Comentário: Não à exportação de armas alemãs para Angola
14 de julho de 2011Segundo disse Merkel durante a escala que fez em Luanda no seu périplo africano, na quarta-feira, 13 de julho, empresas alemãs estariam na disposição de fornecer à marinha de guerra angolana barcos de patrulha. O propósito foi severamente criticado pela oposição política alemã.
Em princípio, a lei alemã proíbe a exportação de armas alemãs para zonas de conflito. Um princípio que parece não se aplicar neste caso. Apesar da lei alemã interditar a venda de armas para países onde se verificam conflitos armados, a chanceler alemã prometeu o fornecimento de barcos de patrulha a Angola.
Há décadas que grassa um conflito sangrento no exclave de Cabinda, no norte do país. Vários grupos lutam aqui pela independência do território rico em petróleo. O mundo ainda tem presente o que se passou no Campeonato de Futebol Africano (CAN), em janeiro de 2010, quando rebeldes de Cabinda atacaram o autocarro da seleção nacional do Togo.
E no mar alto, ao largo da costa de Cabinda, produz-se uma boa parte do petróleo exportado por Angola. Não é preciso ter grande fantasia para imaginar que os barcos de patrulha alemães serão utilizados no combate do governo central contra os rebeldes.
Os direitos humanos não passam de teoria
As regras alemãs de exportação de material bélico também preveem a interdição de entrega de armas a países onde são violados os direitos humanos de forma sistemática e duradoira. O que é o caso de Angola. Sucedem-se as ocorrências nas quais ativistas dos direitos humanos e jornalistas são condenados a longas penas de prisão. Regularmente são proibidas manifestações críticas do regime. Só na capital, Luanda, há uma imprensa livre e uma rádio independente. Acresce que, nos últimos anos, o governo arrasou milhares de casas sem indemnizar os seus proprietários, nem oferecer-lhes alternativas, apenas para criar espaço para habitações de luxo.
Quem quiser saber mais, pode consultar os relatórios a propósito de organizações como a Amnistia Internacional, a Human Rights Watch ou a Freedom House. São relatórios que não podem ter passado despercebido aos assessores de Angela Merkel. Assim como decerto sabem que depois de Muammar Kadhafi, José Eduardo dos Santos é o Chefe de Estado que há mais anos detém o poder, sem que tivesse sido alguma vez democraticamente eleito nos 31 anos da sua regência.
Que estabilidade para a região?
O que terá levado Angela Merkel a tomar a iniciativa de oferecer armamento alemão a Angola, numa altura em que a Alemanha debate acaloradamente a venda de tanques à Arábia Saudita, um país que ainda respeita menos os direitos humanos do que Angola?
A chanceler explica pretender apoiar a iniciativa africana de encontrar soluções regionais para os conflitos regionais. O exército angolano deverá ser modernizado para esse fim.
Mas Merkel escolheu o parceiro errado para este projeto. Nos últimos anos, a política externa de Angola teve um papel muito duvidoso no continente. A Costa do Marfim é o exemplo mais recente. Durante muito tempo, Luanda apoiou o Presidente Laurent Gbagbo, derrotado nas legislativas do seu país. E os governantes angolanos observam com grande nervosismo a revolução em curso no norte da África.
Pior ainda: há anos que as forças de segurança angolanas violam sistematicamente imigrantes congoleses na fronteira com a República Democrática do Congo. Uma situação condenada, ainda em fevereiro deste ano, pela ex-Comissária Europeu e atual enviada especial das Nações Unidas contra a violência sexual, Margot Wallström.
Nenhumas armas para Angola
Não pode ser do interesse da Alemanha que os conflitos africanos sejam solucionados por governos que não respeitam os direitos humanos. A África tem que reger-se pelos mesmos critérios que os outros continentes.
A guerra civil em Cabinda, a falta de respeito dos direitos humanos e o papel pouco transparente de Angola como potência regional em África são razão de sobra para que a Alemanha renuncie a fornecer armamento a Angola.
Autor: Johannes Beck
Edição: Cristina Krippahl /António Rocha