Manuel Chang pode ser extraditado para os EUA ou Moçambique
8 de abril de 2019Numa sessão que teve lugar na manhã desta segunda-feira, o juíz William Schutte, do tribunal de Kempton Park, arredores de Joanesburgo, considerou que "o Estado requerente [EUA] tem provas suficientes contra o acusado que lhe garante processá-lo judicialmente por conspiração para fraude, conspiração para fraude com valores imobiliários, e conspiração para lavagem de dinheiro". O juíz acrescentou ainda que "a África do Sul reconhece os crimes de que é acusado pela justiça norte-americana".
Ministro da Justiça decide
Declarações semelhantes surgiram mais tarde, após um intervalo de cerca de 90 minutos que serviu para o Tribunal analisar a documentação das autoridades moçambicanas, que pediram também que o ex-ministro das Finanças seja extraditado para o seu país de origem. Ou seja, a decisão sobre a extradição de Manuel Chang está agora nas mãos do ministro da justiça da África do Sul.
"Depois de analisado os méritos apresentados é decidido que nos termos da Lei de Extradição, 67 de 1962, existe prova suficiente contra o arguido da prática dos seguintes crimes: abuso de cargo ou funções; violação da legalidade orçamental; burla por defraudação; peculato; corrupção passiva para acto ilícito; lavagem de dinheiro e de associação criminosa", afirmou o juíz William Schutte após a sessão da tarde.
À DW, o General Abel Nunu, adido de segurança do alto Comissariado de Moçambique na África do Sul, destaca: "Vamos agora esperar a decisão do ministro da Justiça, para onde serão remetidos os dois pedidos [de extradição] já julgados aqui. E o melhor é aquilo que o próprio juíz disse: que tanto o pedido de Moçambique, como o da América são procedentes".
Até sair a decisão do governo da África do Sul, Manuel Chang permanece detido na prisão de Modderbee, disse o mesmo juiz. O ex-ministro das Finanças moçambicano tem agora 15 dias para recorrer da decisão.
Caso decida não recorrer, o processo segue para as mãos do ministro da Justiça, não existindo um prazo estipulado para o anúncio da decisão. "O advogado tem a sua missão, nós temos a nossa de defender o nosso cidadão. Depois de decidirem vão-nos anunciar e nós posicionamo-nos", acrescenta Abel Nunu.
"Tribunal fez o seu trabalho", diz CIP
Borges Nhamire, pesquisador do Centro de Integridade Pública (CIP) tem vindo a acompanhar este caso. Em declarações à DW, após o anúncio da decisão, o investigador afirma que "o tribunal fez o seu trabalho e mostrou grande abertura, primeiro para a imprensa estar lá e acompanhar todas as secções,e depois porque mostrou que todas as decisões que foram tomadas foram baseadas em evidências". Borges Nhamire nota ainda que se tratam de "decisões muito técnicas. Não há como dizer que o tribunal favoreceu ou desfavoreceu nenhuma das partes. Diriamos que foi um julgamento transparente e justo em função dos factos e das acusações".
O investigador do CIP diz acreditar que haverão recursos às decisões de hoje. "Agora o caso segue ao nível do ministro e depois ao nível dos tribunais, instâncias superiores em caso de recurso, como acreditamos que haverá".
Ainda durante a audiência da tarde desta segunda-feira (08.04), o juíz Wiliam Schutte referiu que o pedido das autoridades moçambicanas "confirma que o arguido Manuel Chang assinou as garantias que facilitaram os empréstimos para as chamadas empresas criadas para o efeito [da dívida oculta]".
Chang recebeu 17 milhões
O magistrado acrescentou que "o documento confirma que a República de Moçambique sofreu uma perda financeira na ordem de 2,7 mil milhões de dólares" (cerca de 2,4 mil milhões de euros) e que "as provas confirmam que o arguido [Manuel Chang] aparentemente recebeu ostensivamente na ordem de 17 milhões de dólares [mais de 15 milhões de euros] alegadamente de receitas do crime". A acusação dos Estados Unidos refere que Chang terá recebido 12 milhões de dólares.
Para Wiiliam Schutte, "é evidente que o arguido tem condições para ser extraditado com o objetivo de ir a um julgamento criminal, trata-se da pessoa procurada pelo Governo da República de Moçambique". E acrescentou também que o “tribunal é da opinião que os crimes enunciados no pedido [de extradição de Moçambique] têm aplicabilidade na África do Sul", salientou.
"O pedido tem por base a prática de sete crimes e o arguido não se opõe à sua extradição para Moçambique", indicou ainda o juiz.
O deputado da FRELIMO (partido no poder em Moçambique) e antigo ministro das Finanças Manuel Chang encontra-se detido na África do Sul desde 29 de dezembro de 2018 à luz de um mandado internacional emitido pela justiça dos Estados Unidos, que pede a sua extradição, no âmbito da sua investigação às dívidas ocultas em Moçambique.
Chang foi vice-ministro do Plano e Finanças entre 2000 e 2004, no executivo de Joaquim Chissano e ministro das Finanças nos dez anos do Governo de Armando Emílio Guebuza entre 2005 e 2015.
De acordo com a acusação norte-americana, Manuel Chang recebeu alegadamente milhões de dólares em subornos em troca de dívidas secretamente contraídas pelo Estado moçambicano, sem o conhecimento do Parlamento, entre 2013 e 2014, de mais de dois mil milhões de dólares a favor de três empresas públicas (Ematum, Proindicus e MAM) criadas para o efeito em Moçambique.