Militares ocupam prédios e serviços ficam paralisados
2 de março de 2020Os primeiros efeitos práticos da "posse simbólica" de Umaro Sissoco Embaló, considerado o candidato vitorioso das presidenciais de 2019 pela Comissão Nacional de Eleições, foram percebidos pela população guineense esta segunda-feira (02.03).
No Palácio do Governo, funcionários não compareceram para trabalhar. E, em comunicado, o Supremo Tribunal de Justiça divulgou que, "por razões desconhecidas", as suas instalações e as do Tribunal da Relação e do Tribunal Regional de Bissau foram ocupadas por forças de defesa e segurança, o que impediria o "funcionamento normal" destas instituições.
O Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) também foi tomado por militares, que mandaram para casa os funcionários que estavam no interior do edifício. Segundo uma testemunha, os funcionários não foram alvos de nenhuma ameaça, mas foram "simplesmente" ordenados a abandonar o serviço.
Numa publicação no Facebook, o primeiro-ministro definido nas eleições de março passado, Aristides Gomes, disse que Nuno Gomes Nabiam "invadiu" o Palácio do Governo e o gabinete do primeiro-ministro, acompanhado de vários militares. Nabiam tomou posse como primeiro-ministro no sábado (29.02) na presença de Umaro Sissoco Embaló e das chefias militares.
Posição da CEDEAO
O editor do semanário guineense Última Hora, Sabino Santos, apelou pela reposição da legalidade. O jornalista sublinha que os eventos que a sociedade guineense está a assistir não são normais e caracterizam-se por violações dos princípios democráticos.
"Eu penso que o mais importante aqui não é estarmos a tentar apurar os fatos sobre os resultados eleitorais. A mim o que mais interessa neste momento são os posicionamentos em respeito às regras democráticas", opina Santos.
Num comunicado divulgado esta segunda-feira, a comissão da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) reiterou a necessidade de o atual processo eleitoral guineense ser concluído e condenou veementemente o que chama de "assaltos" e outras "ações contrárias aos valores e princípios democráticos" compartilhados no espaço da organização. A CEDEAO pede que se aguarde pela decisão judicial sobre o contencioso eleitoral.
"Atuação limitada"
O analista Fransual Dias discorda da posição da CEDEAO e acha que o processo eleitoral já foi concluído. Dias opina que o processo das eleições presidenciais terminou com a publicação dos resultados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), e o Supremo Tribunal de Justiça não pode estar a decidir "hoje, amanhã e depois de amanhã".
"A própria CEDEAO, em vários comunicados, convocou as partes para se entenderem para salvaguardar a integridade do processo eleitoral. Portanto, a CEDEAO não pode estar a contrariar-se. Aliás, a própria CEDEAO tem essa deficiência grave: Não consegue gerir politicamente os assuntos da comunidade", considera o analista guineense.
Sabino Santos afirma que, embora a CEDEAO esteja a ajudar, a sua atuação tem limites e não vai além da mediação.
"O bom senso, de certeza, deverá prevalecer neste imbróglio, mas eu não vejo que a CEDEAO possa fazer mais do que uma mediação. De certeza que, a seguir a este comunicado, o país vai ter alguma mediação e, até aparecer a mediação, vamos continuar a sobreviver nesta situação", opina.