Sociedade civil moçambicana critica estratégias do FMI
22 de junho de 2020O FMO considerou esta segunda-feira (22.06) que não há elementos que garantam que o Executivo moçambicano vai gerir de forma transparente o apoio de 309 milhões de dólares disponibilizado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) face ao défice orçamental provocado pela pandemia da Covid-19, considerando fundamental o envolvimento da sociedade civil na fiscalização.
Numa nota distribuída aos meios de comunicação social, a plataforma que congrega várias organizações da sociedade civil moçambicana considerou também que o FMI apoia programas para "governação económica" em África há quase 40 anos, mas continuam a ser registados sucessivos escândalos de corrupção e outros crimes financeiros, o que mantém o continente no estágio de subdesenvolvimento.
"Algumas ações e decisões do FMI vão na contramão da sua intenção de promoção de boas práticas de governação económica, como aconteceu quando fez vista grossa a atos flagrantes de má governação macroeconómica aquando da polémica sobre a reavaliação da sustentabilidade da dívida pública moçambicana", lê-se na nota da instituição.
Mecanismos de prestação de contas
A plataforma reuniu-se em maio com o FMI para debater mecanismos de prestação de contas do Governo moçambicano na gestão do empréstimo, na sequência de uma carta enviada pela sociedade civil ao organismo internacional, alertando para a necessidade de reforço da transparência na gestão do empréstimo.
Durante o encontro, o FMI esclareceu que o acordo com o Governo moçambicano para o empréstimo inclui a publicação dos grandes contratos públicos, a realização e publicação de auditorias sobre as despesas efetuadas, avançando que o resto do processo fica na responsabilidade do executivo.
Para o FMO, as exigências do FMI não são suficientes, na medida em que a participação da sociedade civil podia "limitar o espaço de ação dos gestores públicos com intenções de desviar fundos do tesouro público para fins alheios à agenda de resgate das economias afetadas pela crise da pandemia".
Empréstimo
O empréstimo do FMI representa cerca de metade do apoio financeiro de 700 milhões de dólares (623 milhões de euros) que Moçambique espera receber de parceiros no âmbito do combate à pandemia provocada pelo novo coronavírus.
O apoio foi pedido pelo Governo aos parceiros, em Maputo, em 23 de março, para cobrir o buraco fiscal provocado pela pandemia no Orçamento do Estado (OE) de 2020, bem como para financiar o combate à doença e dar apoios para os mais pobres.
O apoio do FMI será feito através da linha de crédito rápido (RCF) e 28 milhões de dólares (cerca de 25 milhões de euros) numa linha para alívio e contenção de catástrofes.
Na altura do anúncio, o FMI esclareceu que "os recursos da RCF serão devidos só depois de a produção, exportação e receitas fiscais do gás natural liquefeito arrancarem", o que se prevê para 2022/2023.
O FMI leva em linha de conta as promessas do Governo de publicar auditorias sobre a utilização das verbas e confia nos progressos do Banco de Moçambique em melhorar as capacidades de gestão e auditoria, de acordo com recomendações feitas por uma missão em dezembro de 2019.
Os compromissos contrastam com o passado recente de Moçambique, ensombrado pelas chamadas "dívidas ocultas" do Estado de cerca de dois mil milhões de euros, que levaram o FMI e doadores a cortar a modalidade de apoio direto ao OE em 2016.
Este é o segundo ano consecutivo em que Moçambique recebe apoio da RCF: em 2019, o fundo emprestou ao país 118 milhões de dólares (105 milhões de euros) após os ciclones Idai e Kenneth para apoiar o OE nos esforços humanitários e de reconstrução.