Biafra: O sonho de um Estado independente
30 de maio de 2017Seja em garrafas de cerveja, em bandeiras ou em posters nas ruas: no sudeste da Nigéria, o sol nascente está um pouco por todo o lado. Este é o símbolo de um Estado que deixou de existir, a República do Biafra, que declarou a independência há 50 anos. Seguiu-se uma guerra civil sangrenta e, com a derrota dos separatistas, em 1970, falar no Biafra tornou-se tabu.
Mas, décadas depois, já se discute de novo o Biafra nas ruas. Na cidade de Enugu, Kingsley Okah fala apaixonadamente sobre o antigo Estado. O jovem de 27 anos estudou Ciências Políticas e cresceu no território da ex-República – e gostaria que o Biafra fosse independente.
Num país com mais de 185 milhões de habitantes pertencentes a 250 etnias, ele diz que se sente marginalizado, apesar do seu grupo étnico, os Igbo, ser um dos maiores na Nigéria. Okah culpa o Governo de Muhammadu Buhari, um muçulmano do norte: "No atual Governo, não há ninguém do Leste".
"O Biafra é a solução"
O jovem não se sente representado no Executivo e, mais do que isso, vê a composição governamental como ameaça: "Se eles quiserem matar o povo do leste, poderão fazê-lo sem problemas. Temos de lutar pelos nossos direitos. O Biafra é a solução."
Esta posição tem conquistado cada vez mais adeptos nos últimos anos, sobretudo entre os jovens. E ouve-se particularmente nesta altura, 50 anos depois da declaração de independência do Biafra, a 30 de maio de 1967, pelo então governador militar Chukwuemeka Odumegwu Ojukwu, após dois golpes de Estado e graves confrontos étnicos.
Nnamdi Kanu tem sido um dos responsáveis pelo reavivar dos debates sobre o Biafra. O líder do movimento dos Povos Indígenas do Biafra (IPOB, da sigla em inglês) foi libertado sob fiança em abril – Kanu esteve mais de um ano na prisão, acusado de conspiração e de pertencer a uma organização criminosa. Organizações de defesa dos direitos humanos, incluindo a Amnistia Internacional, protestaram contra a detenção.
O medo do norte
Kanu encontrou agora refúgio em casa dos pais em Umuahia, no estado vizinho de Abia, e tem recebido inúmeras visitas. "A vida não tem sentido sem o Biafra. Tentámos a Nigéria durante 56 anos, mas não aconteceu nada. Queremos algo novo", afirma em entrevista à DW África. Os seus apoiantes gostam de o ouvir.
Segundo o líder do movimento dos Povos Indígenas do Biafra, hoje em dia, os cristãos do sul têm medo de praticar a sua religião no norte. E, ao nível da economia, a situação não é melhor, diz: "Quem governa a Nigéria são sobretudo os Haússa e os Fulani, do norte. Eles não dão espaço ao desenvolvimento económico."
Críticas
Estas acusações graves contra as duas etnias irritam Mu'asu Said, oriundo de Jigawa e que vive hoje na capital, Abuja.
"Quando se vai para o norte, os Igbo podem fazer os seus negócios de forma pacífica. Ninguém os assedia, nem a nível regional, nem a nível local. Mesmo nas aldeias mais remotas, vivem pacificamente nas suas comunidades. As crianças vão para a escola… não há diferença nenhuma", diz. Para Said, é falso afirmar que os Igbo são marginalizados.
"Luta intelectual"
Apesar das opiniões discordantes, uma coisa é clara para Kingsley Okah: "Não vou pegar em armas para lutar. O que precisamos mais na disputa pelo Biafra é uma luta intelectual. Pode-se despertar as consciências através de artigos em jornais. Quem sente que pode ajudar, pode organizar protestos nas ruas, mas sem recorrer a armas."
Não se sabe ao certo quantas pessoas apoiam realmente o Biafra, e, até agora, ninguém apresentou ideias ou um plano concreto sobre como a República se poderia organizar.