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Principal desafio para autárquicas é o tempo, diz CIP

20 de julho de 2018

Em entrevista à DW África, investigador Borges Nhamire diz que um eventual adiamento do processo seria perverso, e pede esforços dos candidatos e autoridades eleitorais para agilizar o registo das candidaturas.

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Foto: Getty Images/AFP/Gianluigi Guercia

Com a aprovação só esta semana do novo pacote eleitoral em Moçambique, as mudanças no calendário das eleições autárquicas forçam os candidatos e as autoridades a correr contra o tempo.

Para o Centro de Integridade Pública (CIP) de Moçambique, um eventual adiamento das eleições, agendadas para 10 de outubro, seria perverso para o país. Borges Nhamire, investigador do CIP, considera que são necessários esforços de todos os lados para garantir a realização das autárquicas na data planeada.

"O que se pede é que haja flexibilidade e bom senso de todas as partes, tanto dos candidatos, quanto das entidades públicas e dos órgãos de administração eleitoral", afirma em entrevista à DW África.

As eleições serão observadas por dez organizações da sociedade civil, organizadas numa rede de colaboração para garantir a paz e a credibilidade do escrutínio. Além do CIP, farão parte da Rede de Monitoria da Sociedade Civil (RMSC) o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) e o Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil (MASC), entre outras.

DW África: Quais são os principais desafios para a realização das eleições autárquicas a 10 de outubro?

Principal desafio para autárquicas é o tempo, diz CIP

Borges Nhamire (BN): O principal desafio é o tempo. A Comissão Nacional Eleitoral (CNE) está a gerir um calendário eleitoral muito apertado, devido a sucessivos adiamentos em fases importantes do processo, especialmente o recenseamento eleitoral, que deveria ter acontecido de abril a agosto de 2017. Quando se atrasa o recenseamento, atrasa-se em cascata todos os outros processos, como, por exemplo, a indicação do número de mandatos das assembleias municipais, que, por sua vez, depende do número de eleitores inscritos em cada município. O recenseamento passou para o início de 2018, mas foi novamente adiado para março devido à realização da segunda volta das eleições intercalares em Nampula, uma situação que não estava prevista.

DW África: Quais são as principais mudanças previstas no novo calendário eleitoral?

BN: O único processo que foi paralisado, porque não havia lei que o regulasse, é o início da submissão de candidaturas, que deveria ter recorrido de 5 de abril a 27 de julho. Adiou-se e agora a informação que temos é que isso vai acontecer de 1 a 10 de agosto. A submissão de candidaturas vai decorrer em simultâneo com a verificação da legalidade das candidaturas. Esse é um grande desafio, porque não é um processo simples. Por lei, os candidatos devem apresentar vários documentos autenticados, que muitas vezes não são submetidos corretamente. Esse processo, que é fundamental, deveria durar 22 dias e agora passou para apenas dez dias. O que nós prevemos é que a CNE vai optar pela inclusão, aceitando todas as candidaturas, porque se as rejeitar e os candidatos pretenderem recorrer, isso vai atrasar o calendário.

Borges Nhamire, CIP-Forscher
Borges Nhamire é investigador do CIPFoto: DW/S. Lutxeque

DW África: Apesar de todos esses adiamentos e mudanças, o CIP avalia que há tempo para fazer tudo o que é preciso face a esse novo calendário?

BN: Pensamos que os efeitos de uma eventual mudança de data das eleições seria mais perverso do que o efeito de trabalhar sob um calendário apertado. O que se pede é que haja flexibilidade e bom senso de todas as partes, tanto dos candidatos, que já deveriam estar preparados, quanto das entidades públicas que trabalham com o reconhecimento dos documentos. Também tem que haver muita flexibilidade e abertura, acima de tudo, por parte dos órgãos de administração eleitoral, que devem ser transparentes em casos de eventual rejeição de candidaturas.

DW África: Foi lançada a Rede de Monitoria da Sociedade Civil (RMSC), formada por organizações da sociedade civil com o objetivo de contribuir para o sucesso das eleições autárquicas. Qual será o papel dessa rede?

BN: O CIP faz parte dessa rede, cujo papel é monitorizar a violência nas eleições e promover eleições credíveis e com integridade, através da observação das eleições. A contribuição da rede será na monitoria das eleições e na promoção de eleições pacíficas através do diálogo entre os candidatos. Uma grande novidade é o envolvimento dos órgãos da administração eleitoral e da justiça na resolução de conflitos. Ao nível central, a rede poderá entrar em contacto com a CNE, a polícia e a Procuradoria-Geral da República para ver se eventuais conflitos eleitorais que surjam podem ser resolvidos adequadamente de modo a não afetar a credibilidade dos resultados das eleições. Serão dez organizações a trabalhar em 22 municípios distribuídos por todo o país, com quatro monitores por município. Haverá também complementaridade com o trabalho de outras organizações da sociedade civil em termos de monitoria, através de parcerias.

Mosambik Wahl
Adiamento no processo de recenseamento eleitoral criou efeito-cascataFoto: DW/M. Mueia

DW África: Como é que o CIP avalia o novo pacote eleitoral aprovado em definitivo pela Assembleia da República?

BN: Tem avanços e retrocessos. O projeto que foi inicialmente apresentado pelo Governo à Assembleia da República tinha problemas muito mais gritantes, como, por exemplo, permitir a um candidato que não vive num município concorrer às eleições naquela localidade, o que desvirtua por completo o princípio de poder local. O Parlamento agiu a tempo de remover esta colocação, o que foi um grande avanço, assim como a proibição do uso de dispositivos que permitam fazer fotografias na cabine de voto. Houve uma mudança, que pensamos não ser muito progressiva, que é proibir a formação de coligações após as eleições. Em qualquer parte do mundo, as democracias mais avançadas permitem aos partidos fazer coligações para que possam eleger o dirigente mais consensual. Isso não vai permitir uma eleição estável do presidente do conselho autárquico. A eleição do presidente do conselho autárquico pela lista que tiver maioria simples permitirá que dois partidos que não ganharam se juntem e possam chumbar os planos de governação do presidente que ganhou a eleição. A proibição de coligações não faz sentido.