Irregularidades: sociedade civil confirma, CNE investiga e FRELIMO desvaloriza
24 de outubro de 2014A Lei Eleitoral moçambicana determina que as comissões distritais têm 72 horas, após o fim da votação, para divulgar os resultados. Mas até aqui, oito dias depois da votação, há distritos que ainda não divulgaram os mesmos.
Borges Nhamire, pesquisador do Centro de Integridade Pública (ClP), participou ativamente na monitorização do processo eleitoral. Que explicação dá ele para as muitas irregularidades e atrasos vereficados no apuramento dos resultados, um pouco por todo o pais?
"Eu penso que não existe uma explicação plausível para que os atrasos que estejam a acontecer aconteçam, porque as eleições foram marcadas há muito tempo e todas as questões logísticas e processuais, que hoje estão a ser enfrentadas, já eram do conhecimento das entidades organizadoras – a Comissão Nacional de Eleições [CNE] e o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral [STAE]," avalia.
O pesquisador acrescenta que tanto STAE quanto CNE "tiveram o orçamento muito elevado, muito acima daquilo que era o orçamento previsto, para organizar as eleições."
Na opinião de Nhamire, tudo indica que os trasos podem "ser uma coisa um pouco propositada. Então, isso não é uma questão de dificuldade ou de desconhecimento, mas é falta de vontade para cumprir com a lei."
Falsificação dos resultados?
Segundo afirmam várias fontes independentes, inclusive o sítio na internet CanalMoz, o que está a acontecer em Moçambique é que as comissões distritais estão envolvidas numa "mega-operação de falsificação de editais."
A plenária da CNE terá, por isso, deliberado mandar vogais às províncias para perceber a razão da não divulgação de resultados e para se inteirar dos relatos de fraude que se espalham por todo o país.
O que Borges Nhamire e os seus colaboradores conseguiram apurar no terreno, confirma a teoria da fraude?
O investigador do CIP considera que "onde não se publica o edital, quem quer contestar não tem como contestar. E, pronto, passam os prazos e a contestação."
"Não publicar o edital ao nível distrital é um caminho andado para que não se possam contestar as eleições," diz Borges Nhamire.
Participação acima do normal
Nos media não estatais, em Moçambique, continua a falar-se de vários casos de taxas de participação muito elevadas. Ora, esses casos dão indicações de enchimento de urnas.
"O que acontece é que isso se verifica naqueles distritos onde os partidos da oposição não conseguiram ter delegados de candidaturas, não conseguiram também os observadores internacionais e nacionais chegar a esses locais. É lá onde 98% das pessoas participam," explica.
Exemplos não faltam, diz o investigador. "Temos casos de distritos como Chicualacuala [na província de Gaza], onde a participação é de 98%. Logo, esses números, quando temos em consideração a média de participação nacional que é de [cerca de] 50%, não faz sentido. Alguma coisa está errada," questiona.
Estima-se que houve enchimento significativo em mais de 5% das urnas nas assembleias de voto, o que provavelmente aumentou o número de votos para o candidato da FRELIMO, Filipe Nyusi, em mais de 100 mil.
Missão cumprida para a FRELIMO
Entretanto, ontem (23.10) em Maputo, a FRELIMO voltou a dizer, em conferência de imprensa, que os resultados das eleições refletem a vontade do povo e devem ser respeitados.
A chefe da Brigada Central da FRELIMO em Maputo e também membro da Comissão Política da FRELIMO, Conceita Xavier Sortane, declarou "missão cumprida", após a vitória do seu partido nas eleições gerais moçambicanas, embora a descida dos resultados mereça reflexão.
"Cumprida, porque chegamos aos resultados que nós tínhamos logo de antemão pronunciado, em devido tempo, quando dissemos que íamos para uma batalha dura, em que a FRELIMO e o seu candidato, Filipe Jacinto Nyusi, sairiam vitoriosos. E hoje dissemos que sim, Filipe Nyusi assim como a FRELIMO saíram vitoriosos," afirmou, em conferência de imprensa em Maputo, Conceita Sortane.
Declarando-se "confortável com os resultados" e elogiando "o processo pacífico e ordeiro" no círculo da cidade de Maputo, Conceita Sortane reconheceu que a expressão eleitoral da FRELIMO baixou em relação ao que aconteceu há cinco anos.
Todas as projeções baseadas nos escrutínios distritais e provinciais apontam para um vitória da FRELIMO e de seu candidato à presidência, Filipe Nyusi, ambos perto dos 60%.
A dirigente da FRELIMO referiu-se também aos partidos de oposição - que se queixam de uma grande quantidade de irregularidades e ameaçam não reconhecer o processo eleitoral -sugerindo que "trabalhem mais".