Covid-19: ONG questionam gastos do Governo moçambicano
11 de agosto de 2020Organizações da sociedade civil moçambicana estão a questionar a transparência dos gastos na resposta do Governo à pandemia do novo coronavírus. As críticas surgem na sequência do relatório do Presidente Filipe Nyusi relativo ao estado de emergência, aprovado a semana passada na Assembleia da República.
O Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO) já pediu ao ministério da Saúde informações complementares sobre os recursos investidos na contenção da Covid-19.
O Centro de Integridade Pública (CIP), por sua vez, identificou que foram executados mais de 68 mil milhões de meticais - o equivalente a mais de 822 milhões de euros - em 14 mil contratos sem concurso público, celebrados com empresas durante o estado de emergência - o que é legalmente permito.
No entanto, segundo o pesquisador do CIP, Aldemiro Bande, em entrevista à DW África, a questão é que o relatório enviado pelo Presidente Fililpe Nyusi ao Parlamento foi aprovado sem revelar nomes de empresas contratadas, material adquirido, nem serviços prestados.
Para além disso, "esta modalidade de contratação foi aplicada por todo o setor público durante este período do estado de emergência", critica Bande, apontando que o ajuste direto previsto se aplicava apenas para aquisição de bens e serviços "urgentes e necessários para a prevenção e combate à Covid-19".
Para onde foi o dinheiro?
O setor da Saúde compreende 110 dos 14 mil contratos por ajuste direto, o que corresponde a 3,32 mil milhões de meticais (cerca de 40 milhões de euros). O relatório não especifica do ponto de vista setorial quantos contratos foram realizados noutros setores.
Pela falta de informações sobre os contratos, não há garantias de que os gastos foram ou não feitos no âmbito da resposta à pandemia, analisa Bande, assumindo que "há um grande risco de sobrefaturação recorrendo do ajuste direto".
O investigador do CIP adianta que esta falta de controlo financeiro passa também pela ausência de um orçamento retificativo. "Já deveria, na verdade, ter sido proposto à Assembleia da República para discussão. É de estranhar a forma como foram feitos alguns gastos sem a existência deste instrumento importante para a transparência e para o escrutínio público", critica.
Falta de fiscalização
Aldemiro Bande não se mostra surpreso com a aprovação do relatório do Presidente moçambicano que considera que as medidas tomadas durante a vigência do estado de emergência respeitaram o princípio da proporcionalidade e limitaram-se ao estritamente necessário.
"Muitas vezes isto acontece por causa da fragilização dos mecanismos de controlo e fiscalização das próprias instituições públicas. A Assembleia da República deveria ser o principal órgão que deveria levar adiante a fiscalização desta matéria. Mas infelizmente, embora tenha havido uma reação por parte de algumas formações políticas, já se previa esta tendência por parte da bancada maioritária", analisa.
Numa adenda ao relatório aprovado pela Assembleia da República, o chefe de Estado moçambicano explica que Moçambique já recebeu 340,8 milhões de dólares (289 milhões de euros) dos 700 milhões de dólares (594 milhões de euros) que pediu aos parceiros internacionais para o combate ao novo coronavírus. O estado de emergência em Moçambique continua em vigor até 7 de setembro.