, analista político e membro do MDM, a segunda maior força da oposiçãoFoto: privat

Mas esse não é o único ponto a ser partilhado nesta crise. Silvério Ronguane, analista político e membro do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) a segunda maior força da oposição, toma em conta o papel de outros atores: "Aquelas ideias que são populares e que a RENAMO defende é evidente que muita gente as defende e é evidente que muita gente vai gritando no mesmo sentido e essas teses vão ganhando corpo. Não considero que só a RENAMO tenha essa capacidade [de negociar com o Governo]. Considero que as teses autênticas, verdadeiras e válidas sejam defendidas por qualquer outro grupo. Tarde ou cedo acabam vingando."

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