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Campanha eleitoral em Angola: Aumentam os receios de fraude

20 de agosto de 2022

A apenas quatro dias das eleições gerais em Angola, aumentam os receios de fraude eleitoral. "Até hoje, a CNE não publicou os cadernos eleitorais", sublinha o presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD).

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Foto: AP

Na véspera das eleições em Angola, a AJPD apelou à Comissão Nacional Eleitoral (CNE) para agir com "transparência" e deixar de violar a lei eleitoral, para evitar que sejam postos em causa os resultados da votação no próximo dia 24 de agosto.

Em entrevista à DW, o presidente da AJPD, Serra Bango, alerta para eventuais "confusões" no dia da ida às urnas, como já aconteceu noutras eleições, e que muitos eleitores não saibam onde votar.

Em tempo de balanços, Serra Bango critica também a cobertura eleitoral feita pela imprensa pública angolana. Como ponto positivo, destaca a diminuição dos confrontos violentos entre militantes do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) que fizeram manchete noutras épocas eleitorais.

Serra Bango, presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia
Serra Bango, presidente da Associação Justiça, Paz e DemocraciaFoto: DW/N.Sul

DW África: A AJPD apelou à CNE a atuar com transparência e abster-se de práticas que violam a lei. O que querem dizer com tudo isto?

Serra Bango (SB): Queremos dizer que a CNE deve, primeiro, gerir o processo estritamente de acordo ao que está estabelecido na lei orgânica sobre as eleições gerais. Ocorre que, desde o princípio, a CNE está a violar alguns prazos. Há tarefas que deveriam ter sido executadas num período específico e não foram. Continuam a protelar a execução destas tarefas para última da hora. Um primeiro exemplo é o credenciamento dos delegados de lista. Outro exemplo é o credenciamento dos observadores - a CNE criou muitas dificuldades para credenciá-los, apesar de tê-lo feito. Mas ainda assim condiciona a presença dos observadores a determinadas circunscrições eleitorais. Um observador que tiver possibilidades de deslocar-se de uma província para outra, ou de uma circunscrição eleitoral para outra, não pode fazê-lo.

Mas a última de todas elas é o facto de a CNE, até hoje, não ter publicado os cadernos eleitorais - algo que é uma imposição legal. E qual foi o expediente que a CNE encontrou? Publicar no seu site a lista dos eleitores para que os mesmos consultem. Mas não é isso que a lei diz. A lei diz que devem ser os cadernos eleitorais. Quando o eleitor entrar para a cabine, o delegado de lista ou os funcionários que estiverem lá, deverão riscar o nome do eleitor para confirmar que já votou. Em Angola, temos zonas e populações que não têm acesso à internet. Estamos a criar uma ilusão de que estamos numa sociedade em que toda a gente tem acesso à internet e pode ver e localizar o seu nome ou mesa de assembleia.

DW África: Há aqui sinais de que se poderá estar a preparar uma fraude eleitoral que pode afetar a credibilidade destas eleições de 24 de agosto?

SB: Sim, e também há um outro sinal que poderá ocorree. É à última hora a CNE dizer que cada cidadão poderá votar em qualquer assembleia. Isso vai criar uma confusão e dispersão de pessoas. Não estando criadas estas condições, não se respeitando a lei como ela estabelece, é um sinal evidente de que temos uma porta aberta para resultados que poderão não refletir de facto a vontade expressa pelos cidadãos nas urnas.

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DW África: Falemos também da campanha eleitoral, que está na reta final. Na opinião da AJPD, o que é que manchou a campanha eleitoral e o que é que foi positivo nestes dias?

SB: Esta campanha foi manchada pelo comportamento pouco aconselhável da imprensa pública. Durante quase seis meses, vem fazendo a campanha do MPLA - algo que agora faz 24 horas por dia. Outro elemento que manchou a campanha foram as posições que determinados servidores públicos tiveram e como incitavam, ou amedrontavam, a população. Refiro-me aos pronunciamentos do chefe da casa de segurança da presidência. O senhor general Furtado usou a expressão "que haveriam de dar no focinho a todos aqueles que saíssem à rua e se manifestassem contra". Há irregularidades no processo e estas palavras foram depois seguidas por atos de intimidação, com exercícios militares, demonstração de força pela polícia. Mas um aspeto positivo é que não percebemos de forma evidente os confrontos violentos e físicos entre os militantes do MPLA e da UNITA.

DW África: Quais são os seus principais receios para o "dia D", 24 de agosto?

SB: O receio é que haja confusão no dia da votação e existam pessoas que não saibam onde votar. E que algumas assembleias não abram na devida altura ou que não tenham material disponível para votação, como ocorreu em 2012, 2008, no Kikolo e no Cazenga, Viana. Sobretudo naquelas áreas consideradas bastiões da UNITA. Portanto, que haja esta confusão propositadamente criada para inviabilizar o voto dos cidadãos. Há aqui um sentimento generalizado na população de que há muitos simpatizantes de Adalberto da Costa Júnior e não de João Lourenço. Perante este cenário, é provável que o MPLA e o seu candidato, querendo evitar uma derrota, ou uma situação pouco agradável para si, crie, com o beneplácito da CNE, condições para que muitos cidadãos não votem. Se os cidadãos não votam, no sistema de distribuição de voto, quem estiver no poder, e tiver algumas vantagens, sempre terá possibilidades de angariar os votos para si. Por outro lado, a situação é que, desta vez, não consigamos ter um ambiente mais pacífico. Há aqui dois movimentos que se criaram - o "votou sentou" e o "votou bazou" - e essas duas tendências estão a dividir a opinião pública.

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