Crise no Senegal terá "impacto direto" na Guiné-Bissau
8 de fevereiro de 2024A nova crise política e social que se instalou no Senegal vai ter "um impacto direto" em vários setores na Guiné-Bissau - principalmente no comércio. É o que teme o sociólogo guineense Tamilton Teixeira ao olhar para a situação tensa no país vizinho da Guiné-Bissau, com protestos em várias regiões desde o anúncio do adiamento das eleições presidenciais, que estavam previstas para este mês.
Em entrevista à DW, o sociólogo alerta que, se a tensão no Senegal se agravar, poderá até haver uma escassez dos produtos básicos na Guiné-Bissau.
DW África: Até que ponto esta crise no Senegal pode refletir-se na Guiné-Bissau?
Tamilton Teixeira (TT): O Senegal é onde boa parte dos comerciantes guineenses, nomeadamente as mulheres empreendedoras, vão procurar os produtos para depois revenderem no mercado guineense. Daí que a situação que se vive no Senegal consegue impactar diretamente a realidade económica na Guiné-Bissau, porque o país não tem uma economia de concorrência, mas de subsistência: os guineenses produzem para sobreviver e não para comercializar. Por isso, o impacto da crise vai ser direto. A Guiné-Bissau depende diretamente do Senegal do ponto de vista económico. Isto pressupõe que as empreendedoras guineenses não poderão ir a Ziguinchor para comprar os produtos mais básicos que se pode imaginar.
DW África: O comércio na Guiné-Bissau também depende do Senegal. Acha que esta crise no país vizinho pode afetar o abastecimento dos produtos da primeira necessidade?
TT: Obviamente. A simples subida de preço de combustível no Senegal afeta diretamente a economia na Guiné-Bissau e neste caso, quando se trata de uma crise que depois pode ter contornos militares, o impacto e efeito podem ser muito maiores.
DW África: Nos últimos tempos tem-se registado denúncias de que a democracia está em risco na Guiné-Bissau e, no ano passado, o Presidente Embaló afirmou que as próximas eleições presidenciais devem ocorrer em 2025, o que seria fora do prazo estabelecido pela lei. No Senegal, Macky Sall também deverá ficar até 2025 na Presidência. É uma coincidência?
TT: Não, é preciso analisar cada caso com os seus elementos concretos. A Guiné-Bissau não é Senegal. A proximidade permite alguma análise do ponto de vista da coexistência política e diplomática, mas o caso guineense é particular. As instituições guineenses são frágeis, no sentido de impedir alguns excessos de interpretação constitucional neste caso, em particular, do próprio Presidente Umaro Sissoco Embaló, que tem tido a sua própria interpretação das leis guineenses.
Na Guiné-Bissau, o Tribunal Constitucional não tem a mesma capacidade de força da lei como acontece no Senegal, onde as instituições têm uma tradição de fazer vincar e valer as leis da República, muito ao contrário da Guiné-Bissau. Nós estamos a falar de um país onde nenhum governo chegou a concluir o seu mandato e as pessoas tomam isto como um dado leve. Mas isto é para dizer ao mundo que há uma incapacidade de respeitar a expressão das urnas.