Moçambique: MDM apela à revisão do Acordo de Paz
31 de dezembro de 2019"O acordo foi feito por duas pessoas e foi feito a correr, à porta das eleições. Quando assim é, o resultado é este [o retorno à violência armada]", declarou o presidente do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a terceira força política parlamentar no país, Daviz Simango, em entrevista à agência Lusa.
Em causa está a violência armada que tem sido registada no centro de Moçambique. Os episódios têm sido atribuídos a guerrilheiros dissidentes da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), que permanecem na região.
Para Daviz Simango, o grupo, que se encontra nas matas da Serra da Gorongosa, no centro de Moçambique, sente-se excluído - na medida em que o processo de desmobilização e integração não foi feito a partir da realidade dos guerrilheiros do braço armado do principal partido da oposição.
"O figurino do Desarmamento, Desmobilização e Reintegração dos guerrilheiros da RENAMO foi simplesmente de cima para baixo. É um figurino imposto e, quando se faz a imposição de um figurino, o resultado é esse", frisou Daviz Simango.
Para o líder do MDM, "na prática ainda não há paz em Moçambique" e os signatários do acordo de paz de Maputo não devem sentir "vergonha de rever o documento".
"É necessário dizer que há erros e que os vamos corrigir rapidamente", afirmou Daviz Simango, alertando que não se pode subestimar os guerrilheiros que permanecem entrincheirados nas matas do centro de Moçambique.
O líder daquela força política entende ainda que é preciso entender as expectativas dos guerrilheiros da RENAMO e, a partir disso, começar a desenhar o um novo figurino para o seu desarmamento.
Militares em "prontidão combativa"
Entretanto, as Forças de Defesa e Segurança de Moçambique disseram, esta terça-feira (31.12), estar em "prontidão combativa" para fazer face aos ataques armados no centro e norte de Moçambique.
"As Forças de Defesa e Segurança estão em permanente prontidão combativa, desdobrando-se em diversas frentes operacionais", lê-se num comunicado do Comando Geral da Polícia da República de Moçambique (PRM) distribuído à imprensa.
Sem avançar detalhes, as autoridades moçambicanas garantem que se estão a "desdobrar num patrulhamento ostensivo, visando repelir e combater os autores dos ataques", acrescenta o documento, no qual refere-se ainda que a última foi "relativamente calma".
Em alguns pontos do norte e do centro do país, especificamente nas províncias de Cabo Delgado, Sofala e Manica, grupos armados têm protagonizado ataques contra viaturas civis, autoridades e aldeias.
Acordo de paz X conflito permanente
O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, e o líder da RENAMO, Ossufo Momade, assinaram a 6 de agosto o Acordo de Paz e Reconciliação em Maputo.
As novas incursões no centro de Moçambique já causaram 21 mortos e acontecem num reduto da RENAMO, onde os guerrilheiros daquele partido confrontaram-se com as Forças de Defesa e Segurança moçambicanas e atingiram alvos civis até ao cessar-fogo de dezembro de 2016.
Na semana passada, o ministro do Interior de Moçambique, Basílio Monteiro, anunciou o reforço de medidas de segurança em Manica e Sofala, que incluem o reforço do policiamento e escoltas militares em alguns troços - um cenário que remonta ao pico, entre 2014 e 2016, das confrontações militares na crise política entre o Governo moçambicano e a RENAMO.
O grupo de guerrilheiros acusado de estar a protagonizar os ataques, a autoproclamada Junta Militar, é liderado por Mariano Nhongo, general da RENAMO que exige a demissão do atual presidente do partido e melhores condições de reintegração.
A RENAMO, por sua vez, distancia-se dos ataques, considerando que continua a cumprir com as cláusulas do acordo de paz e classificando Nhongo como desertor.
Vítimas dos ataques
Em Cabo Delgado, os ataques de grupos armados eclodiram há dois anos e já provocaram pelo menos 300 mortos, além de deixar cerca de 60 mil pessoas afetadas ou obrigadas a abandonar as suas terras e locais de residência, de acordo com a mais recente revisão do plano global de ajuda humanitária das Nações Unidas.
Por outro lado, no centro do país, especificamente nas províncias de Sofala e Manica, grupos armados têm protagonizado ataques contra viaturas em dois dos principais corredores rodoviários moçambicanos, a Estrada Nacional 1 (EN1), que liga o norte ao sul, e a Estrada Nacional 6 (EN6), que liga o porto da cidade da Beira ao Zimbabué e restantes países do interior da África austral.
Desde agosto, pelo menos 21 pessoas morreram em ataques de grupos armados que deambulam pelas matas nas províncias de Manica e Sofala.