Libéria: Primeira Presidente eleita em África passa a pasta
21 de janeiro de 2018Depois de tomar as rédeas de um país que acabava de sair de uma guerra civil que matou cerca de 250 mil pessoas, Ellen Johnson Sirleaf será lembrada por manter a paz e conseguir doações em massa para reconstruir a Libéria do zero, em 12 anos no poder.
"Éramos uma nação devastada por três décadas de conflito. Estávamos a começar do zero, com a destruição completa das infra-estruturas nacionais, uma economia em colapso e um Estado incapaz de servir o seu povo”, lembrou Sirleaf no seu último discurso à nação, na quarta-feira (18.01).
Esta segunda-feira, a Presidente liberiana passa o poder para as mãos do antigo futebolista internacional George Weah, representando a primeira transição democrática no país desde 1944.
Marcas na política e economia
Sirleaf, de 79 anos, liderou o país durante a crise do ébola, entre 2014 e 2016, que matou mais de 4 mil liberianos, e lutou para contrariar os efeitos da queda dos preços das matérias-primas, numa nação altamente dependente das exportações de minério de ferro e borracha.
A Presidente cessante também mediou crises na África Ocidental, nomeadamente na Gâmbia, entre 2016 e 2017, quando o Presidente Yahya Jammeh recusou ceder o poder após perder as eleições.
No último discurso, Sirleaf destacou que a Libéria "reflecte o rosto da mudança do continente, onde o Estado de direito, os direitos humanos, a boa governação e a responsabilidade são exigências dos seus cidadãos. Este é o futuro de África, e a Libéria é uma das suas invejáveis democracias”.
Ellen Johnson Sirleaf serviu-se do seu currículo internacional como economista formada em Harvard, antiga ministra das Finanças e executiva do Banco Mundial para eliminar grande parte da dívida da Libéria em 2017. Conseguiu também atrair investimentos nos setores das minas, agricultura e florestas, bem como para a exploração de petróleo offshore.
Conflitos internos
Apesar de ser vista no estrangeiro como o símbolo da reconstrução pós-guerra, Ellen Johnson Sirleaf não escapou às polémicas no seu país, onde enfrentou críticas quanto à falta de julgamentos dos criminosos de guerra e alegações de nepotismo quanto ao emprego dos seus filhos.
"Quando Ellen subiu ao poder, as expetativas do povo liberiano eram tão altas, tão altas, que ela não conseguiu corresponder”, considera o professor de ciência política liberiano Emmanuel Nimely. "Isso não significa que ela não tentou. Tentou, mas não conseguiu fazer tudo”.
Metade das estradas em Monróvia foram reconstruídas e a capital tem agora uma rede de distribuição de água. A eletricidade, outrora inexistente, está agora disponível em algumas partes da cidade, embora o fornecimento não seja ainda constante.
Por outro lado, o desemprego continua a ser elevado e a pobreza extrema persiste. A maioria das crianças liberianas não termina os estudos.
Na semana passada, Ellen Johnson Sirleaf disse aos jornalistas que havia "mais coisas que gostaria de ter feito”, acrescentando que a sua agenda era "mais extensa do que aquilo que foi alcançado”.
Enfrentar críticas
Recuperar o mais antigo estado independente de África – fundado inicialmente para escravos norte-americanos libertados – onde as instituições estavam muito debilitadas, não seria uma tarefa fácil.
Em 2009, uma Comissão de Verdade e Reconciliação incluiu Ellen Johnson Sirleaf numa lista de pessoas que não deveriam ocupar cargos públicos durante 30 anos, por terem apoiado o senhor da guerra que se tornou Presidente, Charles Taylor.
Sirleaf admitiu ter apoiado a insurgência de Taylor contra o Governo de Samuel Doe, em 1989, que levou à primeira guerra civil no país, mas tornou-se uma forte opositora quando a verdadeira dimensão dos seus crimes de guerra se tornou conhecida. A Presidente liberiana contrariou calmamente as críticas, lembrando de tempos a tempos a necessidade de perdoar e seguir em frente.
Re-eleita em 2011, Sirleaf liderou um país que caiu em recessão sob o impacto da epidemia do ébola e o colapso dos preços das matérias-primas.
"Os últimos cinco anos do regime de Ellen foram marcados por um fluxo de pessoas vindas da diáspora para obter empregos, enquanto os locais que se qualificaram localmente foram esquecidos”, considera Nimely.
A 14 de janeiro, a Presidente cessante da Libéria foi expulsa do partido no poder, o Partido Unido, alegadamente por não ter apoiado o vice-Presidente cessante, Joseph Boakai, na corrida presidencial.