Maputo tenta responder a dúvidas dos credores internacionais
23 de novembro de 2016O Governo de Moçambique anunciou a divulgação de informações das chamadas dívidas ocultas. No site do Ministério das Finanças - que contudo não tem estado a funcionar - o Executivo terá disponibilizado um documento com as condições dos empréstimos das empresas Mozambique Asset Management e Proindicus, com garantias do Estado, avaliados em quase 1,2 mil milhões de dólares.
Maputo tenta responder às dúvidas dos credores internacionais, depois de ter admitido que não conseguiria cumprir com as suas obrigações.
A divulgação de detalhes sobre os empréstimos era já reivindicada não só por instituições internacionais como também por organizações da sociedade civil moçambicana.
Em entrevista à DW África, Jorge Matine, coordenador de pesquisa para a área da despesa pública do Centro de Integridade Pública de Moçambique, começou por elogiar a iniciativa do Governo.
DW África: Como vê a decisão do Governo de divulgar as condições dos empréstimos escondidos a pedido dos credores?
Jorge Matine (JM): É um sinal positivo por dois aspetos: primeiro, porque já faz muito tempo que se despoletou este problema das dívidas ocultas e que temos insistido na ideia do Governo divulgar toda informação referente a estes empréstimos; em segundo, neste processo, a informação sempre foi divulgada por orgãos externos e, pela primeira vez, uma informação de grande importância para o público em geral é divulgada num site do Governo.
DW África: E o que essas informações trouxeram de novo?
JM: O aspeto importante é precisamente o facto de informar sobre a maturação da dívida, em que contexto foi feita, quais são as prestações, quando devem acontecer e o volume dos recursos envolvidos. Penso também que este é um ponto bastante importante para permitir que a sociedade civil e de outros atores importantes possam ir a um debate, quer com o Governo quer com todos os atores que estejam envolvidos na resolução do problema, sejam melhores informados.
DW África: Foram divulgadas as informações sobre os empréstimos das empresas Mozambique Asset Management e Proindicus. E porque não a publicação também das condições da dívida com garantias do Estado da Empresa Moçambicana, a EMATUM?
JM: Penso que o Governo tem a perceção de que se trata de um assunto que já foi ultrapassado, tendo em conta a renegociação e que a nível da Assembleia da República houve uma discussão acesa sobre a EMATUM como um assunto que teve uma solução a nível interno. Mas mesmo assim a solução a nível interno foi alcançada num padrão em que não houve muita transparência em termos de informação. Então, concordo que o Governo deveria também colocar as informações sobre a EMATUM à disponibilidade do público.
DW África: E por falar em disponibilidade, o site do Ministério das Finanças de Moçambique não tem estado a funcionar...
JM: Tem tido alguns problemas. O que nós sabemos é se são problemas técnicos, que têm a ver com algo pontual, ou se realmente é um problema grave, na medida em que o site não estará, por vontade, a funcionar.
DW África: Com a divulgação destas informações, conseguirá o Governo moçambicano dissipar as dúvidas e reconquistar um pouco da confiança que perdeu junto dos credores internacionais?
JM: É muito difícil, neste momento, poder dizer que essa operação seja suficiente, tendo em conta a grande falta de informação sobre as condições, como aconteceu com a questão da dívida. Também sabemos que o Fundo Monetário Internacional (FMI) voltou a insistir que a situação de Moçambique é bastante grave e que o país se deve empenhar na resolução das questões que resultaram deste problema da dívida. Ao mesmo tempo, o FMI afirma que o ponto importante para reconquistar a confiamnça é a realização da auditoria. Então, penso que poderão haver alguns indicadores de que ainda há uma grande falta de confiança.
DW África: E que informações existem sobre a auditoria à dívida pública de Moçambique?
JM: Sabemos que os termos de referência foram aprovados, que o contrato estava para ser assinado há duas semanas - ainda não temos a informação que confirme que foi assinado. A empresa tem 90 dias para apresentar o relatório. Então, é impportante saber se o contrato já foi assinado para podermos ter os resultados dentro de 90 dias.
DW África: O Governo moçambicano admitiu que não conseguirá cumprir com as suas obrigações e defendeu uma reestruturação dos pagamentos e uma nova ajuda financeira do FMI. Que solução defende face ao aumento da dívida pública que, este ano, deverá ser de 130% do Produto Interno Bruto?
JM: Penso que aquilo que são ações corretivas seria o Governo centrar-se nas reformas, de forma a melhorar a gestão da dívida. As reformas também implicam aumentar a transparência do endividamento público e também a reforma da administração pública, neste caso da gestão das finanças públicas. Neste monento, é muito difícil dizer quais são as reformas que o Governo vai escolher como prioritárias e qual será a sua magnitude. O que está em causa é termos certeza que há, do lado do Governo, um esforço tremendo para poder resolver a situação. Neste momento, o Governo comunica pouco sobre que medidas está a tomar para melhorar a gestão da dívida. Nos últimos dois anos, o Executivo não investiu tempo suficiente em termos de reatar com maior rapidez as relações [com os parceiros internacionais] ou iniciar as reformas que são necessárias. Este é um momento bastante crítico, porque não se tem tempo e a economia está realmente a precisar de uma injeção. E o grande problema é saber se, devido à urgência das medidas que é preciso tomar, como já não há [muito] tempo, se essas medidas serão de qualidade, por forma a que o resultado seja de boa qualidade.