Jurista critica "chantagem" de Sissoco Embaló
21 de outubro de 2021O ano legislativo começa a 4 de novembro na Guiné-Bissau, mas a Assembleia Nacional Popular não prevê debater a proposta da revisão constitucional do Presidente Umaro Sissoco Embaló. Em vez disso, deverá debater a proposta para uma nova Constituição elaborada por uma comissão criada pelo próprio Parlamento.
A decisão não agradou a Sissoco Embaló, que admitiu dissolver a Assembleia Nacional "num segundo".
"A Assembleia tem os dias contados. Posso dissolver o Parlamento hoje, amanhã, no próximo mês ou no próximo ano. A dissolução do Parlamento está na minha mão. A verdade é que me estão a dar motivos para que possa dissolver o Parlamento", referiu o chefe de Estado na quarta-feira (20.10).
"O Parlamento deve saber que o Presidente Umaro Sissoco Embaló não é qualquer um".
Na sexta-feira (22.10), Sissoco Embaló deverá receber em Bissau uma missão de constitucionalistas da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), que apoia o processo de revisão da Constituição guineense.
Em entrevista à DW África, o advogado guineense Fodé Mané refere que o Presidente da República deveria ter pesado melhor as suas palavras. O Parlamento não pode ser dissolvido de ânimo leve, lembra o jurista. Além disso, a dissolução poderá não resolver os problemas de Sissoco Embaló.
DW África: Que enquadramento faz das declarações de Umaro Sissoco Embaló?
Fodé Mané (FM): É sempre uma estratégia de tentar dissolver o Parlamento, porque tem dificuldade de coabitar com um órgão que tem uma opinião ou poderes totalmente diferentes. Portanto, confirma-se cada vez mais a sua vocação de tentar ser o único senhor detentor de todos os poderes. Porque tudo o que o Parlamento faz - ao agendar a sua própria reunião - está dentro das suas competências. Está dentro das atribuições de um Parlamento normal.
DW África: Mas Sissoco Embaló sublinha que a decisão "está nas suas mãos", que pode dissolver o Parlamento quando quiser.
FM: Pode fazê-lo [se tiver] um entendimento muito "personalista" das circunstâncias. A lei diz que [só] em situações de graves crises é que se pode dissolver o Parlamento, quando o Governo não tem o suporte do Parlamento ou as leis não são aprovadas. Mas a consequência da dissolução é a convocação de eleições antecipadas.
Em termos legais, isso não permite ao Presidente formar um Governo de iniciativa presidencial. É o Governo em gestão que prepara as eleições. Por isso, se [o Presidente] der certos passos, navegará em águas em que não conhece a sua profundidade.
DW África: Acha que o Presidente da República está a chantagear os partidos com representação parlamentar?
FM: A sensação que tenho é que está apenas a chantagear, porque já sabe que, sem o atual Governo, enfrentará dificuldades. E este Governo já não tem apoio. Mesmo no ano passado, vimos coisas um pouco cómicas: ministros foram exonerados num domingo, foram votar o Orçamento na segunda-feira e voltaram a ser nomeados na terça-feira. Agora, com os últimos acontecimentos, principalmente deste ano, dentro do PRS e do próprio MADEM, e ainda com a forma como se fez a remodelação governamental, sabemos que nada foi consolidado. O que se reforçou é a ideia de que há cada vez mais descontentes e mais divisão, sendo cada vez mais difícil para o Governo ter apoio parlamentar.