Liberdade de imprensa e expressão regrediu em Moçambique
2 de maio de 2018O Instituto para a Comunicação Social da África Austral (MISA) e jornalistas moçambicanos não têm dúvidas: a liberdade de imprensa e expressão regrediu no país.
O diretor executivo do MISA-Moçambique, Ernesto Nhanale, contabiliza 21 casos de violação da liberdade de imprensa no ano passado, destacando ameaças, agressões e processos-crime.
Entre 2016 e 2017, os casos de ameaça aos profissionais de comunicação social subiram 80%. Para Nhanale, este aumento tem a ver com o contexto político do país.
"Sobretudo, a questão do conflito militar que tem vindo a agudizar-se e não só. Assistimos a outro tipo de ameaças como o uso de processos contra jornalistas para tentar silenciá-los e, ultimamente, também assistimos a agressões físicas", explica.
Respeito pelo trabalho dos jornalistas
Segundo o MISA-Moçambique, os políticos são os que mais ameaçam os jornalistas. Por isso, Ernesto Nhanale faz-lhes um pedido.
"Não pode haver atividade política sem haver liberdade de expressão. Devem respeitar o trabalho dos jornalistas - a liberdade de imprensa, como uma extensão do seu trabalho. Portanto, tem de se respeitar o trabalho dos jornalistas."
Também jornalistas de diferentes órgãos contactados pela DW África lamentam o facto de a liberdade de imprensa e de expressão em Moçambique estar a regredir.
O repórter Argunaldo Nhampossa, do semanário Savana, afirma que o país estava no bom caminho, mas, de repente, regrediu.
"Acompanhámos no ano passado os jornalistas do Magazine Independente [publicação semanal em Maputo] que foram torturados e viram confiscados os seus meios de trabalho. Alguns jornalistas que gravam as entrevistas com o Presidente da República são ameaçados porque não podem gravar com telemóveis."
Falta de contactos entre Presidente e jornalistas
Nhampossa lamenta que o Presidente da República, Filipe Nyusi, não tenha mais contacto com os jornalistas. No dia 18 de abril, Nyusi não quis receber um grupo de jornalistas que pretendia falar dos problemas da classe. "Desde que tomou posse, não me recordo de o Presidente ter falado numa espécie de uma conferência de imprensa, a menos que sejam visitas presidenciais em que, no fim, faz um balanço especificamente sobre o evento."
O rapto e agressão, a 27 de março, do jornalista e comentadorEricino de Salemae a agressão, a 18 de abril, do repórter de imagem da televisão privada STV Hélder Matwassa são os destaques deste ano para o jornalista Ilódio Bata, do MediaFax.
"É um rude golpe à liberdade de expressão e quiçá de imprensa porque estamos a falar de um jurista, ativista social e jornalista que não fez mais nada do que emitir a sua opinião sobre aspetos que marcam a realidade do país e não só".
Sociedade civil deve reagir
A violação da liberdade de imprensa não pára por aqui. Em Nampula, durante as autárquicas, a Rádio Encontro sofreu uma interferência na sua frequência quando noticiava sobre as eleições.Joaquim Manhiça, da estação radiofónica KFM, lamenta a falta de reação da sociedade civil, que se limita a emitir comunicados para repudiar este e outros casos. "Eles precisam fazer muito mais do que palavras, discursos e comunicados. Temos um problema no país. A sociedade civil manifesta-se sempre quando surge uma situação."
Para o Centro de Integridade Pública (CIP), Moçambique estava a registar avanços desde 1990, mas, agora, isso mudou, diz Jorge Matineda, membro desta organização não-governamental.
"Os espaços começam a fechar-se. Isto pode ser um sinal de que dentro da cultura democrática, das instituições que deviam promover a democracia, não está a acontecer essa mudança que se pretende."