Futuro da Guiné-Bissau passa por "reforma profunda" do setor da segurança, defende analista
10 de fevereiro de 2014
O PAIGC, Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde, a maior força política da Guiné-Bissau, tem um novo líder. Com mais de 60% dos votos, Domingos Simões Pereira foi eleito presidente, este domingo (09.02.2014), no oitavo congresso do PAIGC, em Cacheu, norte da Guiné-Bissau.
Ao mesmo tempo, o antigo líder do partido e ex-primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, garante que será candidato à presidência nas eleições gerais, que se prevê que sejam adiadas para 13 de abril.
Sobre o atual panorama político na Guiné-Bissau, a DW África falou com Paulo Gorjão, analista político do Instituto Português de Relações Internacionais e Segurança (IPRIS).
DW África: Como comenta a eleição do novo líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira?
Paulo Gorjão (PG): Finalmente foi encontrado um líder com credenciais do ponto de vista dos parceiros da Guiné-Bissau, acima de qualquer dúvida. Domingos Simões Pereira deixou muita boa impressão junto dos países lusófonos enquanto foi dirigente da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). É claramente uma pessoa bem preparada, com credibilidade. O seu 'calcanhar de Aquiles' é de componente interna, já que esteve fora da Guiné-Bissau durante muito tempo e não será muito conhecido entre alguns setores no país. Mas pertence ao PAIGC e penso que a máquina do partido trabalhará a seu favor. Penso que, ao fim de muitos meses de impasse, o PAIGC encontrou um bom candidato que lhe permitirá não só vencer as eleições como apresentar-se perante a comunidade internacional como um interlocutor credível.
DW África: Ao mesmo tempo, o antigo líder e primeiro-ministro, também do PAIGC, Carlos Gomes Júnior, garante que também se vai candidatar às presidenciais. Como é que se vai resolver a situação desta candidatura de Carlos Gomes Júnior?
PG: Parece-me que, de facto, ele será candidato e, portanto, as Nações Unidas, CPLP e parceiros internacionais têm a responsabilidade e a obrigação de pressionar no sentido de o permitir, porque ele tem toda a legitimidade e direito em concorrer, como é óbvio.
DW África: O novo presidente do PAIGC, Domingos Simões Pereira, disse que defende o regresso de exilados políticos à Guiné-Bissau. Na sua opinião, considera que há condições de segurança para o regresso de Carlos Gomes Júnior para uma candidatura às eleições?
PG: Eu julgo que sim, caso as Nações Unidas, através do seu representante, e a comunidade internacional em geral assumirem uma posição musculada nesse sentido. Nós sabemos que há setores da sociedade guineense que se opõem ao seu regresso e que têm manifestado essa mesma oposição. Sabemos também que a Guiné-Bissau tem um longo historial de resolução de conflitos pela via violenta, portanto há que criar condições para que isso não aconteça.
DW África: José Ramos-Horta terminou funções enquanto representante especial da ONU na Guiné-Bissau no dia 9. Antes disse que o primeiro passo do novo Presidente deveria ser a remodelação das chefias das Forças Armadas. Na sua opinião, como é que será possível haver uma remodelação pacífica das Forças Armadas?
PG: José Ramos-Horta acordou tarde, pelos vistos, para o problema. Esse tem sido desde há décadas o grande problema da Guiné-Bissau, que é precisamente a vinculação das Forças Armadas ao poder civil e ao poder político. Nós sabemos que os ministros da Defesa têm sido meras figuras de grande influência junto das Forças Armadas.
Enquanto não houver uma reforma profunda do setor de segurança, das Forças Armadas, polícia e outros serviços eu não creio que tenhamos qualquer outro tipo de solução substantiva e duradoura. Sem se resolver esse problema, não se resolve o problema do narcotráfico que está intimamente ligado, na minha opinião, a essa vertente. Sem uma resposta integrada e um envolvimento da comunidade internacional de médio e longo prazo, com meios humanos e materiais para tirar a Guiné-Bissau deste ciclo vicioso, tenho uma perspetiva muito pessimista quanto ao futuro da Guiné-Bissau.