Incidentes e abstenção marcam referendo na Costa do Marfim
31 de outubro de 2016Grupos de jovens interromperam a votação e vandalizaram assembleias de voto em dois bairros populares de Abidjan, em Gagnoa, a 270 quilómetros a oeste da capital e reduto do ex-Presidente Laurent Gbagbo, assim como noutras localidades.
O ministro do Interior, Hamed Bakayoko, referiu incidentes "em cerca de cem mesas de voto" num total de mais de 20 mil em todo o país, mas garantiu que, no geral, a votação correu "bem".
"Esperamos que com a nova Constituição se resolva toda a confusão que houve em torno da presidência", disse um eleitor de Abidjan, à saída de uma assembleia de voto.
A revisão constitucional prevê a criação do cargo de vice-presidente e de um Senado, com um terço dos seus membros nomeados pelo Presidente. O texto pretende também abolir a chamada cláusula "marfinense", em vigor desde 2000, que estipula que ambos os pais de um candidato presidencial devem ter nascido na Costa do Marfim.
Uma questão de nacionalidade
A questão da identidade nacional contribuiu para a instabilidade na Costa do Marfim, que se viu a braços com um golpe de Estado em 1999, uma guerra civil em 2002 e um período de violência depois das eleições de 2010, quando o ex-Presidente Laurent Gbagbo se recusou a aceitar a derrota eleitoral e a deixar o poder.
A questão da nacionalidade foi levantada na altura como um obstáculo à candidatura do atual chefe de Estado, Alassane Ouattara, nascido na Costa do Marfim e filho de pai do Burkina Faso.
"É um virar de página da crise que surgiu da Constituição de 2000 e é essencial para o futuro do nosso país", declarou este domingo (30.10) o Presidente, que agradeceu ainda aos cidadãos que foram às urnas e reiterou que a Constituição "é em prol da proteção e prosperidade de todos os costa-marfinenses, sem exceção, mas principalmente para a consolidação dos direitos políticos".
Texto "monárquico e retrógado"
A oposição apelou ao boicote do referendo, acusando as autoridades de não consultarem nem a oposição nem a sociedade civil e de quererem passar o projeto "às escondidas" com uma campanha de sete dias e uma fraca difusão do texto que consideram "monárquico e retrógrado". Críticos acusam Ouattara de criar o cargo de vice-presidente para preparar a sucessão depois de terminar o mandato, em 2020.
Uma pequena fatia dos pouco mais de seis milhões de eleitores compareceu nas urnas. Duas coligações da oposição dizem que a participação ficou entre os 3% e os 7%.
"Não houve muito entusiasmo por parte da população porque não houve uma boa comunicação sobre a proposta do novo texto constitucional, que não foi bem compreendido nem pela população nem pelos líderes de opinião, que normalmente dão indicações sobre o sentido de voto", afirma o observador eleitoral costa-marfinense Paul Caves.
Os resultados do referendo constitucional devem ser conhecidos até esta terça-feira (01.11).