Heavy Metal ganha força em Angola e Moçambique
28 de novembro de 2013O heavy metal chegou a África com o acesso à eletricidade e à internet. A maioria das bandas de metal foi descoberta através do Facebook. A jornalista Leslie Bornestein, que vive em Nova Iorque, está a produzir o documentário “Terra Pesada” sobre o estilo musical em Moçambique.
Segundo a realizadora, jovens conheceram o metal por familiares que fizeram muitas viagens e os introduziram neste universo. “As crianças mais pobres passaram a ter acesso aos instrumentos musicais quando os miúdos ricos passaram a adquirir instrumentos novos e a vender ou emprestar os velhos a preços mais acessíveis”, relata.
Entre os países lusófonos da África, o heavy metal tem mais força em Moçambique, mas são grandes os desafios. “Não há gravadoras em Moçambique no momento. A única forma de lançar qualquer coisa é através da única guitarrista de heavy metal do país. Ela grava algumas bandas e tem uma conta no Soundcloud. Bandas vão ter com ela e gravam no quarto com o computador", conta Leslie Bornstein.
Essa jovem é Yara Polana. Atualmente a estudar cinema na Islândia, Yara começou por gravar a sua banda – Mona –, mas depois abriu espaço no Soundcloud a grupos de metalcore, deathcore, punk e blackmetal.
“Estou a tentar gravar todas as bandas possíveis para cada uma ter algo com qualidade para mostrar. Há muita dificuldade em gravar: é muito caro e as bandas não têm capital para isso”, diz. Depois da gravação das músicas, o plano de Yara é fazer vídeos, para “mostrar a imagem do rock em Moçambique”.
Metal em Angola
Angola não tem uma cena metal tão sofisticada quanto Moçambique, que está há 20 anos sem guerras. A banda Before Crush, de Benguela, teve a sua estreia internacional no Festival 49 Metal Zone, em Bayreuth, na Alemanha, no final de outubro.
Formados em 2006, os Before Crush começara, como banda de punk e evoluíram para o metalcore. “É uma junção de hardcore com uma vertente melódica”, explica o vocalista Ladino.
As letras dos Before Crush são cantadas em português e inglês. São “gritos de revolta” e expressam as lutas pessoais dos músicos. “Falamos de relações de sofrimento, de superar a nossa batalha em relação às guerras que passamos”.
O single “Celebrar” abre a coletânea do primeiro CD de metal na história de Angola “You Failed... Now We Rule”, produzido pela Cube Records. A banda atravessa atualmente uma fase mediática impulsionada pela participação no documentário “Death Metal Angola” (2012), de Jeremy Xido.
O rock e o acaso
No filme, o cineasta norte-americano conta a trajetória da realização do sonho de Sónia Ferreira e Wilker Flores de organizar o primeiro festival de Death Metal de Angola. O encontro foi inesperado.
Jeremy Xido estava a trabalhar num filme sobre a construção da Benguela Railway. Parou num café no Huambo e começou a conversar com um rapaz.
“Perguntei-lhe o que fazia e ele disse que era músico. Então, perguntei-lhe que tipo de música tocava e ele respondeu: death metal. Eu fiquei completamente chocado. Nunca iria imaginar que alguém naquele lugar tocaria aquele tipo de música”, lembra.
Jeremy Xido foi com dois trabalhadores chineses da Benguela Railway até o orfanato onde o casal vive. Sónia Ferreira – sobrevivente de guerra e amante de rock – cuida das 55 crianças que vivem no local. “Quando nós chegamos, não havia eletricidade. Então, usamos a bateria do carro dos chineses. Wilker e os seus amigos conseguiram tocar. Foi de tirar o fôlego: um aterrorizante e incrível concerto a céu aberto. Esse foi o início da nossa parceria”.
Local e global
No death metal, os temas das canções falam da atual situação de Angola e do passado de guerra. É nítida a influência de ritmos nacionais, como o kuduro, samba e kizomba. “Tem uma componente social nas letras. É um movimento rock que carrega a cultura global e a local. É uma mistura do regional e do internacional”, afirma Jeremy Xido.
Para Ladino, vocalista dos Before Crush, o aumento do interesse pelo heavy metal em África pode ser medido pela adesão aos festivais. “A comunidade é pequena, mas as pessoas ficam muito interessadas em ver algo diferente. Quando organizamos um festival eles ficam para ver porque já sabem que vai ter rock e metal”, diz.
Cerca de 600 pessoas participaram dos dois dias do Rock No Rio Festival, em Catumbela. "Significa que as coisas estão a mudar”, conclui Ladino.