Kalaf Epalanga firme na luta contra o racismo
28 de setembro de 2017Por isso as questões de raça também são abordadas na escrita de Kalaf Epalanga, como é o caso da sua primeira obra intitulada "Histórias de Amor para meninos de Cor". A DW África conversou com Kalaf Epalanga sobre o racismo, tomando como ponto de partida uma obra sua.
DW África: "Histórias de Amor para meninos de Cor" é o título do seu primeiro livro. Porque este título?
Kalaf Epalanga (KE): Quando cheguei a Portugal em 1995, uma das coisas que me atraiu em Lisboa foi o facto de ter encontrado uma geração de meninos, pessoas da minha idade a discutirem o tema raça, cor. E eu achei muita graça aquelas discussões, porque eu vinha de um país africano onde há uma relação com o termo negro bastante presente e não há discussão sobre isso. Mas estar em Portugal foi quase retroceder um pouquinho na discussão sobre raça e racismo. E uma das coisas que senti, é que as pessoas ficavam um pouco desconfortáveis com o termo negro e depois. E outras pessoas preferiam adotar o termo preto e outras desconfortáveis com o termo preto preferiam o termo negro, havia sempre essa discussão. Então, tirei as respostas desses temas para discussão e convidei as pessoas a refletirem para além da questão prática e a olharem para um pouco mais a fundo sobre o porque desses termos. Somos negros perante a quem? O que nos define?
DW África: Achas que está subjacente a este termo "pessoa de cor" algum paternalismo?
KE: Não, esse termo já não se usa. Acho que as que usam são obviamente de uma certa geração.
DW África: Nos EUA ainda há gente que usa esse termo...
KE: Sim, mas os EUA ainda se confrontam com essa questão do racismo de forma um pouco mais violenta. E é importante não traduzir a letra esses termos. Se for para pegar alguma preferência eu sem dúvida que apontava para o negro, é o termo que me deixa mais confortável. Mas se alguém preferir preto ou pessoa de cor, que Deus o abençoe.
DW África: A luta contra a discriminação racial cresceu no mundo e em Portugal assiste-se a uma série de movimentos nesse sentido e também de promoção da auto-estima. Acha que esses movimentos são proporcionais ao nível de discriminação ou já se está num nível de auto-vitimização? Há um exagero ou não?
KE: Não acho que seja exagerado porque durante muito tempo houve um vazio. Acho que criar auto-estima e valorização é importante, é importante as pessoas gostarem de si próprias como são, sem se subjugarem a vontade e aos padrões impostos pela sociedade ou pelo outro. O facto de vivermos numa sociedade não significa ou não anula a vontade de termos movimentos pacíficos e movimentos que nos relembrem constantemente o quão frágil é a paz que nós usufruímos. Mas acho que até devia haver mais ainda porque o racismo cresce no escuro, na ignorância. Então, quanto mais luz houver melhor. Por exemplo, estamos a ver os movimentos de direita a crescerem na Europa, vais me dizer que há menos movimentos a alertarem? Talvez. Se calhar porque há menos movimento a alertarem e a relembrarem as pessoas de que não podemos dormir a sombra da bananeira quando há pessoas, há vontades e energias negativas a alinharem-se e a organizarem.
DW África: E não haverá o risco de se promover uma espécie de racismo defensivo?
KE: Não podemos baixar a guarda, devemos combater violentamente qualquer reação racista, machista e homofóbica. E o racismo não é só por discriminação de cor ou de origem, também se assiste a isso quando se trata de oportunidade, por exemplo, ou na questão da representatividade. Olhamos para uma sociedade diversa como a portuguesa, o facto de não termos diversidade suficiente em áreas como educação, cultura, política e economia é um problema.