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Cada vez mais menores trabalham em África

Martina Schwikowski
12 de junho de 2022

Crianças-soldado, mineiros, vendedores ambulantes e trabalhadores de plantações de cacau - após anos de declínio do trabalho infantil, a pandemia de Covid-19 empurrou muitas crianças africanas para o trabalho.

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TABLEAU | Internationaler Tag gegen Kinderarbeit 2021 | Südsudan, Nyamlel
Foto: Stefanie Glinski/AFP/Getty Images

A capital dos Camarões, Yaounde, está repleta de jovens vendedores. A maioria deles são crianças entre os 7 e 14 anos de idade, e podem ser encontrados nos grandes cruzamentos e mercados - muitas vezes trabalhando até altas horas da noite.

Kevin e Lea estão entre os vendedores ambulantes que vendem as suas mercadorias nos bairros populosos de Yaounde durante as férias escolares.

"Vendo água para ajudar os meus pais a pagar os meus livros de exercícios para o novo ano lectivo", disse Kevin, de 8 anos, à DW.

"E eu vendo amendoins para pagar o meu material escolar", acrescentou Lea, de 10 anos.

Chantal Zanga, diretora de uma escola, está preocupada. "Sou contra o comércio de rua que as crianças fazem", disse. "A criança tem direito à proteção. Se as enviarmos para as ruas, quem as protegerá?", questionou.

Mosambik | Provinz Zambezia | Handwerklicher Edelsteinabbau
Foto: Roberto Paquete/DW

Falta proteção às crianças

Segundo a UNICEF, o crescimento populacional, as crises recorrentes, a pobreza extrema e as medidas de proteção social inadequadas fizerem com que, nos últimos quatro anos, mais 17 milhões de meninas e rapazes se tenham envolvido no trabalho infantil na África subsariana.

Os países africanos são o lar da maioria dos 160 milhões de crianças trabalhadoras do mundo.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que mais de 72 milhões de crianças na África subsaariana - quase uma em cada cinco - são afetadas pelo trabalho infantil.

Especialistas estimam que milhões estejam em risco devido à pandemia do coronavírus.

Segundo a UNICEF, isto marca, pela primeira vez em 20 anos, a estagnação do progresso no sentido de acabar com o trabalho infantil.

Foi neste contexto que peritos e ativistas do bem-estar infantil se reuniram para a 5ª Conferência Global sobre a Eliminação do Trabalho Infantil, em Durban, África do Sul, no mês passado, para discutir medidas mais rigorosas para a proteção das crianças.

Crianças mineiras nos Camarões

Perigo nas ruas

As crianças vendedoras de rua enfrentam diariamente vários perigos, entre esses a violência sexual. Juliette Lemana, 12 anos, vende uma frutas em Yaounde.

"Mamã enviou-me para vender", disse ela, a acrescentar que, recentemente, uma motocicleta atropelou a sua colega de classe.

"Por vezes voltamos para casa à noite e não conseguimos encontrar o nosso caminho", disse a jovem à DW.

A lei camaronesa proíbe o trabalho infantil, segundo Pauline Biyong, presidente da Liga para a Educação de Mulheres e Crianças.

"Os Camarões ratificaram muitos artigos para proteger as crianças. Este fenómeno deveria ser marginal, mas infelizmente observamos nas nossas cidades que as crianças são motivadas ao trabalho pelos seus próprios pais, e isso não é normal", disse ela.

As dificuldades económicas obrigaram muitas crianças a labutar nas minas de ouro da Tanzânia e do vizinho Congo.

Kindersoldaten in Afrika
Foto: Stefanie Glinski/AFP/Getty Images

Outras em países como o Sul do Sudão põem em perigo as suas vidas como crianças-soldados.

A Organização Internacional do Trabalho estima que 2,1 milhões de crianças trabalham na produção de cacau na Costa do Marfim e no Gana - cerca de dois terços do cacau produzido em todo o mundo provém de África.

A empresa Nestlé está a tentar polir a sua imagem na produção de cacau, construindo salas de aula para crianças em zonas de cultivo deste fruto. Além disso, o conglomerado suíço estabeleceu uma parceria com a UNESCO para apoiar a alfabetização das mulheres nos mercados.

Apesar de todos estes esforços, as crianças ainda trabalham em algumas plantações de cacau. "O problema do trabalho infantil é real", disse Toussaint Luc N'Guessan, gestor do programa da Nestlé, à DW.

Elfenbeinküste Kinderarbeit in Kakao-Anbau  Burkina Faso arbeiten auf einer Kakaoplantage
Foto: Jürgen Bätz/dpa/picture alliance

Pais que abusam de crianças

Nas ruas de Maiduguri no Estado de Borno, na Nigéria, muitas crianças trabalham a pedido dos seus pais.

"O meu pai trouxe-me aqui para aprender alfaiataria", disse um jovem rapaz à DW. "Por vezes, ganho 150 nairas ($0,36/$0,35)".

Adamu Umar - que tem 15 filhos - admitiu à DW que também faz com que os seus filhos trabalhem como vendedores ambulantes para complementar o rendimento familiar.

Mas o seu compromisso com as suas famílias está a custar-lhes caro, pois as organizações de ajuda queixam-se de que às crianças é negada a escolaridade e educação e, portanto, uma vida melhor.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, 43% das crianças nigerianas entre os 5 e 11 anos de idade são crianças trabalhadoras, embora as convenções internacionais o proíbam.

Mosambik | Kinderarbeit
Foto: Conceição Matende/DW

Penas severas para os pais

Como parte dos "Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas", todos os 193 estados membros se comprometeram a tomar medidas eficazes para eliminar o trabalho forçado, a escravatura moderna, o tráfico humano e as piores formas de trabalho infantil - incluindo as crianças-soldado - até 2025.

Mas os controlos para impedir o emprego de menores são raros, de acordo com a organização dos direitos da criança Plan International.

"É nossa responsabilidade como pais cuidar dos nossos filhos, e não dos nossos filhos cuidar de nós", disse Lucy Yunana, uma ativista dos direitos das crianças na Nigéria.

Yunana apela ao Governo para que reprima a ameaça do trabalho infantil com penas mais severas.

Ela disse que qualquer criança apanhada a vender ou a mendigar deveria ser retirada desta situação, e os pais que permitem que as suas filhas trabalhem como empregadas domésticas responsabilizados, ao ponto de pagarem multas.

Nos Camarões, foi lançado entretanto lançado um vasto programa, chamado "férias úteis". Está localizado em Nkoldongo e tem como objetivo manter as crianças ocupadas.

Mas, com pouco encorajamento, alguns pais preferem aumentar o rendimento da família ao ter os seus filhos a trabalhar.

"As crianças têm de aprender a procurar rendimentos; isso não é mau", disse à DW uma mãe que vende em segurança no mercado de Ekounou.

"Eles não têm nada para fazer durante as férias, e é normal que nos ajudem a nos preparar para o início da escola, pelo menos através da compra de cadernos. [A vida nos] Camarões é difícil".

Ajudar a família em casa é trabalho infantil?