Governo cancela reunião em Bissau e frustra médicos em greve
28 de setembro de 2021O boicote de técnicos que tem paralisado o setor da saúde na Guiné-Bissau dura já uma semana e continuará, pelo menos, até o dia 30 deste mês. Júlio Mendonça, secretário-geral da União Nacional dos Trabalhadores da Guiné-Bissau (UNTG), em entrevista à DW África, também garante que o sindicato já deu entrada em um novo pré-aviso de greve, que assumirá nova estratégia.
DW África: O boicote dos técnicos de saúde decorre há uma semana. Qual é o ponto de situação quanto à paralisação?
Júlio Mendoça (J.M.): Continuamos a nossa posição. A greve ainda está de pé até o dia 30 deste mês, apenas nos serviços essenciais da saúde estão a ser garantidos os serviços mínimos . Na semana passada tinha havido uma radicalização tendo em conta o próprio comportamento do Governo, associado às declarações do Presidente da República, que para nós não passam de declarações que não têm enquadramento constitucional, porque o Presidente da República não é chefe do Governo. Mas neste momento já elaboraram um novo plano de adesão de serviços mínimos e está-se a verificar em todo o país.
DW África: Esperavam esta segunda-feira (27.09), um novo encontro com o Governo guineense, mas tal não aconteceu, certo?
J.M.: O Ministro da Função Pública tinha nos contactado de manhã. Disse que de certeza poderiam chamar esta tarde ou mais tardar amanhã de manhã. Estamos a finalizar certos assuntos com o Presidente da comissão do Governo, mas até ao momento eu não tive nenhuma informação,ainda não fomos convocados. Estamos à espera que tragam uma resposta satisfatória porque já havia tido uma calendarização do cumprimento dos pontos a serem tratados. Se não nos convocarem, nós continuamos na nossa posição.
DW África: Quais são as vossas expectativas relativamente a esse encontro?
J.M.: Já tinha havido um pré-acordo, só faltava apenas o primeiro-ministro assinar e ordenar o cumprimento dos pontos acordados. Surpreendentemente ouvimos o Presidente da República a pôr em causa todo o trabalho que já tinhamos conquistado com o executivo. Nesta luta, o importante para nós é a dignificação do povo guineense. Não podemos continuar a ser explorados por essa classe política, a benefício de certo grupo de pessoas enquanto o povo está a morrer de fome.
DW África: Caso não haja entendimento, ponderam prosseguir com a paralisação?
J.M.: Se não houver acordo, continuaremos. Inclusive hoje já demos entrada com novo pré-aviso de greve. Dessa vez já mudamos a estratégia que será de três em três dias por semana. Toda a estrutura sindical já tem conhecimento disso e vamos oganizar e mobilizar os servidores públicos para encararmos essa luta dessa forma.
DW África: Como é que encara a declarações de Umaro Sissoco Embaló que compara o boicote a um "ato de terrorismo”?
J.M.: Acho que na Guiné já habituamos a ouvir declarações desse tipo do Presidente, que não têm enquadramento nenhum. Para nós os principais terroritas são os governadores. Se tivesse havido canalização de recursos financeiros para os centros [de saúde] e hospitais, a fim de criar condições materiais para que os centros funcionem em condições dignas, não teríamos mortes nos hospitais. Independentemente dessas greves, já havia tido mortes. Continua a haver mortes nos hospitais por falta de investimento sério. Temos o nosso foco e vamos continuar com ele. Lutar para conquistar a dignidade do povo guineense. Não há nenhum líder de partido político na Guiné que não tenha furtado o Estado. Todos foram corruptos de cada vez que tiveram a oportunidade de estar no Governo ou a gerir o país. A única coisa que priorizam é a corrupção. Ninguém está interessado em combater a corrupção no país porque sabem que todos são cumplices e sucumbiram as aspirações do povo guineense. Por isso temos a consciência clara. Essa luta é para conquistar a dignidade do povo guineense e o próprio povo também já percebeu. Vamos continuar com a nossa luta e não nos preocupamos com esse discurso.