1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

30 milhões de euros anuais para Fundo Soberano é realista?

21 de junho de 2024

Em entrevista à DW, Fátima Mimbiri, do Movimento Civico sobre o Fundo Soberano, diz ser prematuro fazer previsões quando há incertezas sobre projetos de gás no Rovuma. Produção depende da estabilidade em Cabo Delgado.

https://p.dw.com/p/4hLoS
Symbolbild Gefälschtes Geld
Foto: Napoli/Giacomino/ROPI/picture alliance

O Governo moçambicano projeta a transferir cerca de 30 milhões de euros por ano, até 2027, para o Fundo Soberano de Moçambique (FSM). No entender do Movimento Civico sobre o Fundo Soberano, "só pode ser uma previsão baseada nas bastante singelas receitas" de uma pequena parte dos investimentos no setor do gás.

O fundo soberano funciona como um tipo de reserva financeira, que pode servir de apoio ao país durante, por exemplo, uma crise fincaneira. Os recursos do fundo também podem ser usados para financiar projetos e obras que visem melhorar a qualidade de vida da população.

Ainda que o Estado tenha arrecadado 87,4 milhões de euros do setor no primeiro trimestre deste ano, os cálculos do Governo continuam a depender de uma variável: a estabilidade em Cabo Delgado. A província do norte, onde são explorados os recursos, é palco de terrorismo que já paralizou as atividades de uma multinacional.

Nesse sentido, não seria prematuro fazer previsões a contar com algo instável? Em entrevista à DW, Fátima Mimbiri, do Movimento Civico sobre o Fundo Soberano, explica que sim: é prematuro fazer previsões, sobretudo, quando ainda há incertezas quanto aos projetos da bacia do Rovuma.

Fátima Mimbiri, do Movimento Civico sobre o Fundo Soberano
Fátima Mimbiri, do Movimento Civico sobre o Fundo SoberanoFoto: Madalena Sampaio/DW

DW África: Os planos do Governo dependem de uma variável: a estabilidade em Cabo Delgado. Não seria prematuro fazer previsões a contar com algo instável?

Fátima Mimbiri (FM): A começar, é prematuro fazer qualquer previsão agora pelo fato de que os projetos da bacia do Rovuma ainda estão numa fase, digamos, incerta. Os principais, porque neste momento têm um projeto pequeno. E, muito provavelmente, esses dados que estão a ser avançados agora, são baseados num projeto que existe, que é o projeto da FLNG da ENI. Em relação aos demais projetos, a Total ainda tem de terminar a força maior e declarar o reinício das atividades. E tudo isto está dependente, eventualmente, de acordos da situação de estabilidade em Cabo Delgado. E, depois, tem a própriaExxon Mobil, que anda muito indecisa relativamente ao avanço dos projetos. Portanto, esta previsão que está a ser feita só pode ser baseada nas bastante singelas receitas de hão de vir do projeto da FNLG, e não da globalidade dos projetos de petróleo e gás da bacia do Rovuma. E, isso, por razões óbvias de incerteza relativamente ao seu retorno com base a uma situação atualmente vigente de instabilidade.

DW África: Então o Governo está a fazer previsões que não são realistas?

FM: Eu não posso concluir nesses termos, porque se for baseado no projeto só do gás, sim. Agora, o que tem de ser dito de forma clara é até que período é que só teremos as receitas do projeto da FNLGporque neste momento só temos um dado adquirido, que é o projeto da FNLG e não temos os dados relativamente aos outros dois projetos. E depois tem também a questão não resolvida dessa Sasol. Nunca ninguém incluiu ou equacionou a Sasol nessa história toda, e estou a falar dos projetos de gás de Inhambane. É verdade que há um argumento de que o projeto atual de Pande e Temane já está dentro da matriz de receitas que são pagas ao Estado. Mas tem ali um novo plano de desenvolvimento ligado à exploração do petróleo leve, e isto não está a ser abordado de forma transparente, de forma clara. Qual vai ser a contribuição deste projeto e se este projeto é classificado como novo projeto, ou vai ser classificado como projeto já em implementação? Embora este projeto ainda não esteja a gerar receitas para o Estado. Ele vai gerar, depois de ter sido aprovada a Lei do Fundo Soberano.

Moçambique tem as terceiras maiores reservas de gás natural em África, estimadas em 180 milhões de pés cúbicos
Moçambique tem as terceiras maiores reservas de gás natural em África, estimadas em 180 milhões de pés cúbicosFoto: ENI East

DW África: O Fundo Monetário Internacional (FMI) considerou a criação do Fundo como um passo importante para garantir uma gestão transparente e sólida dos recursos naturais. Mas os mecanismos de funcionamento da instituição estão em condições de garantir essa tão propalada transparência?

FM: Nós, de forma muito reiterada, já temos estado a levantar sérias preocupações relativamente a isto, devido ao fato de que o Banco de Moçambique - que vai ser o gestor operacional - não se mostrou ao longo dos anos ser uma instituição transparente, e esse é o primeiro ponto. O segundo ponto é que nós estamos já com a lei, o regulamento aprovado, e até o momento não sabemos como é que o próprio Banco de Moçambique está estruturado e organizado para fazer a gestão do Fundo Soberano. E isso é crítico do ponto de vista de transparência, porque se é uma gestão separada do banco, significa que a esta altura já deveríamos saber qual é a estrutura que está a ser criada e qual é o processo para a seleção dessas pessoas que não são necessariamente funcionários do banco para fazer a gestão do fundo Soberano. Então, começamos a ter desafios de questões de transparência. Há, de início, quando o próprio banco, depois de termos já a lei, o regulamento (portanto, a lei já em vigor) ainda não se pronunciou. Nem publicamente e nem em atos, pelo menos atos públicos, sobre como é que se está a organizar.

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África