Israel-Líbano: O que podem fazer os líderes árabes?
30 de setembro de 2024Israel continua a atingir dezenas de alvos no Líbano. Esta manhã, um suposto ataque aéreo israelita destruiu um edifício residencial no centro de Beirute. O ataque aconteceu depois de Israel ter atingido alvos em todo o país, provocando a morte de dezenas de pessoas.
Na semana passada, Israel atacou diversos pontos nos subúrbios do sul de Beirute onde o Hezbollah tem uma forte presença - incluindo um grande ataque na sexta-feira que matou Hassan Nasrallah, o homem que encabeçava o Hezbollah. No sábado, a organização terrorista confirmou a morte do líder.
Entretanto, Fatah Sharif, responsável do movimento islamista palestiniano Hamas no Líbano também morreu durante um bombardeamento israelita.
Cerca de 100 mil cidadãos libaneses e sírios deixaram o Líbano em direção à Síria desde o agravamento da situação militar entre Israel e o Hezbollah, anunciou hoje a Agência da ONU para os Refugiados.
Vários líderes do Médio Oriente vieram a público protestar contra o preço pago pelos civis libaneses, bem como contra o número crescente de mortos em Gaza, em resultado da campanha militar israelita que dura há quase um ano.
"Os ataques de 7 de outubro do ano passado contra civis israelitas foram condenados por países de todo o mundo, incluindo a Jordânia", afirmou o rei Abdullah II da Jordânia na Assembleia Geral das Nações Unidas, na semana passada. "Mas a escala sem precedentes do terror desencadeado em Gaza desde esse dia não tem qualquer justificação".
Na mesma reunião em Nova Iorque, o líder do Qatar, Tamim bin Hamad Al Thani, também falou em "genocídio" contra os palestinianos em Gaza. "Com tudo o que aconteceu e continua a acontecer, já não é possível falar do direito de Israel a defender-se neste contexto sem ser cúmplice na justificação do crime", afirmou.
Mais tarde, uma declaração conjunta emitida por Egito, Jordânia e Iraque avisou que "Israel está a conduzir toda a região para uma guerra total".
Sem influência
Mas será que os líderes árabes vão fazer mais do que apenas falar sobre o que Israel está a fazer?
Por exemplo, no início da década de 1970, os Estados árabes produtores de petróleo impuseram um embargo petrolífero aos Estados Unidos e a outros países para os castigar pelo seu apoio a Israel. Em 1973, a Síria e o Egito atacaram Israel, numa tentativa de reconquistar território que o país tinha ocupado após os combates israelo-árabes de 1967.
Atualmente, tais medidas seriam extremamente improváveis e, segundo Adel Abdel Ghafar, diretor do programa de política externa e segurança do Conselho do Médio Oriente para os Assuntos Globais, com sede no Qatar, a influência dos líderes árabes sobre Israel é limitada.
"Eles atingiram os limites do que podem fazer. Por isso, tentaram trabalhar a nível multilateral através da ONU e de outras instituições. Também tentaram fazê-lo através da Liga Árabe, através de várias condenações e fortes declarações, discursos, como o do Rei Abdullah na ONU", relata.
"Mas, na verdade, nada disto vai mudar o cálculo de Israel, porque continua não apenas com a guerra em Gaza, mas também a querer alargar a guerra ao Hezbollah", avalia.
O Qatar e o Egito têm estado fortemente envolvidos, juntamente com os Estados Unidos, nas negociações entre o Hamas e os representantes israelitas, tentando chegar a um cessar-fogo e a um acordo sobre os reféns em Gaza.
O braço armado do grupo Hezbollah, sediado no Líbano, tem afirmado repetidamente que deixará de disparar rockets contra Israel - ou, pelo menos, regressará ao anterior estado de calma comparativa na fronteira israelo-libanesa, quando ambas as partes trocavam ataques menos nocivos - se Israel parar a sua campanha militar em Gaza.
Mas, como observam analistas militares, Israel, sob o comando do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e do governo mais à direita da história do país, está a praticar uma tática de atacar os seus inimigos primeiro e com mais força e ditar o ritmo e a intensidade de qualquer conflito.
