Morte de Machel ainda influencia literatura
24 de novembro de 2011
O avião do antigo presidente moçambicano Samora Machel despenhou-se na fronteira do país com a África do Sul em 19.11.1986. A queda matou o chefe de Estado e 33 membros do governo de Maputo que seguiam a bordo.
Em 2006, o governo sul-africano reabriu o inquérito sobre a misteriosa queda do avião, previamente arquivado pelo regime de segregação racial do apartheid (de liderança branca). Este chegara à conclusão – sem surpresas – de que se tratara de um acidente. Até hoje persistem suspeitas de um envolvimento sul-africano.
Foi este o pano de fundo que inspirou o livro Onsigbaar ("Invisível", em afrikaans), do sul-africano Deon Meyer, autor de sucesso internacional. "Escrevi o livro quando foi anunciada a reabertura do inquérito", disse Meyer à Deutsche Welle.
"Não gosto de falar de inspiração, porque escrever tem mais a ver com 'perspiração' do que inspiração. Mas é verdade que a queda do avião é um dos grandes mistérios africanos, e um dos eventos maiores e mais tristes da era do apartheid", acrescentou.
Sem opinião definitiva
Deon Meyer lembra-se bem de como a morte de Machel abalou também muitos sul-africanos. Hoje, diz, o assunto já não é actual. O país tem questões mais prementes e imediatas para resolver. No entanto, o escritor gostaria que o seu governo se esforçasse um pouco mais seriamente para obter resultados no inquérito reaberto. Até agora, Pretória pouco ou nada fez, comenta.
Para escrever o livro, Deon Meyer leu todos os documentos e relatórios a que teve acesso. Mas ainda hoje não tem uma opinião definitiva sobre o assunto: "Penso que há indícios que apontam para esforços levados a cabo para matar Machel. Mas não são suficientes para me convencer. Na verdade, não sei. E acho que agora é tarde demais para se descobrir toda a verdade", afirmou.
Nos próprios romances, Deon Meyer foca os grandes temas africanos e universais, como os crimes contra a natureza que ameaçam a humanidade, a ganância de grande capital que não hesita em sacrificar indivíduos para obter lucros e a corrupção política que condena à miséria populações inteiras.
Raça deixou de ser pertinente na África do Sul
Ele escreve também sobre a solidariedade e a amizade natural entre brancos e negros. Aliás, diz Deon Meyer, a questão da raça deixou de ser pertinente no seu país: "Fizemos imensos progressos. Penso no campeonato mundial de futebol, que ainda nos uniu mais como nação. Penso em tantos bairros que agora estão totalmente integrados. Pessoas de todas as raças e de todos os grupos culturais trabalham hoje lado a lado. A raça deixou de ser uma questão. Há outras, como a pobreza. Mas o fosso entre pobres e ricos é algo que também vejo quando venho à Europa. Não é um problema especificamente sul-africano", avaliou.
Sem negar a existência de dificuldades, o escritor gostaria que o Ocidente tivesse uma percepção mais realista da situação no seu país: "Temos uma democracia, que apesar de jovem é vibrante. É um processo em andamento. Por exemplo, constato com muito interesse que só há pouco tempo, há um ou dois anos, as pessoas se habituaram à liberdade de expressão e são agora capazes de debater temas livremente e sem emoção excessiva", exemplificou.
"A nossa democracia só tem 17 anos, o que não é nada em termos de História. Mas aquilo que já conseguimos é fantástico e eu estou incrivelmente optimista quanto ao futuro da África do Sul", disse Deon Meyer .
Autora: Cristina Krippahl
Edição: Renate Krieger / António Rocha