Marrocos: Um íman para mulheres migrantes?
2 de outubro de 2023A partir da sua casa em Hay Charaf, um bairro a norte de Marraquexe, em Marrocos, Oumou Sall cuida do seu bebé recém-nascido. A senegalesa de 27 anos mudou-se para Marrocos em 2017 para concluir o mestrado em administração de empresas. Atualmente está de licença maternidade, mas em breve voltará a trabalhar no call center.
Esta indústria cresceu bastante no país nos últimos 15 anos, o que facilitou a muitos migrantes que falam francês encontrar trabalho. Oumou, que é originária de Dakar, disse que ser contratado em call centers é bastante simples, mesmo sem um diploma.
O seu salário fixo é de 2.500 dirhams (322 euros) por mês, para além de vários bónus baseados no desempenho – o suficiente para enviar remessas para a sua família no Senegal.
"Na verdade, trabalhamos por recompensas", explica Oumou. "Portanto, se conseguirmos e obtivermos bons resultados, poderemos enviar dinheiro às nossas famílias e poupar dinheiro".
Um novo destino além da Europa?
Oumou Sall conta que a sua integração foi rápida, devido à boa relação profissional com a chefia e colegas compatriotas.
"Foi fácil. Encontrei rapidamente outros subsaarianos na empresa que me ajudaram e as relações com os chefes eram boas. Por isso, não tive problemas de integração", explica.
A história de Oumou é semelhante à de muitas outras mulheres de países africanos que emigram para este país do Norte de África. De acordo com as últimas estatísticas oficiais divulgadas pelas Nações Unidas em 2020, 48,5% dos imigrantes em Marrocos são mulheres.
As mudanças no ambiente de trabalho em Marrocos significam que o país deixou de ser apenas uma escala na rota da migração para a Europa, mas um possível destino para muitas mulheres em busca de emprego para conseguirem sustentar-se a si e às suas famílias.
Mudar a narrativa sobre a migração
A cerca de 350 quilómetros a sul de Marraquexe, em Agadir, a empreeendedora senegalesa Khady Wade Balde dá as boas-vindas aos clientes num dos seus salões de beleza.
Enquanto observa a sua equipa de cerca de dez funcionários, recorda a sua viagem solitária para Marrocos, em 2008. Então com 23 anos, decidiu apostar na formação, melhorou as suas técnicas de cabeleireira e, passados alguns anos de muito trabalho, abriu o seu primeiro salão.
"Na altura, as mulheres da África Subsaariana conseguiam apenas trabalho como babysitters", diz à DW.
Hoje, Khady é uma cabeleireira de sucesso. Está satisfeita com aquilo que conseguiu alcançar como migrante no país, mas diz estar consciente das dificuldades que as mulheres subsaarianas passam em Marrocos.
Ainda ilegais
Apesar das histórias de sucesso como a de Khady, ainda há muitas mulheres no limbo. Os relatórios indicam que existem entre 70.000 e 200.000 migrantes da África subsaariana no país - muitos sem documentos de cidadania válidos.
E as mulheres sem documentos estão particularmente vulneráveis a diversas formas de exploração e marginalização, especialmente nos setores da agricultura e nos serviços domésticos.
Perante o crescente número de migrantes, as autoridades de Rabat viram-se forçadas a reavaliar as suas políticas de integração. Duas campanhas de regularização em 2014 e 2017 permitiram a 50.000 migrantes - muitos da África Subsaariana - obter vistos de residência.
Aïda Kheireddine, investigadora e especialista em género e migração em Marrocos, explica que estas campanhas foram inicialmente benéficas para a comunidade migrante.
"Foi nessa altura que assistimos, pela primeira vez na história de Marrocos, a uma operação de regularização em massa de migrantes, e foi dada especial atenção às mulheres. Havia critérios, era preciso estar em Marrocos há mais de 5 anos, etc... e era dada prioridade às mulheres e às crianças. Em 2018, assistimos a uma regressão desta política", afirma.
Investigadores e ONGs relatam uma falta de sensibilidade de género na legislação. Segundo Kheireddine, mulheres com empregos precários estão particularmente em risco "de diversos tipos de violência", como a violência sexual. "A violência contra migrantes ilegais ocorre diariamente".
Falta de informação prejudica mulheres
"Acho que as dificuldades que estas mulheres enfrentam estão sobretudo relacionadas com o facto de não estarem informadas quando chegam [ao país], sobre onde ficar, que passos tomar, etc,", diz Ndeye Yacine Ndiaye, outra trabalhadora senegalesa que vive em Casablanca há 15 anos.
Chegou a Marrocos com um mestrado e hoje trabalha como gestora de comunicação num banco. Juntamente com o marido, decidiu envolver-se na comunidade subsaariana e ajudar outras como ela. Fundou a plataforma online "Attaches Plurielles", que visa mostrar "o outro lado da diáspora subsaariana em Marrocos", com entrevistas a migrantes e especialistas sobre os problemas que afetam a comunidade.
"Tentamos mostrar as mulheres corajosas que fazem um excelente trabalho, que não se resignam e tentam desbloquear a sua situação. Aquelas que têm a vontade de singrar", afirma.