As palavras do ano em Angola e Moçambique
30 de dezembro de 2016"Liberdade" é uma das candidatas a palavra do ano.
Em Angola, por exemplo, 2016 foi o ano em que a organização de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional pediu um julgamento justo para Rafael Marques, depois de o jornalista ter recorrido da sua condenação por denúncia caluniosa após publicar o livro "Diamantes de Sangue". Dentro e fora do país, opositores continuaram a pedir "#LiberdadeJa" para os 15+2 ativistas acusados de preparar um golpe de Estado. E um deles, Luaty Beirão, disse que em Angola "ninguém está em liberdade", mesmo depois de ser libertado, em junho. 2016 foi também o ano em que o rapper publicou o livro "Sou eu mais livre, então - Diário de um preso político angolano".
"Liberdade" é uma das dez finalistas no concurso "palavra do ano em 2016", não só em Angola como também em Moçambique. É a primeira vez que o concurso, organizado pelo grupo Porto Editora, se realiza nos dois países. A escolha das palavras finalistas em cada país baseia-se em estudos sobre a distribuição e frequência das mesmas, por exemplo, nos meios de comunicação e nas redes sociais. Até 31 de dezembro, os internautas angolanos e mocambicanos podem votar na palavra que consideram ser a mais importante do ano. As palavras vencedoras deverão ser conhecidas em janeiro.
Crise
A palavra "crise", também foi uma das palavras mais ouvidas em Angola, devido à queda do preço do petróleo e à falta de divisas. Foi ainda uma das palavras que mais se usou em Moçambique para falar sobre o desequilíbrio das contas públicas e a desconfiança dos doadores internacionais, sobre bancos em falência e sobre o aumento dos preços dos produtos básicos.
"Se eu disser 'crise', qual será a primeira palavra que vem à sua cabeça? É como se a palavra 'crise' facilitasse o acesso que você tem ao adjetivo 'financeira', em muitos casos. Como estamos falando da palavra do ano, o priming lexical pode ser mais interessante e diz respeito justamente a como uma palavra facilita o acesso à outra palavra em nosso léxico mental", explica o linguista e professor de português na Universidade de Hamburgo, Júlio Matias.
Em Moçambique, não se falou apenas de crise económica e financeira; falou-se também de crise político-militar.
Diálogo
O "diálogo" foi, por isso, uma palavra importante no país.
Durante 2016, os avanços e recuos no "diálogo" entre o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e o maior partido da oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), dominaram a agenda política. Mas a cessação efetiva dos confrontos tarda a chegar. E moçambicanos de diversas organizações da sociedade civil saíram às ruas a pedir paz.
"Temos um país onde temos divídas públicas escondidas; temos casos de perseguições a associações de direitos humanos", disse Bayano Valy, da rede HOPEM - Homens pela Mudança, por ocasião de um protesto em junho de 2016.
"Paz" é, aliás, outra das candidatas a palavra do ano em Moçambique.
As palavras, a História e a cultura
As palavras resultam da cultura em que estão imersas em cada país e podem mudar de sentido, conforme os contextos sociais e históricos, segundo o antropólogo cultural Luis Felipe Hirano.
"Um bom exemplo de como as palavras mudam contextualmente é a palavra 'cultura'. A palavra teve, inicialmente, o sentido de cultivar e, depois, no século XVI e XVII, ganha o sentido figurativo de 'cultivar a própria pessoa', de 'cultivar o conhecimento'. Quem tem cultura é aquela pessoa que estuda, que tem acesso a leitura", explicou Hirano à DW.
A "educação" também é uma palavra que os internautas poderão escolher em Moçambique. Outras palavras finalistas neste país são "mamparra", "solidariedade", "tchilar", "txunar" e "dívida".
Em Angola, as palavras finalistas são "candando", "crise", "diversificação", "kamba", "kandengue", "kínguila", "kixiquila", "paz”, "liberdade" e "esperança".
Em Angola e Moçambique, os internautas podem votar, respetivamente, nas páginas www.palavradoano.co.ao e www.palavradoano.co.mz.
Com as palavras fazem-se discursos, política e História. Espera-se, por isso, que 2017 seja um ano cheio de palavras cada vez melhores.