Ex-comandante rebelde da RCA declara-se inocente no TPI
27 de setembro de 2022A juíza Miatta Maria Samba perguntou a Abdel Kani se compreendia a natureza das acusações. "Ouvi tudo e declaro-me inocente, em todas as situações e de todas as acusações", respondeu o alegado ex-comandante da coligação rebelde Séléka perante o tribunal.
Acusado, em particular, de torturar pessoas detidas durante a agitação civil em 2013 na RCA, Kani enfrenta sete acusações de crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos entre abril e agosto de 2013, em Bangui, contra prisioneiros suspeitos de apoiarem o ex-Presidente François Bozizé.
"Said indicou que se declara inocente de todas as acusações, isso é um direito seu. Mas a lei não deixa espaço para se esconder", declarou o procurador-geral do TPI, Karim Khan.
"As acusações de que estamos a falar são realmente horríveis. A sua voz determinou o destino de tantos indivíduos. Não protegeu as pessoas, mas participou ativamente na sua captura, caçando-as e submetendo-as às condições mais terríveis que pudesse invocar", especificou.
Mahamat Said Abdel Kani foi presente ao TPI em janeiro de 2021 pelas autoridades Bangui, que deram seguimento a um mandado de captura emitido em 2019.
Acusações de tortura e perseguição
O tribunal sediado em Haia confirmou parcialmente as acusações contra Said Abdel Kani no final de 2021, incluindo acusações de tortura, perseguição, tratamento cruel e ultrajes à dignidade pessoal, disse ainda procurador Karim Khan.
"Ele pôs civis num espaço chamado o buraco. Nesse buraco, os civis eram mantidos em condições pútridas, com sujidade à sua volta", afirmou.
Segundo a acusação do TPI, Said Abdel Kani era um comandante sénior da Séléka encarregado de uma esquadra de polícia onde os suspeitos apoiantes de Bozizé foram espancados e torturados depois de detidos.
Por vezes chamado "coronel", "chefe" ou "director", Kani supervisionava as operações quotidianas deste centro de detenção, que pertencia a uma unidade policial chamada Gabinete Central para a Repressão do Banditismo (OCRB)", de acordo procurador-geral do TPI.
Traumas de guerra
"Muitos permanecem traumatizados hoje em dia. Muitos não conseguem mover-se da forma que podiam antes de caírem nas mãos de Said, do grupo Séléka e os seus capangas que estavam a cargo da OCRB. Pelo menos 16 pessoas foram amarradas no método arbatachar", método de tortura que envolve atar os quatro membros de um prisioneiro nas costas para interromper a corrente sanguínea e induzir a paralisia, explicou Karim Khan.
A República Centro-Africana foi palco de uma guerra civil sangrenta em 2013, na sequência de um golpe que derrubou o Presidente François Bozizé.
Os combates colocaram frente-a-frente a coligação de grupos armados que derrubaram Bozizé, a Séléka, predominantemente muçulmana, contra milícias, predominantemente cristãs e animistas, que apoiavam o presidente, denominadas forças anti-Balaka.
A violência provocou milhares de mortos e centenas de milhares de deslocados, de acordo com o TPI.