Cada vez mais seropositivos moçambicanos abandonam terapia
26 de abril de 2012
Mais de 66 mil pessoas já abandonaram o TARV desde 2003, altura em que começou o tratamento massivo no país, segundo dados do Ministério da Saúde de Moçambique. Isto equivale a 30 por cento do total de pessoas em tratamento, ou seja, 240 mil.
Alguns dos seropositivos já estão tão fragilizados que não conseguem chegar à unidade sanitária para levantarem os antiretrovirais e acabam por morrer nas suas residências.
Muitos deles, sobretudo as mulheres, preferem fazer algo para alimentar a família a ter que permanecer todo o dia na unidade sanitária à espera de uma consulta com o médico, que por vezes falta.
Efeitos colaterais e autodiscriminação
Outros abandonam o TARV devido aos efeitos colaterais que os comprimidos causam. Mas também há casos de autodiscriminação de pessoas que têm medo de revelarem aos seus familiares o seu estado e que temem também a falta de sigilo de alguns profissionais de saúde.
Uma cidadã moçambicana que pediu para não ser identificada e que tem na família um seropositivo que “luta desesperadamente” contra a doença defende que “os pais deviam ampará-lo por causa da doença de que padece” e acompanhar os tratamentos. “A família não pode deixá-la só porque tem este problema”, sublinha.
Outro cidadão parente de um seropositivo diz que a comunidade deve empenhar-se mais para que os doentes não desistam do tratamento. “Não existe a preocupação de mostrar ao doente o perigo que corre. Se houvesse essa preocupação muito poucos desistiram do TARV porque veriam que estão a colocar a sua vida em jogo”, refere.
Um seropositivo que também prefere manter o anonimato diz que também não são revelados os tipos de alimentos que devem consumir para que o organismo resista aos antiretrovirais.
Autoridades tomam medidas
O abandono ao TARV está a preocupar as autoridades governamentais e até já foi desenvolvida uma estratégia nesse sentido. “Ao invés de irem às unidades sanitárias todos os meses, os doentes poderão organizar-se em grupos e uma parte deverá levantar os medicamentos”, explica a vice-ministra da Saúde, Nazira Abdula. Desta forma, acrescentou, as autoridades esperam “minimizar de certa forma as distâncias e os custos que eles têm que disponibilizar para poder ter acesso ao tratamento”.
A estratégia está a ser implementada em 55 unidades sanitárias. O ministro da Saúde, Alexandre Maguele, diz que se pretende melhorar os serviços prestados aos utentes e que já há melhorias. Admite, porém, que “apesar deste sucesso, este crescimento beneficia menos de 50 por cento das pessoas que precisam de tratamento”, além de persistirem ainda outros desafios para o Serviço Nacional de Saúde, “nomeadamente a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos utentes”.
Moçambique tem cerca de um milhão e setecentos mil seropositivos. Dos cerca de 140 milhões de dólares do orçamento anual do Ministério da Saúde, 78 milhões de dólares são direcionados para tratamentos de pessoas com HIV/SIDA. Porém, o financiamento de 96 por cento do orçamento do Ministério para estes casos advém de doadores, o que coloca Moçambique numa posição de dependência total.
Autor: Romeu da Silva (Maputo)
Edição: Madalena Sampaio/António Rocha