1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Filho do Presidente angolano lidera interinamente Fundo Soberano

António Rocha8 de maio de 2013

José Filomeno dos Santos substitui interinamente Armando Manuel, que sai da presidência do Conselho de Administração do Fundo Soberano de Angola para as Finanças. Analista explica como acontecem as remodelações no país.

https://p.dw.com/p/18UW9
O Fundo Soberano de Angola substituiu o Fundo Petrolífero em outubro de 2012
O Fundo Soberano de Angola substituiu o Fundo Petrolífero em outubro de 2012Foto: AP

Apesar de ainda não ter sido indicado o substituto de Armando Manuel, exonerado um dia depois de ter sido nomeado para liderar o Ministério das Finanças, internamente caberá a José Filomeno dos Santos “Zenu”, filho do Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, a liderança deste fundo financeiro. Criado com um investimento de cerca de 3,8 mil milhões de euros de ativos sob gestão, o Fundo Soberano substituiu o Fundo Petrolífero em outubro de 2012.

Na ocasião, a nomeação de José Filomeno dos Santos para o Conselho de Administração do Fundo Soberano provocou duras críticas por parte da oposição política e de membros da sociedade civil angolanos, que denunciaram então mais um caso de nepotismo e riscos de corrupção em Angola.

Como número dois do Fundo Soberano, José Filomeno dos Santos assume interinamente a sua presidência
Como número dois do Fundo Soberano, José Filomeno dos Santos assume interinamente a sua presidênciaFoto: DW/Cascais

A remodelação anunciada na segunda-feira (06.05) ocorre cerca de sete meses após a formação do executivo angolano saído das eleições gerais realizadas em agosto de 2012, tendo atingido ainda o ministro da Construção, Fernando Fonseca, que foi substituído por Waldemar Pires Alexandre.

José Eduardo dos Santos nomeou ainda Manuel da Cruz Neto para o cargo de secretário geral do Presidente da República. Isaac Francisco Maria dos Anjos é o novo governador da província de Benguela e Rui Luís Falcão Pinto de Andrade assume o mesmo cargo na província do Namibe.

Em entrevista à DW África, o economista angolano Fernando Heitor começa por explicar como acontecem as remodelações governamentais em Angola.

DW África: Sete meses depois das últimas eleições gerais, porquê só agora esta remodelação ministerial?

Fernando Heitor (FH): A justificação é simples. É que as remodelações no nosso país infelizmente não são feitas em função do melhor ou pior desempenho dos membros do Governo. As remodelações são feitas por questões meramente subjetivas. O chefe do Executivo, que acumula um poder grande, usa de forma discricionária esta sua competência. Quando recebe informações de A ou de B, ou ele próprio chega à conclusão que determinada pessoa já não deve ficar aí, naquele lugar, ele pura e simplesmente manda-o para outro sítio ou põe-no na reserva.

Infelizmente, não se fazem remodelações aqui de acordo com os padrões a que estão habituados aí na Europa ou noutros países que se pautam por uma governação mais respeitável e mais sã. Nós já estamos habituados a isso, de tal maneira que o povo olha para essas remodelações da forma mais normal possível. E nós, que pertencemos à classe política, à classe empresarial e à classe académica vemos que isso é mais um jogo de cadeiras, “tira aqui, mete ali”. Ninguém diz por que razão fulano de tal foi exonerado.

DW África: Mas o curioso é que o Ministério das Finanças, que é o Ministério chave em Angola, praticamente de dois em dois anos tem um novo titular.

Filho do Presidente angolano lidera interinamente Fundo Soberano

FH: Não se entende. Em qualquer outro país, à saída do ministro das Finanças há uma perturbação no mercado. Porque o ministro das Finanças, que ontem mereceu confiança, e não há nada no ar a dizer que ele fez isto ou aquilo, de repente é retirado para se colocar uma outra pessoa que estava noutro cargo. E sai esse ministro e mete-se outro. E como nós não temos aqui bolsa [de valores], na há situações na bolsa. Mas tudo anda à maneira da família, as chancelarias comportam-se da mesma forma. Enfim, este país é um país sui generis.

Porque os ministros das finanças não são mexidos assim sem mais nem porquê e principalmente sem nenhuma explicação dada ao público. Fica difícil entender como é que essas pessoas que ainda ontem mereciam a confiança do Presidente da República hoje já são mexidas assim. Sem querer personalizar, acho que o Presidente não consegue encontrar mais pessoas que de facto merecem a sua confiança e só trabalha com essas. São essas pessoas que ao longo dos anos, sistematicamente, recorrentemente, são postas aí no seio dos nossos governantes.

Segundo o analista Fernando Heitor, as remodelações em Angola são feitas de forma negativa
Segundo o analista Fernando Heitor, as remodelações em Angola são feitas de forma negativaFoto: DW/R. Krieger

DW África: Mas para substituir Carlos Lopes nas Finanças foi nomeado Armando Manuel, que era o presidente do Conselho de Administração do Fundo Soberano de Angola. Acha que o afastamento desse cargo abre também caminho para a nomeação de outras pessoas para presidente deste fundo, nomeadamente José Filomeno dos Santos, o filho do Presidente José Eduardo dos Santos?

FH: Esse presidente do Fundo Soberano, que é sobrinho do Presidente, está [agora] colocado no Ministério das Finanças. O número dois do Fundo Soberano é o filho do Presidente. Certamente abriu-se caminho para que ele possa ocupar o cargo. E ele neste momento está a ocupar o cargo. Ele era o número dois, o outro foi exonerado e nomeado ministro das Finanças, portanto, em princípio ele está interinamente como presidente do Fundo Soberano, até à confirmação que virá certamente do Presidente da República ou de outra pessoa. De qualquer maneira, o que conta não são tanto as pessoas ou o grau de parentesco. É a forma, a metodologia utilizada para nomear pessoas, sem qualquer justificação pública.

DW África: É uma situação que a oposição e os membros da sociedade civil não cessam de denunciar, mas no entanto não há uma resposta a essas denúncias.

FH: Claro. O nosso papel é denunciar, é dizer que está errado e de tentar, até de forma patriótica, dizer que não é esse o melhor caminho para dignificar as nossas instituições. Quem está no poder não nos ouve e as chancelarias continuam a dar aval a este regime, como sendo um regime estável, um regime bom.

DW África: E toda essa situação tem o beneplácito da própria comunidade internacional…

FH: Pois, quando falo das chancelarias e da comunidade internacional, estou exatamente a referir-me a instituições que veem Angola como sendo um país de grandes oportunidades de investimento. Angola é um modelo em África onde vale a pena investir. No entanto, esquecem-se da componente política, da componente social, que está de facto a degradar-se e é preciso ter um bocado de cuidado.

Mais uma remodelação com o dedo de José Eduardo dos Santos, no poder há 33 anos
Mais uma remodelação com o dedo de José Eduardo dos Santos, no poder há 33 anosFoto: Reuters

DW África: Com esta remodelação do Governo em Angola, as críticas de má governação vão continuar?

FH: As remodelações são feitas desta forma negativa, mas não acontece nada de substancial em termos de transformações positivas para a qualidade de vida das populações. Os problemas de antes continuam latentes e sem soluções significativas.

Saltar a secção Mais sobre este tema