Quanto ao Hezbollah, o Irão é provavelmente o único país que poderia persuadir o grupo a parar de lutar, porque Teerão apoia o Hezbollah financeira e militarmente. No entanto, é pouco provável que o Irão o faça, porque considera Israel um inimigo.
Além disso, a maioria dos países árabes não tem grande influência sobre o Irão.
O que farão os líderes árabes?
Para Khaled Elgindy, membro sénior do Instituto do Médio Oriente, com sede em Washington, "as respostas dos Estados árabes ao que está a acontecer em Gaza - e agora no Líbano - têm sido ditadas inteiramente pela sua relação com os EUA e não pela sua relação com Israel."
"Penso que os líderes árabes, em especial os mais diretamente afetados, como o Egito e a Jordânia, estão definitivamente a tentar pressionar a única parte que pode resolver esta questão, que são os Estados Unidos," afirma.
É claro que há formas de os líderes árabes aumentarem a pressão sobre Israel, sugere o especialista. Alguns têm acordos de paz, acordos comerciais e acordos energéticos com Israel. "E podem reduzir esses acordos ou outras formas de cooperação bilateral. Ou, por exemplo, poderiam juntar-se ao processo de genocídio no TIJ [Tribunal Internacional de Justiça]," acrescenta.
Em maio, o Egito disse que se juntaria ao processo que a África do Sul apresentou contra Israel no TIJ em dezembro de 2023, no qual afirma que Israel está a violar as convenções internacionais sobre genocídio. O Egito ainda não aderiu oficialmente ao processo. Os únicos países do Médio Oriente que aderiram até agora foram a Líbia, a Turquia e a Palestina, que o tribunal reconhece como um Estado.
Algumas nações - incluindo Marrocos e os Emirados Árabes Unidos - argumentaram anteriormente que o estabelecimento de melhores relações com Israel através dos chamados Acordos de Abraão lhes permitiria ter mais influência sobre Israel, disse Elgindy à DW. Mas isso não está a acontecer.
"Por isso, estão a olhar para a questão através da via bilateral com os Estados Unidos e não através da sua relação bilateral com Israel," explica. "E é isso que impede países como o Egito de fazerem coisas que, na minha opinião, seriam significativas, como suspender os laços comerciais."
"É isso que todos estão relutantes em fazer: pagar qualquer tipo de custo político, económico ou diplomático em nome dos palestinianos, e agora dos libaneses", argumenta.
É também importante compreender que muitos dos Estados do Golfo consideram o Irão mais inimigo do que Israel, disse à DW Firas Maksad, membro sénior do Instituto do Médio Oriente.
"Durante muitas visitas à região, [nos Estados do Golfo] as pessoas dizem-nos: 'Nunca fomos atacados por Israel", afirma Maksad. "Mas têm sido atacados - direta e indiretamente - com drones e foguetes fabricados no Irão."
Mais ajuda, mais reuniões
É claro que há alguns cenários potenciais que poderiam levar os líderes árabes a reagir mais fortemente. Por exemplo, o que o Egito e a Jordânia - ambos vizinhos de Israel e dos Territórios Palestinianos Ocupados - mais temem é que Israel pressione os palestinianos deslocados para os seus países.
Por enquanto, mesmo quando a retórica aquece, as reações dos líderes árabes à situação no Líbano têm-se limitado a apelos à ajuda humanitária, à abertura das fronteiras aos libaneses deslocados e a reuniões de emergência. Adel Abdel Ghafar, do Conselho do Médio Oriente insiste que esta guerra está em outras mãos.
"Em influência, os primeiros e mais importantes são os EUA, porque os EUA são o país que tem dado mais cobertura diplomática, apoio em termos de armas, apoio financeiro e apoio diplomático à guerra atual - e historicamente, claro. Por isso, se há alguém que pode acabar com a guerra neste momento, são os EUA", defende.
"Em segundo lugar vêm países como a Alemanha e outros que dão cobertura diplomática e armas a Israel", conclui.