Ex-combatentes da guerra colonial reivindicam em Lisboa mais direitos
10 de junho de 2014As comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, que tiverem lugar esta terça-feira (10.06) em Lisboa sob iniciativa da sociedade civil, distanciaram-se do ato oficial realizado na cidade nordeste da Guarda.
Na capital portuguesa, junto ao Forte do Bom Sucesso, centenas de antigos combatentes aproveitaram a ocasião para criticar o Governo e reclamar uma reforma digna por terem servido a pátria em África. Os antigos militares do Ultramar continuam a batalhar para resgatar os corpos de muitos companheiros sepultados e abandonados em Angola, Moçambique e na Guiné-Bissau.
Antigos militares no esquecimento
“Em outubro de 2009, uma resolução aprovada por unanimidade na Assembleia da Republica visava conseguir o apoio do Governo angolano para que a Liga dos Combatentes pudesse lá entrar e resgatar os corpos de muitos portugueses que lá ficaram sepultados. Ficou no esquecimento. Esta é uma causa muito nobre que eu levo até às últimas consequências”, garante Luís de Sousa, da Liga dos Combatentes.
Em frente ao monumento erguido em homenagem aos que tombaram na guerra de África, em Belém, Luís de Sousa lamenta que os antigos militares tenham caído no esquecimento e que seja a Liga dos Combatentes a retirar antigos militares das ruas.
“Estão abandonados, sem apoios jurídicos, sem apoios económicos, sem apoios alimentares... Estão votados ao ostracismo total. É preciso fazer algo”, reclama.
Os ex-militares protestam por pensões dignas. António Vilão, que esteve em Angola, garante que não está a pedir nada demais.
“Andou aí o senhor Paulo Portas há uns anos e disse ‘agora é que vocês vão receber alguma coisa’. Quando me reformei recebi duzentos e tal euros, por ano, como militar. Não estou a pedir nada a ninguém, só acho que é um roubo”, critica.
“’Nunca tratei nada disso. O Paulo Portas é que me deu há uns cinco anos 150 euros por ano”, recorda Manuel Oliveira, ex-fuzileiro, que também esteve em África.
O guineense José Monteiro, reformado, pertenceu aos comandos do exército. Está integrado na sociedade portuguesa, mas lamenta a atitude do Estado português, que tem manifestado pouca vontade em reconhecer os direitos de muitos colegas.
“Alguns ainda conseguiram, mas a maior parte não recebeu nada. E o Estado português unica e simplesmente esqueceu essas pessoas. É difícil e há pouca vontade. O que os políticos dizem são palavras muito bonitas, mas depois o cumprimento dessas palavras é muito diferente”, lamenta.
"É tudo muito difícil, porque nós fomos assediados há anos atrás por um dirigente que era ministro da Defesa, nós sabemos bem quem era, e na altura deu-nos uma miséria. Estamos a receber por ano 75 euros. Nós vamos morrer e não vamos conseguir nada”, teme José Carvalho, ex-fuzileiro em Moçambique.
Processos burocráticos e lentos
O moçambicano Joaquim Lúcio, ex-paraquedista que serviu o exército colonial português, tem o seu processo bem encaminhado. No entanto, reclama pela situação de quinze conterrâneos, afetados pela burocracia.
“Vim cá e encontrei-os cá, até porque um de nós já morreu. É a morosidade dos processos. Temos falado com as autoridades… Dizem que estão a fazer tudo por tudo”, diz.
No mês passado, aquando da comemoração dos 40 anos da Associação dos Deficientes das Forças Armadas, ao anunciar medidas para minorar a situação dos ex-militares, o ministro português da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, reconheceu haver processos pendentes que se arrastam há já alguns anos.
Neste 10 de junho, despreocupados com os direitos ou regalias, dois jovens guineenses, João Djaló e Rui Barbosa, cujos pais foram fuzilados depois da independência da Guiné-Bissau por terem servido o exército colonial português, vieram depositar flores na lápide onde constam os nomes dos respetivos parentes. Ambos sentem orgulho dos pais, vieram render-lhes homenagem e conviver com os companheiros portugueses, agora num ambiente de paz.
“A guerra acabou. Não há que criar ódio. Ao povo da Guiné, ao povo português, ao angolano, ao moçambicano, que sejamos unidos!”, pede João Djaló.