Histórias de Fuga em Cabo Delgado: "Os regressados"
9 de janeiro de 2023As ofensivas militares contra os terroristas no norte de Moçambique, levadas a cabo pelas Forças de Defesa e Segurança, tropas ruandesas e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SAMIM) permitiram o restabelecimento de alguma estabilidade.
Esse cenário tem propiciado o retorno gradual de alguns deslocados internos, que, chegados a casa, recomeçam a vida. Neste sexto e último episódio do Histórias de fuga, da DW, falamos de pessoas que já voltaram a Mocimboa da Praia depois de lá terem fugido devido à insegurança.
Muitos residentes, sobretudo jovens, começam agora a regressar ao distrito de Mocímboa da Praia e a outros pontos de Cabo Delgado. Tentam recuperar os seus negócios, retomar os campos agrícolas, a pesca e outras atividades.
Rachid Abdala é um dos jovens empreendedores que decidiram voltar a casa, depois de momentos de fuga motivados pelo extremismo violento.
"Eu tenho três meses aqui. [A situação de segurança] já está boa e nós estamos a ficar bem. Valeu e estamos a pedir [para o clima de acalmia] ficar assim mesmo", contou Rachid Abdala.
Tal como vários outros naturais e residentes de Mocimboa da Praia que se viram forçados a deixar a região, com a escalada da violência em 2020, o jovem Rachid teve de encontrar acolhimento na residência de parentes no distrito de Montepuez, no extremo sul de Cabo Delgado.
Mas, a vida nunca mais foi a mesma. Conta que passou por várias dificuldades, para alimentar-se e garantir a sua sobrevivência, a da esposa e a dos dois filhos.
Uma nova esperança
Mas Rachid Abdala voltou a ter esperança. Os terroristas que ocupavam o seu distrito foram desmobilizados em operações envolvendo as FDS e os parceiros militares estrangeiros.
"Outras pessoas dizem que em Mocimboa [da Praia] hoje em dia não há vida, mas aqui há vida e nós aqui estamos a ficar bem e contentes", revelou.
Este jovem regressou a casa e não quis mais esperar. Com o dinheiro que conseguiu de biscates que realizava em Montepuez, onde se tinha refugiado, Rachid reabriu a sua banca na sede distrital de Mocimboa da Praia onde vende cosméticos.
"Negócio está a andar muito. Nós estamos a pedir para que as pessoas aumentem mais aqui em Mocimboa da Praia. Temos mercadoria mas ainda não temos muitos clientes, [porque] outras pessoas [ainda] têm muito medo de chegar aqui", disse.
Apesar de considerar o clima estável atualmente, faz um apelo às autoridades.
"Estamos a pedir ao governo para ajudar a nós população para ficarmos bem e não pensarmos muitas coisas, porque até agora há pessoas com dificuldades [receios] na cabeça, por isso tem que tentar todas as maneiras para tirar as dúvidas que temos", clamou.
"A vida está boa"
Fabião Tiago é outra vítima do terrorismo em Mocimboa da Praia. Quando fugiu em 2020, atravessou as fronteiras do Rovuma e refugiou-se na vizinha Tanzânia. Em Março de 2022 voltou ao país mas acantonou-se no distrito de Mueda, onde desenvolvia atividades agrícolas.
Voltou agora à Mocimboa da Praia para verificar o ambiente de segurança. Em entrevista à DW África, Fabião Tiago diz ter gostado do que encontrou na sua terra natal.
"Vinha visitar mas o que estou a ver agora a vida está boa. Daqui a nada tenho de regressar a Mocimboa fazer vida", contou Fabião Tiago.
Fazer, aliás refazer a vida é o que vários deslocados internos desejam quando voltam a casa, onde praticamente tudo foi deitado abaixo pelas ações terroristas.