Lisboa: Vestígios da escravatura
Uma associação portuguesa propõe uma visita diferente por Lisboa, sobre a história da escravatura em Portugal. Não se costuma falar muito sobre o tema no país, mas os vestígios dessa época estão espalhados pela cidade.
Aula de História ao ar livre
A professora Isabel Castro Henriques (centro, à esq.) e o historiador José Antunes (dir.) são os guias do dia. Falam sobre a migração africana - um elemento permanente na História de Portugal. Seja "à força" (até finais do séc. XVIII) ou "pela força" (do colonialismo do fim de Oitocentos a 1974, e da globalização nos nossos dias).
De tuk-tuk à descoberta
Andamos por Lisboa de tuk-tuk. Começamos em Belém. Era aqui que chegavam os escravos vindos de África. Um dos roteiros destas visitas guiadas à capital portuguesa começa no Mosteiro dos Jerónimos (à dir., ao fundo) - as visitas são promovidas pela Associação Cultural e Juvenil Batoto Yetu Portugal (BYP).
Marco da expansão portuguesa
O Mosteiro dos Jerónimos começou a ser construído no início do séc. XVI e é tido como um símbolo da expansão marítima portuguesa. Lisboa era a porta de entrada de escravos que vinham das colónias. Em frente aos Jerónimos havia um chafariz onde se reuniam muitos africanos cuja tarefa era distribuir água pela cidade.
Desembarque de escravos
No Terreiro do Paço, também conhecido por Praça do Comércio, funcionava a Alfândega de Lisboa, de que fazia parte a Casa dos Escravos. A partir do séc. XVI começou-se a fazer aqui o desembarque de escravos africanos. Eles eram então distribuídos para venda pelos vários mercados de escravos na cidade.
Local de festas e da Inquisição
Um dos mercados mais importantes ficava no extinto Largo do Pelourinho Velho, atrás do Terreiro do Paço. Os escravos eram divididos em lotes e ficavam ali à espera de serem comprados em situação degradante. Lugar onde se realizavam grandes festas pagãs e religiosas, o Terreiro era também o local da Inquisição. No séc. XVIII, vários africanos foram aqui condenados e enviados de volta para África.
Feiticeira mandada para Angola
Há relatos nos arquivos da Torre do Tombo que falam de Maria Ortega, mulher africana do séc. XVIII, considerada feiticeira encartada, muito procurada pelos portugueses. Terá sido consultada por uma figura da corte do Rei de Portugal para desvendar uma questão amorosa, que não resultou. O cliente ficou furioso e denunciou a curandeira à Inquisição. Acabou por ser enviada para Angola.
Cais do Sodré
No séc. XVIII, era possível encontrar nesta zona ribeirinha muitos homens africanos que produziam instrumentos para a navegação. Aos africanos, os portugueses costumavam atribuir trabalhos pesados na pesca, construção naval e carga e descarga de mercadorias. As mulheres dedicavam-se ao comércio de pescado de porta em porta.
Uma bica para cada um
Chegamos ao Chafariz D’El Rey, na Rua do Cais de Santarém (edificado no séc. XIII e melhorado em meados do séc. XIX). Uma das funções primordiais dos africanos era distribuir água às casas de Lisboa. As cinco bicas estavam destinadas a certos clientes (homens e mulheres) em função da cor da pele e do estatuto social. Só os homens negros livres tinham acesso à segunda bica.
Obreiro da abolição da escravatura
No jardim na Praça D. Luís, ao lado do Mercado da Ribeira no Cais do Sodré, está uma estátua em bronze e pedra dedicada ao General Marquês de Sá da Bandeira, "o Popular", conhecido por ser o obreiro da abolição da escravatura em todos os territórios portugueses, por ele decretada definitivamente em 1869.
Correntes partidas
Aos pés do Marquês, pousa a figura humilde de uma mulher mestiça com a corrente da escravatura partida. É Fernanda do Vale, designada pejorativamente por "preta Fernanda" - uma personagem importante da sociedade portuguesa do séc. XIX, ligada à prostituição de luxo da época. Deixou um livro "Memórias de uma Colonial". Originária de Cabo Verde, ela simboliza aqui a fase final da escravatura.