O drama dos mineiros moçambicanos na África do Sul
20 de maio de 2022Ouvidos pela DW, a Organização Internacional para as Migrações e associações de mineiros moçambicanos falam sobre a atual situação no país vizinho e de como se pode melhorar a vida dos trabalhadores
Há um histórico de doenças relacionadas com o trabalho migratório nas minas devido às péssimas condições de trabalho e de vida dos mineiros na África do Sul. Contudo, nos últimos 20 anos, a situação melhorou bastante, afirma Sandrine Martin, a responsável pelo Programa de Saúde Migratória da Organização Internacional para Migrações (OIM) em Moçambique. Ainda assim, alerta para os elevados índices de doenças ocupacionais e pede uma rápida intervenção para evitar o pior.
"O problema principal é que a exploração mineira nessa região está associada com elevados índices de doenças pulmonares, principalmente a silicose e a tuberculose. E temos muitos mineiros, ex-mineiros principalmente moçambicanos, espalhados pelo país, que provavelmente tenham uma alta taxa de doenças e que ainda não foram diagnosticados e não foram compensados. O principal problema é que para os migrantes, os trabalhadores moçambicanos, os progressos no acesso a estas indemnizações tem sido parados por muitos anos, há barreiras sistemáticas", afirma.
Acesso às indemnizações
Sandrine Martin considera que a primeira condição para os mineiros iniciarem o processo para o aceso às compensações é o rastreio de saúde ocupacional que pode ser feito nos Centros de Saúde Ocupacional de Ressano Garcia, na fonteira entre Moçambique e Africa do Sul e em dois centros localizados na província de Gaza, por ser a província moçambicana que mais tem enviado mão de obra migrante para a minas sul africanas. Ainda assim, para o caso de mineiros com diagnósticos positivos de doenças ocupacionais, o processo para o aceso as compensação é complexo e pode durar anos.
"O mineiro deve ir à África do Sul no escritório do empregador, para pedir o seu histórico de trabalho para comprovar que realmente trata-se de uma doença de origem ocupacional, e isso implica custos de viagem, depois exigem muitos documentos e a maior parte deles estão escritos em português e devem ser traduzidos em inglês, portanto são muitas barreiras", explicou.
Entretanto, a representante da OIM disse que nos últimos dois anos, como resultado do intercambio entre associações de mineiros moçambicanos, parceiros e os governos de Moçambique e da África do Sul, registaram-se grandes avanços e há sinais de melhorias.
“Em abril de 2022, conseguimos reunir pela primeira vez na historia de Moçambique todos os atores envolvidos nesse processo, as entidades governamentais de alguns países, representantes das empresas que exploram as minas da Africa do Sul, associações da sociedade civil, principalmente dos mineiros moçambicanos, setor privado e parceiros para se eliminar as barreiras que dificultam o processo e se chegar a um acordo para realmente se avançar e fazer chegar as compensações aos mineiros moçambicanos. Acreditamos que em breve teremos os resultados desses esforços", referiu Sandrine Martin.
Saúde e segurança
O mineiro César Mandlate, que conhece bem a realidade na África do Sul, aponta algumas medidas que estão a ser adotadas para garantir o bem-estar dos trabalhadores moçambicanos.
"Neste momento, em termos de saúde e segurança, temos um hospital em Ressano Garcia onde a gente efetua contratos de trabalho. O nosso Governo, em coordenação com a associação dos mineiros e outras associações que fazem parte, contribuiu no sentido de organizar agentes de saúde para a requalificação da saúde dos mineiros. É uma das formas que nos ajuda a melhorar a saúde e prevenir de qualquer doença", comentou o trabalhador moçambicano.
Condições de Trabalho
Vitor Cossa, presidente da Associação dos Trabalhadores das Minas e Farmas da África do Sul (ATMIFAS), considera que a atual situação laboral dos mineiros moçambicanos é favorável. A grande preocupação neste momento é a redução da contratação da mão de obra estrangeira naquele país.
"Muita coisa melhorou, estamos a falar da tecnologia, estamos a falar da capacitação dos próprios trabalhadores, reclamar uma e outra questão é aquilo que às vezes tem existido, mas as dificuldades que nós temos ultimamente é a redução da mão de obra moçambicana. A política sul-africana já não aceita contratar estrangeiros para as minas, só estão a contratar os nativos. Chegamos a atingir 64.000 trabalhadores, mas agora só estamos a falar de 20.000 trabalhadores", constata Vitor Cossa.
A representante da Organização Internacional para Migrações, Sandrine Martin, considera que a coordenação entre setores é a principal chave para a resolução dos problemas dos mineiros moçambicanos.
"Uma coisa que é essencial é ter uma boa colaboração entre a Associações dos Mineiros Moçambicanos, o Ministério do Trabalho e Ministério da Saúde, porque o Governo tem a responsabilidade de proteger os seus trabalhadores. O esforço que o Ministério do Trabalho está a vigorar agora para assegurar que todos os trabalhadores migrantes estão a trabalhar em condições legais e éticas", conclui.