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Conflito Israel-Hamas pode afetar negociações na COP28

Cathrin Schaer
28 de novembro de 2023

As negociações na Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas sempre foram difíceis. Analistas acreditam que conflito em curso, que tem polarizado a opinião mundial, poderá complicar ainda mais a COP28.

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Conflito na Faixa de Gaza tem polarizado a opinião mundial
Foto: Ismail Muhammad/UPI Photo via Newscom picture alliance

No ano passado, o muito elogiado projeto de energia ecológica partilhado pela Jordânia e Israel foi apontado como um exemplo de como políticas de ação climática poderiam trazer um futuro melhor no Médio Oriente.

Ao visitar a região, o ministro da Economia da Alemanha, Robert Habeck, elogiou o que ficou conhecido como projeto "água em troca de energia". Habeck afirmou que se funcionasse conforme planeado, seria um exemplo positivo de como os estados árabes estavam a cooperar com Israel e que "criaria confiança e seria um impulso para a cooperação em vez do confronto".

Este projeto tem como objetivo a troca de energia solar da Jordânia por água dessalinizada de Israel. Contudo, nos últimos dias, a esperança para a sua assinatura parece praticamente perdida.

O acordo provisório foi acordado em novembro do ano passado e o acordo final seria assinado na conferência climática de novembro deste ano, COP28, nos Emirados Árabes Unidos (EAU).

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Jordânia, Ayman Safadi, afirmou, durante uma entrevista televisiva a 16 de novembro, que a Jordânia "já não assinará este acordo”. 

"Podem imaginar um ministro jordaniano sentado ao lado de um ministro israelita para assinar um acordo de água e eletricidade, enquanto Israel continua a matar crianças em Gaza?", acrescentou Safadi. 

O Presidente dos EUA, Joe Biden, a discursar na COP 27 - considerada uma das conferências internacionais mais importantes do mundo sobre alterações climáticas
O Presidente dos EUA, Joe Biden, a discursar na COP 27Foto: Mohamed Abd El Ghany/REUTERS

Danos colaterais

Este pode ser apenas o primeiro exemplo de danos colaterais à COP28 causados pelo conflito entre Israel e o Hamas.

A COP é considerada uma das conferências internacionais mais importantes do mundo sobre alterações climáticas porque reúne todas as partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas.

No entanto, como mostra o acordo israelo-jordaniano, os negociadores presentes na COP28 terão de lidar com algumas repercussões do atual conflito Israel-Hamas.

"A política climática internacional e a ação climática não acontecem no vácuo", disse Ruth Townend, investigadora do grupo de reflexão Chatham House, com sede no Reino Unido, cujo foco de investigação é o risco climático e a diplomacia.

Townend explicou à DW que "as posições dos governos são moldadas pelo contexto geopolítico mais amplo, que restringe ou permite uma ação e influência eficazes".

Analistas sugerem que há uma série de formas pelas quais o conflito Israel-Hamas poderá impactar as negociações da COP28.

Espera-se que a COP28 deste ano seja a maior de sempre e a segurança poderá ser uma preocupação para alguns dos cerca de 70.000 delegados esperados no Dubai.

Os Emirados Árabes Unidos, uma monarquia que, de acordo com grupos de direitos humanos como a Amnistia Internacional, não permite protestos não autorizados ou antigovernamentais, não tem visto os mesmos tipos de protestos violentos e anti-Israel que outras nações da região.

No entanto, existem preocupações e algumas empresas reagiram. Por exemplo, no início de novembro, o banco suíço UBS alertou os seus funcionários contra viagens de negócios ao Médio Oriente.

Israel planeava enviar cerca de 1.000 delegados ao Dubai. O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, também foi convidado a participar.

A DW perguntou ao Ministério do Meio Ambiente de Israel se o país ainda planeia enviar tantos delegados e políticos para a COP28, mas o Ministério não respondeu.

Ativistas pelo clima protestam durante COP do ano passado
Ativistas pelo clima protestam durante COP do ano passadoFoto: Peter Dejong/AP Photo/picture alliance

Ação climática poderá perder foco

O financiamento para iniciativas climáticas também poderá ser afetado, segundo os especialistas. A continuidade do conflito terá um impacto negativo na economia mundial, alertou o Fundo Monetário Internacional (FMI), o que pode influenciar quanto dinheiro está disponível para combater as alterações climáticas e como as nações mais ricas - e mais poluentes - se posicionam relativamente à compensação financeira dos países mais pobres e menos desenvolvidos.

Outro impacto menos tangível pode refletir-se nas atitudes de diferentes países na negociação de acordos de proteção ambiental. Especialistas afirmam que alguns dos diplomatas que normalmente se preparam para as conversações na COP28 poderão ter sido distraídos pelo conflito.

Também é possível que diplomatas de certos países estejam menos dispostos a comprometer-se com outros, devido a posicionamentos diferentes face ao conflito, como explica Federico Tassan-Viol, conselheiro político italiano para a diplomacia no clima.

"Devido à posição do mundo ocidental neste conflito, eles [o Ocidente] têm agora de mostrar que estão interessados no desenvolvimento multilateral e na luta global contra as alterações climáticas", explicou à DW.

"Na verdade, esta poderia até ser uma oportunidade para uma cooperação mais estreita, para mostrar que estão a falar a sério quando se trata de alterações climáticas. Estas negociações podem ser um meio para alcançar a paz e a segurança", acrescentou Tassan-Viol.

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Apesar da lista de potenciais impactos, a maioria dos observadores acredita que os anfitriões, os EAU, farão o seu melhor para separar a COP28 do conflito em Gaza.

Cada dia da COP28 tem como foco principal um determinado tema e o dia 3 de dezembro concentra-se na "Saúde, Recuperação e Paz”.

Nesse dia, "alguns países provavelmente serão mais eloquentes sobre justiça ou liberdade”, disse Tassan-Viol. "Mas isso não deverá ter grande impacto na agenda final da COP28”, acrescentou, referindo-se ao facto de as negociações sobre detalhes técnicos dos acordos terem começado muito antes da COP28.

"Do ponto de vista técnico, penso que em muitos aspetos, os trabalhos preparatórios deram uma direção clara e o caminho já está traçado", afirmou Tassan-Viol.

O diplomata diz ainda que "o órgão da ONU para as alterações climáticas não é o Conselho de Segurança da ONU. Portanto, desse ponto de vista, não creio que eles [os delegados] ficarão cegos pela polarização a nível internacional sobre o conflito em Gaza."

Ruth Townend espera que as preocupações com o aquecimento do planeta superem qualquer polarização na COP28. "À medida que os impactos climáticos aumentam, infelizmente, é provável que vejamos desastres, tensões e conflitos crescentes por causa de recursos escassos", sublinhou.

"Os governos e líderes políticos terão de encontrar formas de cooperar e de se comprometerem para enfrentar os riscos climáticos que não podem ser adiados enquanto as crises atuais, por mais trágicas que sejam, são enfrentadas", explicou à DW. 

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